Governo aposta tudo na preparação de fundos europeus

Para a Europa, a estratégia será lançada em Bruges por António Costa. Já no plano nacional, a aposta é o consenso parlamentar com o PSD. Vem aí a preparação do próximo quadro de fundos estruturais para o ciclo entre 2020 e 2027.

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António Costa aposta o fim da legislatura em preparar o próximo quadro de fundos estruturais LUSA/MÁRIO CRUZ

O futuro da Europa, mais concretamente, as reformas e reorientação estratégica da União Europeia (UE), é o tema da intervenção que o primeiro-ministro, António Costa, irá fazer a 15 de Setembro, na sessão de abertura do ano lectivo do Colégio da Europa, em Bruges, na qual será o primeiro chefe de governo a usar da palavra.

No discurso de Bruges, o primeiro-ministro irá abordar a necessidade de reformar a UE na sequência do debate já iniciado com a apresentação, em Maio, do Livro Branco, pelo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, o qual inclui cinco cenários diversos para desenvolver a UE em termos de maior ou menor coesão.

Afirmando a sua vontade de que Portugal seja um interlocutor activo nesse debate, António Costa deverá cruzar esta questão com outra que lhe está subjacente, a da reforma da União Económica e Monetária, bem como com a discussão sobre o futuro das finanças europeias depois do Brexit. Isto porque, com a prevista saída do Reino Unido, a UE irá perder um importante contribuinte líquido para os orçamentos da União.

Essa diminuição de recursos financeiros obrigará os 27 Estados-membros que permanecem ligados a encontrar alternativas para reforçar o orçamento da zona Euro. Um objectivo que, na opinião de António Costa, deve ser atingido por formas que permitam manter os objectivos de convergência e coesão europeias.

O debate sobre o futuro da UE, que vai estar na ordem do dia depois das eleições na Alemanha, a 24 de Setembro, entrecruza-se a nível da política interna portuguesa, de acordo com um responsável do Governo ouvido pelo PÚBLICO, com a aposta do executivo chefiado por António Costa na preparação do próximo quadro comunitário de distribuição de fundos financeiros pelos Estados-membros.

2027+2

Num momento em que é vital para Portugal, debilitado pela crise da dívida e sem capacidade de investimento público, garantir no futuro a canalização de fundos estruturais que financiem a economia portuguesa, António Costa aposta precisamente, como objectivo central da governação em 2018, na preparação do projecto português a apresentar em Bruxelas sobre o próximo quadro para o ciclo entre 2020 e 2027, que substituirá o Portugal 2020, ainda em execução. Um programa a que o Governo dá já o nome de "Década de Convergência", uma vez que se inicia em 2020, termina em 2017, mas tem um prolongamento de mais dois anos para terminar a sua concretização.

Assim, o ano político, que se inicia em Setembro, irá ser dominado em Portugal, do ponto de vista das prioridades do Governo, pela preparação dos instrumentos que permitam debater a nível nacional a preparação do próximo quadro de fundos estruturais, de modo a que haja capacidade de fazer uma discussão sobre o assunto no seio da UE que não só não prejudique, mas beneficie Portugal. E que possibilite ampliar a convergência do país com a UE que esteve estagnada desde 2000 e que começou a ser retomada com o crescimento económicos dos últimos três trimestres.

Nesse sentido, o Governo quer definir e preparar a estratégia e os seus instrumentos durante 2018 para que ainda nesse ano e em 2019, Portugal possa debater com os outros Estados-membros e influenciar a gestão europeia do quadro 2020-2027. "É preciso saber o que se quer e o que se procura fazer para conseguir meios", defendeu o membro do Governo ouvido pelo PÚBLICO.

Dois pilares

A estratégia do Governo para a "Década de Convergência" assenta em dois pilares fundamentais: "maior competitividade externa e mais coesão interna". A competitividade externa passa pela aposta na educação, na formação profissional, na ciência, na energia, na inovação das empresas e na conectividade com redes globais, o que inclui o planeamento e construção de infra-estruturas, incluindo portuárias. De acordo com o membro do Governo ouvido pelo PÚBLICO, as políticas relacionadas com o Mar serão fundamentais.

No plano da coesão interna, o Governo aposta na redução das desigualdades e do desemprego, no investimento na educação e na saúde e em medidas como o pacote sobre apoio a deficientes aprovado este mês em Conselho de Ministros. Central será também o domínio da coesão do ponto de vista territorial, do combate à desertificação, das políticas florestais.

A concretização desta estratégia, nas suas duas vertentes, passa por um conjunto de investimentos em infra-estruturas, cuja construção só é viável através de financiamento europeu. Essa a razão pela qual o Governo quer preparar o programa para o ciclo de financiamentos entre 2020 e 2027.

Para concretizar a estratégia para o próximo programa de fundos, o Governo procura um amplo consenso político. Essa intenção foi reafirmada pelo próprio primeiro-ministro no sábado, na entrevista ao Expresso, em que declarou a vontade e a necessidade de que haja "uma grande negociação para um grande consenso" com o PSD sobre este assunto.

Três mais

De acordo com a planificação do executivo — e que em grande parte estava já prevista na "Agenda para a Década", no programa eleitoral e no Programa do Governo — a preparação da aplicação de fundos estruturais para o ciclo entre 2020 e 2027 prevê que os projectos sejam "mais bem informados e tecnicamente mais sólidos, mais participados e com consenso político mais alargado", explicou ao PÚBLICO o mesmo responsável governamental.

Para responder à premissa do "mais bem informados e tecnicamente mais sólidos" será criado o Conselho Superior das Obras Públicas (CSOP), que terá a" responsabilidade de aferir e gerir os projectos". O CSOP será constituído por representantes de ordens profissionais como a dos arquitectos e dos engenheiros, das universidades, dos laboratórios civis e associados, por representantes das regiões, das organizações ambientais, dos parceiros sociais e da Inspecção-geral de Finanças. Este organismo irá funcionar com uma divisão em secções internas. Nenhuma grande obra se poderá realizar sem o seu parecer positivo.

Em relação à promessa de "mais participado", o Governo prevê que essa participação seja feita através das cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), cujo funcionamento será alterado, de acordo com a reforma da descentralização preparada pelo executivo e que prevê que a eleição dos seus dirigentes seja feita por assembleias constituídas pelos autarcas da respectiva região. As CCDR irão ser chamadas a participar na elaboração dos projectos das suas regiões.

Quanto à ideia de "mais consenso", o Governo prevê que todos os planos das obras públicas, depois de preparadas com a colaboração das CCDR e aprovadas pelo CSOP, sejam votados na Assembleia da República por uma maioria de dois terços.

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