Bolt não terminou a última corrida e não deixa herdeiros

O jamaicano lesionou-se no último percurso dos 4x100m e sai dos Mundiais de Londres com uma medalha de bronze. Quem o vai substituir no reino da velocidade? Ninguém sabe.

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Haverá sempre alguém que vai ganhar os 100m e haverá sempre alguém que vai ganhar os 200m. Eventualmente, haverá alguém que vai bater o recorde mundial de uma ou das duas distâncias. Esse alguém, a partir de agora, não voltará a ser Usain Bolt. Neste sábado, em Londres, foi a última vez que vimos o jamaicano a correr em competição, mas não acrescentou nenhum título nem nenhuma medalha à sua inigualável colecção. Bolt queria despedir-se em glória, mas foi uma despedida dramática. Era dele o quarto percurso da estafeta de 4x100m da Jamaica, mas apenas cumpriu metade na final. Enquanto a Grã-Bretanha acelerava para o ouro, com os EUA a ficarem com a prata e o Japão com o bronze, Bolt ficava deitado na pista. Ainda lhe trouxeram uma cadeira de rodas, mas o jamaicano levantou-se e coxeou até à meta apoiado pelos companheiros.

O título dos 4x100m masculinos foi uma espécie de compensação para os britânicos, que pouco tempo antes tinham visto o seu herói local, Mo Farah, falhar a dobradinha nos 5.000m (foi segundo). Os EUA, por uma vez, não cometeram erros na transmissão, mas Coleman perdeu no último percurso para Nethaneel Mitchell-Blake, que fechou a volta à pista com o tempo de 37,47s, uma diferença mínima, mas suficiente para os norte-americanos (37,52s). No terceiro lugar, tal como acontecera nos Jogos Olímpicos, ficou o quarteto japonês (38,04s). A Jamaica, campeã em título, apareceu com um raro DNF (did not finish) no resultado final.

Estes Mundiais de Londres eram a última meta que Usain Bolt tinha definido na sua carreira, mais um par de títulos antes de chegar aos 31 anos, e depois acabavam-se as provas e os rigores que a alta competição cobra a um atleta. Era essa a decisão irrevogável que tinha anunciado depois de mais uma tripla de títulos nos Jogos do Rio de Janeiro. Por cautela, decidiu abdicar dos 200m, prova na qual talvez tivesse maior concorrência, para se concentrar no hectómetro. Logo ao segundo dia dos campeonatos, dois norte-americanos foram mais rápidos que ele, Justin Gatlin e Chris Coleman. Não era um bom sinal, mas Bolt ainda iria ter praticamente uma semana para preparar a sua segunda despedida.

As impressões da manhã tinham sido boas. A Jamaica, com Bolt no alinhamento, assegurava da forma mais tranquila possível um lugar na última corrida do dia. A abrir, teria Omar McLeod, o campeão das barreiras, depois vinha Julian Forte, Yohan Blake e Bolt faria a recta final. Gatlin, o campeão dos 100m que corria o segundo percurso pelo Team USA, foi naturalmente assobiado e iria fazer o segundo percurso no lado oposto da pista. À entrada para os últimos 100m, EUA e Grã-Bretanha estavam lado a lado, a Jamaica tinha de recuperar terreno. Bolt começou a acelerar, deu algumas passadas e o que pareceu ser um problema muscular na coxa esquerda deixou-o a coxear a alta velocidade. Um destino na última final do Mundial semelhante ao que lhe acontecera em Helsínquia 2005, na primeira final que correra, os 200m, em que liderou até meio da recta da meta, mas abdicando da corrida por causa de uma lesão semelhante (ainda assim, terminou a prova).

Quem o substituirá? Não será Justin Gatlin, que é cinco anos mais velho que Bolt e não terá muito mais tempo pela frente. Para além do mais, a reacção do público sempre que ele apareceu na pista foi adversa. Não será, por certo, Ramil Guliyev, o azerbaijano que compete pela Turquia, vencedor improvável dos 200m. Também não parece ser nenhum jamaicano que lhe vá suceder no imediato, tendo em conta que estes Mundiais estão a ter uma das suas piores prestações de sempre. Talvez seja Wayde van Niekerk, mas o sul-africano, campeão dos 400m, fraquejou no duplo hectómetro, e não parece estar muito confortável com o papel de nova “estrela”.

Ninguém vai ser o novo Usain Bolt. Ele foi nove vezes campeão olímpico, foi 11 vezes campeão do mundo, bateu três vezes o recorde do mundo dos 100m, bateu duas vezes o recorde do mundo dos 200m. Ele foi considerado o salvador do atletismo num tempo em que o doping foi uma espécie de epidemia. Ele abrandava, olhava para o lado, batia no peito, saudava o público, ria-se e ganhava. Ele ganhou uma corrida olímpica com um recorde do mundo e tinha um atacador desapertado. E dava fotos espectaculares     

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