Trump pode mesmo ser destituído?

Impeachment. A palavra começada por "i" invadiu os jornais norte-americanos, depois de ser revelado que Trump terá tentado impedir o ex-director do FBI de investigar as ligações do ex-conselheiro para a Segurança Nacional à Rússia. O que é que está em jogo?

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Reuters/KEVIN LAMARQUE

Donald Trump está hoje mais perto de ser destituído do que ontem?
Em termos práticos, não. O processo de destituição é iniciado na Câmara dos Representantes, onde os republicanos detêm uma expressiva maioria, e não parece haver grande apetite para afastar um Presidente do seu partido tão poucos meses após ter tomado posse. Mas lendo a imprensa dos EUA, o fim de Trump parece estar próximo. A CNN diz que o memorando do ex-director do FBI, James Comey, é "um perigo existencial" para o Presidente dos EUA. Um artigo de opinião no New York Times argumenta que Trump "pode ter ultrapassado a linha da criminalidade". "Não podemos ter receio de utilizar a palavra impeachment", afirmou a congressista democrata Maxine Waters. O também democrata Al Green usou mesmo uma intervenção no Capitólio esta quarta-feira para defender a destituição de Trump. O senador republicano John McCain, conhecido por ser crítico de Trump, disse que o caso que envolve Trump e Comey tem "o tamanho e a escala do 'Watergate'".

Então por que se fala tanto dessa possibilidade?
O argumento a favor do impeachment de Trump ganhou força depois de o New York Times ter revelado na terça-feira à noite que Comey terá escrito um memorando em que relata uma conversa com o Presidente, em que este lhe terá pedido para abandonar a investigação aos contactos que o ex-conselheiro para a Segurança Nacional, Michael Flynn, estabeleceu com o embaixador russo em Washington já depois das eleições. "Espero que possa deixar isto", terá dito Trump ao ainda director do FBI depois de uma reunião a 14 de Fevereiro, um dia depois de Flynn ter apresentado a demissão. Os defensores do impeachment argumentam que este diálogo configura uma tentativa de Trump de "obstrução à justiça" – uma acusação que pode sustentar um processo de destituição.

E é verdade que Trump tentou obstruir a investigação?
É aqui que começam as (muitas) dúvidas. Para já, estamos a mover-nos no campo das hipóteses: o único facto não alternativo é que o Times avançou a notícia – entretanto confirmada por outros jornais – que o ex-director do FBI escreveu um memorando sobre uma reunião de Trump, em que a investigação a Flynn foi abordada. A Casa Branca veio negar que o Presidente tenha "pedido a Comey, ou a qualquer outra pessoa, para travar qualquer investigação", mas não negou que Trump tenha tido a conversa relatada pelo ex-director do FBI. De acordo com a lei, a obstrução à justiça implica que alguém "influencie, obstrua ou impeça", "de forma corrupta", o progresso de uma investigação. E neste ponto a questão é o que é que configura uma "forma corrupta", escreve Helen Murillo, editora da Harvard Law Review, no blog LawFare. O Presidente tem o direito de "influenciar" os dirigentes das principais agências de segurança e isso não pode ser considerado obstrução à justiça, sempre que seja respeitado "o seu dever constitucional de zelar para que as leis sejam fielmente executadas", nota Murillo. O que terá de se averiguar são, portanto, as razões que terão levado Trump a tentar influenciar Comey. "Se obstruir ou travar a investigação à Rússia era um objectivo, então estamos perante uma obstrução à justiça", conclui a jurista.

O que pensam os norte-americanos?
Ainda antes das duas mais recentes polémicas, a taxa de aprovação de Trump estava já em mínimos históricos para um Presidente em início de mandato. Cerca de 50% dos eleitores inquiridos numa sondagem realizada pelo Politico e pela Morning Consult desaprovam o trabalho do Presidente, face a 42% que têm uma opinião favorável. O mesmo estudo, realizado após a demissão de Comey, mostra que 38% do eleitorado "desaprova fortemente" Trump. Quanto a um potencial impeachment, são mais os americanos que querem ver o magnata fora da Casa Branca do que os que o querem manter. Uma sondagem da Public Policy Polling revelada esta terça-feira – realizada antes da notícia sobre o memorando – mostra que 48% dos inquiridos é a favor da destituição, contra 41% que se opõem.

O que é preciso acontecer para que seja desencadeado um processo de impeachment?
Apesar de apresentar semelhanças com um processo judicial, na verdade a destituição de um Presidente trata-se sobretudo de um procedimento político. Há três passos principais. Primeiro, a Câmara dos Representantes tem de votar a destituição, bastando uma maioria simples para que seja aprovada. Segue-se um julgamento a ter lugar no Senado, mas dirigido pelo presidente do Supremo Tribunal. Finalmente, é necessária uma maioria de dois terços no Senado para que a destituição seja concluída.

 

 

 

 

 

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