Na corda bamba

Quem raio disse que Toni Erdmann era uma comédia? Quando muito, é uma comédia triste, quase desesperada.

O mais interessante em <i>Toni Erdmann</i> é o estado periclitante de tensão em que o filme se balança permanentemente
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O mais interessante em Toni Erdmann é o estado periclitante de tensão em que o filme se balança permanentemente
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Não fazemos ideia quem achou que Toni Erdmann devia ser etiquetado como uma comédia, muito embora, sim, haja umas quantas cenas capazes de levar os espectadores à lágrima de riso.

Quanto muito, o terceiro filme da alemã Maren Ade é uma comédia triste, tristíssima, quase desesperada, sobre a tentativa de um pai tentar perceber e ajudar uma filha com a qual parece já não ter nada em comum, e nesse processo voltar a colocá-la no caminho certo — mas, afinal, quem raio decide qual é o caminho certo? Winfried não percebe onde é que Ines foi buscar a postura de mulher de negócios impiedosa, mas Ines também não percebe porque é que o pai não é capaz de compreender que o mundo, hoje, é outro e as suas dentaduras postiças e improvisações tresloucadas já não fazem parte dele — mas afinal quem decide o que é que faz ou não parte do mundo? E as brincadeiras mitómanas de Winfried, que se disfarça com uma peruca rebelde ou uma máscara folclórica, serão realmente tão inofensivas como Ines acredita que as suas decisões empresariais feitas a olhar para folhas de cálculo são? O que de mais interessante há em Toni Erdmann é o estado periclitante de tensão em que o filme se balança permanentemente, como uma corda bamba cujo ponto de equilíbrio é quase impossível de descobrir.

Ade aplica as técnicas da comédia do desconforto americana, esticando uma situação incómoda ao ponto-limite, a uma entomologia emocional germânica, buscando o momento em que a fachada gélida cede e dá lugar à explosão emocional, mesmo que contida. Pega numa das maiores actrizes alemãs contemporâneas, a espantosa Sandra Hüller, põe-na à frente de Peter Simonischek como um bloco de gelo que ele tem de esculpir dê lá por onde der, e deixa a cena correr até algo se revelar.

É nessa tensão formal, nessa busca da emoção, que Toni Erdmann se resolve, dando um passo em frente e dois atrás como o caranguejo, levando mais tempo do que seria normal para chegar ao seu destino, mas sempre levando em conta que esse tempo é fulcral para fazer a diferença e não reduzir o seu filme apenas a mais uma história de famílias disfuncionais.

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