PAN disponível para soluções governativas com o PS em 2019

O PAN aposta numa atitude de compromisso para influenciar o poder. A receita teve êxito já que este partido foi conseguindo introduzir ideias suas na aprovação de legislação em que demonstrou uma proximidade quase absoluta com o PS.

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André Silva é o deputado do PAN em São Bento nfs nuno ferreira santos

É sem tabus nem falsas modéstias que o deputado André Silva afirma o papel de charneira que o partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) tem na política portuguesa. Não só pelo facto de esta força desempenhar no Parlamento, desde 2015, o papel de arauto de temas alternativos, mas também porque o seu eventual crescimento eleitoral nas legislativas de 2019 pode transformá-lo em interlocutor privilegiado de um PS vencedor nas urnas sem maioria absoluta.

Sobre a hipótese de o PAN estabelecer um acordo parlamentar de governação com o PS em 2019, num cenário em que este partido cresça eleitoralmente e garanta um número de deputados suficiente para dar suporte parlamentar a um Governo do PS à beira da maioria absoluta, André Silva responde sem hesitação: “Na altura devida, consoante os objectivos do PS e se o PS quiser, veremos se haverá diálogo.”

Garantindo ser por agora “precoce falar já de um acordo de incidência parlamentar”, André Silva, que é também membro da direcção do partido, sublinha que, “num cenário desses, as soluções terão de ser encontradas em diálogo” e acrescenta: “A nossa atitude será a que tem sido até agora, analisar, pensar os problemas e procurar soluções.”

A tranquilidade de André Silva perante a hipótese de vir a ser parceiro do PS na próxima legislatura é, de acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, semelhante à existente na direcção dos socialistas e no núcleo-duro do Governo em relação a esta solução como saída no caso de ser impossível renovar com o BE, o PCP e o PEV os actuais entendimentos políticos que garantem a actual maioria de esquerda.

Ao lado do PS

Na expectativa em relação aos resultados eleitorais, André Silva adverte que o PAN não dá “como garantida uma subida eleitoral”. Mas admite: “Estamos a ter impacto, cada vez mais pessoas percebem o nosso papel e a nossa mensagem, há perspectiva de crescimento.” Apelando explicitamente ao voto útil, defende: “Para que a solução indesejável de uma maioria absoluta não ocorra, é preciso dar mais força ao PAN. Um governo de maioria absoluta é sempre um governo musculado. É positivo encontrar soluções como a que existe hoje para que os partidos do sistema não tenham maioria absoluta.” Por isso, conclui: “Estamos disponíveis para falar.”

Cenários sobre o futuro à parte, o deputado e dirigente do PAN reconhece que “na actual solução” parlamentar o PS “não precisa do PAN”, embora lhe seja “favorável ter mais um partido” a apoiá-lo, além dos três com os quais assinou entendimentos. “O PAN não faz parte dos partidos que apoiam o Governo, não fomos sequer contactados”, confirma André Silva.

A disponibilidade dos socialistas para negociarem com o PAN tem casado bem com a atitude de compromisso parlamentar que caracteriza este partido. Um diálogo em que André Silva tem tido como interlocutor privilegiado o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos. “É verdade que, em algumas questões, o PAN tem tido receptividade por parte dos governantes” e que “alguns deputados relevantes no grupo parlamentar têm uma perspectiva progressista e moderna e acompanham as propostas do PAN”, explica André Silva.

O resultado tem sido uma extraordinária proximidade entre o PS e o PAN na aprovação de legislação. Das 156 leis aprovadas no Parlamento nas duas primeiras sessões legislativas da actual legislatura, o PAN apenas votou contra cinco vezes e absteve-se catorze na aprovação de diplomas com origem no PS ou apoiados pelos socialistas. Nessas vezes que descolou dos socialistas, o PAN só por duas votou contra e absteve-se sete vezes em relação a diplomas com origem em propostas de lei do Governo, as quais atingiram um total de 60.

