Comissão volta a corrigir em baixa a sua previsão para o défice

Comissão prevê défice de 2,3% em 2016, com ajuda do perdão fiscal, e aponta para valores confortavelmente abaixo de 3% nos dois anos seguintes.

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Comissário Pierre Moscovici ainda prevê défices acima dos antecipados pelo Governo Enric Vives-Rubio

A Comissão Europeia voltou esta segunda-feira a rever em baixa a sua estimativa para o défice público português do ano passado, assumindo já que ele poderá ficar em 2,3% com a ajuda do plano de regularização das dívidas fiscais lançado pelo Governo. Apesar de apontar para uma evolução do défice estrutural abaixo do previsto pelo Governo e de destacar o facto de se recorrer a receitas extraordinárias, Bruxelas antecipa para os próximos dois anos défices nominais claramente abaixo de 3%, um sinal de que poderão estar criadas as condições para a saída do país do procedimento por défice excessivo (PDE).

Nas previsões de Inverno agora divulgadas, os responsáveis da Comissão Europeia revêem de 2,6% para 2,3% a sua estimativa para o défice de 2016, algo que é explicado com o impacto positivo de cerca de 0,25 pontos percentuais do programa de regularização de dívidas fiscais, posto em prática no final do ano passado. A Comissão diz que, sem medidas extraordinárias, o défice seria de 2,6%.

As autoridades portuguesas tinham-se comprometido com Bruxelas a registar um saldo negativo igual ou inferior a 2,5% em 2016. Mas entretanto o Governo já diz que o défice, com a ajuda das medidas extraordinárias, irá ficar “claramente abaixo de 2,3%”, o que, a confirmar-se, poderá significar que a Comissão terá novamente de rever a sua estimativa, algo que já fez em diversas ocasiões durante este ano.

Em relação ao défice estrutural (que retira da análise o efeito da conjuntura económica e das medidas extraordinárias), a Comissão Europeia estima que não tenha havido qualquer melhoria em 2016, apenas uma estabilização. Uma estabilização deste indicador era precisamente a exigência mínima que tinha sido feita a Portugal em Outubro, depois de ficar claro que o país não conseguiria uma redução de 0,6 pontos, o valor que seria exigível pelas regras orçamentais europeias.

Para este ano, a Comissão também reviu em baixa as suas previsões para o défice, ficando ainda assim acima daquilo que projecta o Governo. Bruxelas estima um défice de 2%, ao passo que o OE aponta para 1,6%. Mais uma vez, a Comissão afirma que a sua revisão da previsão "se deve sobretudo a uma medida extraordinária": a recuperação da garantia dada ao BPP, no valor de 0,25% do PIB. Para o défice estrutural, prevê-se um ligeiro agravamento de 0,1 pontos percentuais, o que significa que a Comissão não acredita na promessa do Governo de redução de 0,6 pontos percentuais.

Para 2018, a previsão da Comissão é de um défice de 2,2% e de um agravamento do défice estrutural. Neste caso, as projecções são realizadas adoptando um cenário de políticas inalteradas, isto é, não levando em conta a possibilidade de as autoridades portuguesas ainda virem a tomar medidas de consolidação orçamental.

Apesar de a Comissão, tanto para 2017 como para 2018, projectar um incumprimento das regras ao nível do défice estrutural, as previsões para o défice nominal dão algum conforto a Portugal quanto à possibilidade de o país vir a sair na próxima Primavera do PDE, uma vez que Bruxelas parece assumir que o limite dos 3% não deverá, de forma sustentável, vir a ser ultrapassado. No relatório, a Comissão assinala que o défice "se prepara para ficar abaixo de 2,5% no horizonte das previsões".

E na conferência de imprensa de apresentação do relatório, o comissário europeu Pierre Moscovici referiu a existência em Portugal de "progressos muito fortes". “Estamos naturalmente a monitorizar qualquer situação com as autoridades portuguesas, mas no cômputo geral este é um desempenho bem melhor”, afirmou, citado pela Lusa. Lembrou, contudo, que as decisões da Comissão sobre o PDE aplicado a Portugal serão tomadas "mais para a frente este ano, numa fase mais avançada do semestre europeu”. 

O relatório publicado esta segunda-feira destaca o facto de as novas previsões estarem sujeitas a riscos, que podem afectar os resultados pela negativa. Esses riscos estão ligados "à incerteza que envolve o cenário macroeconómico e o impacto potencialmente negativo para o saldo orçamental de medidas de apoio à banca".

Confiança e exportações ajudam economia

Em relação ao crescimento da economia, a Comissão também está agora mais optimista, apontando para uma variação do PIB de 1,3% em 2016 e de 1,6% este ano. Estes números são mesmo ligeiramente melhores do que as previsões actuais do Governo feitas quando foi apresentada em Outubro a proposta de Orçamento do Estado para 2017: um crescimento de 1,2% em 2016 e de 1,5% em 2017.

A explicação para este maior optimismo está no resultado acima do esperado registado a partir do terceiro trimestre do ano passado. "O desempenho económico forte durante a segunda metade de 2016, particularmente no turismo, melhorou as perspectivas para a economia portuguesa", afirma-se no relatório.

A Comissão traça um cenário positivo especialmente no que diz respeito ao consumo privado e às exportações. O consumo "deve manter-se robusto", tendo em conta o que são os dados da confiança dos portugueses durante os últimos meses e o efeito da subida do salário mínimo. Ainda assim, projecta-se um crescimento "mais moderado" em 2017 e 2018, por causa de um crescimento mais moderado dos salários e da subida da inflação. Depois de aumentar 2,1% em 2016, prevê-se que o consumo privado abrande para uma taxa de 1,6% em 2017 e 1,2% em 2018.

No que diz respeito às exportações, a Comissão assinala que cresceram em 2016 bem mais depressa do que a procura externa, o que significa que Portugal está a ganhar quota de mercado internacional. Isto acontece, de acordo com Bruxelas, com a ajuda fundamental do turismo e deverá manter-se em 2017. A estimativa é de um aumento das exportações de 3,9% em 2016, 4,1% em 2017 e 4,2% em 2018.

Embora se espere também uma aceleração das importações, a Comissão continua a projectar a manutenção de um excedente das contas externas portuguesas.

Em contraponto com as exportações, o ponto fraco da economia portuguesa é neste momento o investimento, que recuou 1,5% em 2016, de acordo com as contas de Bruxelas. A Comissão diz que tal se deveu à mudança para um novo período de programação dos fundos europeus (a justificação que tem sido dada pelo Governo) e a uma nova contracção do crédito concedido às empresas.

A Comissão espera agora que estes dois factores negativos deixem de se fazer sentir este ano e no próximo, apontanto para um crescimento do investimento de 3,8% e 4,2% em 2017 e 2018, respectivamente.

Neste cenário, a Comissão Europeia aponta para a manutenção da tendência de descida do desemprego que, ao contrário do que afirma o FMI, poderá ficar abaixo da barreira dos 10% durante os próximos anos. A previsão agora apresentada é de uma descida contínua da taxa de desemprego de 11,2% em 2016 para 10,1% em 2017 e 9,4% em 2018.

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