MAI recusa comando único para prevenção e combate aos incêndios

Recomendação do Parlamento aprovada em 2014 por unanimidade propunha agregação da prevenção, vigilância e combate. Actual grupo de trabalho dos incêndios reúne nesta quarta-feira.

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A ministra nega taxativamente a recomendação do Parlamento LUSA/Miguel A. Lopes

São poucas as recusas do Ministério da Administração Interna (MAI) às recomendações aprovadas em 2014 pela Assembleia da República no âmbito da prevenção e combate aos incêndios, mas o gabinete de Constança Urbano de Sousa faz questão de pôr de lado qualquer mudança num ponto fulcral da questão: a filosofia tripartida da coordenação operacional de prevenção e de combate aos fogos florestais.

A ministra nega taxativamente a recomendação do Parlamento para que seja criado um comando único que agregue a prevenção, a vigilância e o combate, como tem sido recomendado por vários relatórios ao longo dos anos – incluindo pela proposta técnica coordenada pelo Instituto Superior de Agronomia, de 2006, que daria depois origem ao Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios, mas recusada por António Costa, na altura ministro da Administração Interna, que então já defendia a coordenação tripartida. Esta recomendação da Assembleia da República deriva das propostas do grupo de trabalho para a análise da problemática dos incêndios florestais (criado em 2013) e foi apresentada por todos os grupos parlamentares e aprovada por unanimidade em Maio de 2014.

Agora, o novo grupo de trabalho parlamentar sobre os incêndios está a analisar como se encontra a execução das recomendações de há três anos pelos ministérios da Administração Interna e da Agricultura.

À recomendação do Parlamento de criar uma única entidade de coordenação operacional, a MAI responde que “a opção política é a da manutenção dos três pilares do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios em termos de coordenação”: a prevenção estrutural mantém-se no Instituto da Conservação da natureza e das Florestas, na alçada do Ministério da Agricultura; a prevenção operacional é da GNR e o combate da Autoridade Nacional de Protecção Civil, ambas sob a tutela do MAI. A inexistência de uma entidade que coordene as três leva a que não tenham todas um conhecimento rigoroso do terreno e das condições e empurrem responsabilidades entre si quando algo corre mal, afirmava há dias ao PÚBLICO o engenheiro florestal Paulo Fernandes, investigador da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.

Já o Ministério da Agricultura é mais contido. “O Governo considera que para garantia da estabilidade do sistema de prevenção/combate aos incêndios no quadro da reforma da floresta não é ainda oportuno concretizar esta recomendação”, respondeu, por seu lado, o gabinete de Capoulas Santos aos deputados.

É esta filosofia de manter os três pilares separados que leva Constança Urbano de Sousa a recusar igualmente a necessidade de se definirem diferentes autoridades (política, técnica e operacional) nos vários níveis nacional, regional e local. E daí que também não aceite as propostas de ser possível ter um único comandante operacional municipal e um serviço municipal de protecção civil que agregue vários municípios.

O Parlamento propunha também que o Governo promovesse a “abrangência e cobertura de todo o território continental por parte da Força Especial de Bombeiros (FEB)” e incentivasse a constituição de equipas de intervenção permanente. Esta medida ajudaria à profissionalização dos bombeiros, para que o dispositivo não dependesse maioritariamente dos voluntários. Mas a ministra rejeita essa aposta na Força Especial, que depende da Protecção Civil, e diz que é “opção do Governo manter o modelo dual GIPS (Grupo de Intervenção de Protecção e Socorro, da GNR) e FEB”, distribuindo-os pelos distritos (os GIPS estão em 11 distritos; a FEB em sete).

As respostas a cada uma das 53 recomendações do Parlamento vão ser hoje novamente analisadas pelo grupo de trabalho dos incêndios, que tem a sua sétima reunião em nove meses. À maioria delas, o Governo responde que são medidas previstas no pacote da reforma florestal que está há dois meses à espera de discussão na comissão parlamentar de Agricultura e que deve hoje começar a pegar nele.

“O papel da Assembleia é fiscalizar as medidas que estão a ser postas em prática”, defende ao PÚBLICO o presidente do grupo, o deputado socialista Joaquim Barreto, que lidera também a Comissão de Agricultura e Mar.

A primeira recomendação era, aliás, ao próprio Parlamento: para que acompanhasse, “de forma permanente, todo o sistema associado à política florestal”, monitorizando as recomendações aprovadas ao longo do tempo, incluindo esta. Joaquim Barreto alega que todos os anos o secretário de Estado tem ido apresentar o dispositivo anual de combate aos incêndios, que a comissão fez visitas à Serra da Estrela e a Sever do Vouga, por exemplo. Mas também é verdade que foi preciso haver incêndios graves em 2016 para que se criasse este novo grupo de trabalho, e que este só pediu satisfações ao Governo em Fevereiro deste ano e as recebeu em Abril – ou seja, a concretização das medidas esteve três anos sem ser escrutinada. 

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