A análise pormenorizada do comportamento de voto do PAN mostra que além de contribuir para a unanimidade em 64 diplomas, André Silva votou com a maioria de esquerda (PS, BE, PCP e PEV) 61 vezes, com o PS, o PCP e o PEV mais uma vez, com o PS e o BE seis vezes e quatro vezes com o PS e a direita. Ou seja, a constância das votações parlamentares alinhadas com os socialistas é quase absoluta.

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“Propostas transversais”

Chegado ao Parlamento com um caderno reivindicativo de um novo tipo em que são centrais as questões da harmonia e equilíbrio entre as pessoas e a natureza e a preservação dos recursos naturais, André Silva defende que para explicar o programa e os objectivos do PAN “a caracterização entre esquerda e direita está obsoleta”. Este partido apresenta “propostas transversais” a todos os campos ideológicos, frisa.

Aprofundando o ideário político do PAN, André Silva garante que, para este partido, a prioridade não é discutir a “redistribuição da riqueza”, mas sim “a forma de produção da riqueza, que é igual hoje em dia para a esquerda e a direita”. E defende: “Quando observamos a relação com a vida e com os ecossistemas, de um ponto de vista do utilitarismo, o problema não é o capitalismo ou o liberalismo ou o neoliberalismo. O problema está no modelo de produção que é igual em todos, mesmo no comunismo, e que assenta no extractivismo, no produtivismo e no consumismo.”

Por isso, acrescenta, na perspectiva do PAN, “o actual ministro da Agricultura podia ser ministro de um governo do PSD”. A mesma proximidade entre PS e PSD é apontada por André Silva em relação às políticas para “o sector da energia ou para o Plano Nacional de Barragens, que não é verde, mas é vendido como tal”.

Tornando explícita a atitude crítica do PAN em relação ao Governo “nas matérias” que têm a ver com o modelo de produção, o deputado garante que a atitude que adopta em São Bento “é positiva, de confronto parlamentar diferente, sem violência e sem política de terra queimada”. E assumindo o interesse em influenciar o poder e em negociar com quem governa, afirma: “Apostamos na política do compromisso.”

Uma estratégia que tem permitido ao PAN uma influência que vai muito além do seu peso eleitoral. “Independentemente de valermos 0,53% do Parlamento não podemos ficar parados”, afirma André Silva, advertindo, contudo, para que o PAN luta com as dificuldades específicas inerente ao facto de ser só um deputado e não ter grupo parlamentar. “Não temos as mesmas condições e os mesmos direitos regimentais dos outros”, afirma, explicando que têm “apenas direito a um debate potestativo por legislatura e a agendar três iniciativas legislativas por sessão legislativa”. Este ano, agendaram o pacote da caça, que chumbou, e outro sobre parentalidade no parto, que foi aprovado. Sobrou um que se juntará aos três da próxima sessão legislativa.

Para contornar os condicionalismos, o PAN procura influenciar as leis usando “expedientes” processuais do Parlamento. “Aproveitamos para apresentar projectos por arrastamento, acompanhado os projectos e os debates dos outros grupos, e depois negociamos na especialidade”, sublinha André Silva, exemplificando: “O projecto que apresentámos sobre animais de companhia foi à boleia do agendamento da petição popular.”

A interpretação inteligente do Regimento Parlamentar e a atitude de compromisso político têm permitido ao PAN conquistas significativas, como pacote do ordenamento florestal. “Considerámos que o timing não era o certo, pois não houve tempo para preparar e discutir as medidas, mas isso não nos fez estar alheados”, sublinha André Silva, prosseguindo: “Participámos nos debates em comissão, apresentámos quatro dezenas de propostas de alteração das quais vimos 13 ou 14 serem aprovadas”. No final, votou a favor.

Outro exemplo dessa atitude de compromisso são os Orçamentos do Estado. Tendo-se abstido no OE 2016 e votando a favor no de 2017, André Silva confessa: “Nos Orçamentos do Estado, temos sido nós que vamos bater à porta do Governo. Cumprimos a promessa de falar com todos e fazê-lo de modo a aprovar medidas que mudam o quotidiano.”

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