Luísa Sobral, agora menos cor-de-rosa

Gravado em Los Angeles com produção de Joe Henry e músicos como Marc Ribot e Greg Leisz, o quarto álbum da cantora encontra-a mais adulta e espontânea. Esta quarta-feira é apresentado no Teatro Tivoli, em Lisboa, e segue depois viagem pelo país.

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Luísa foi gravado em três dias e meio, sem grande preparação dr
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Faz parte de uma certa convenção social embaraçosa assinalar o crescimento de um/a adolescente declarando que “está um homenzinho/uma mulherzinha”. Um adulto em ponto pequeno, portanto. Há uma certa tentação de repetir semelhante chavão ao ouvir Luísa, quarto álbum de Luísa Sobral – terceiro no caso de considerarmos que o disco infantil Lu-Pu-I-Pi-Sa-Pa faz parte de outras contas. Talvez por suceder a esse parêntesis em que se dirigiu musicalmente às crianças o contraste pareça agora mais reforçado, mas a verdade é que a cantora que conhecemos em 2011 através da estreia The Cherry on My Cake cresceu, deixou o seu lado de menina para trás e viajou até Los Angeles para gravar com Joe Henry este disco cujo universo é o de uma mulher feita.

Esse amadurecimento, acredita, deve-se não tanto às composições quanto aos arranjos. Foi também por isso que, em conjunto com o seu manager, Vasco Sacramento, apontou na direcção de Joe Henry, cantautor por direito próprio, mas reconhecido também pelo seu trabalho de produtor em álbuns de gente do calibre de Elvis Costello, Salif Keita, Aimee Mann, Solomon Burke ou Kristin Hersh. “Queria trabalhar com alguém que viesse mexer na minha música e me tirasse um pouco o meu lado cor-de-rosa”, justifica a cantora ao PÚBLICO. “Ouvi isso na música dele, que é muito crua, e achei que seria um casamento perfeito porque me ia fazer experimentar e ouvir as coisas de maneira diferente. Se calhar não é uma coisa muito simpática de se dizer, mas acho que ele traz cojones à minha música.”

A capacidade de um músico para se reinventar, acredita, está naturalmente limitada. Daí que, em momentos cirúrgicos, seja necessário recorrer a um olhar exterior para abrir janelas que nem se sabia existirem. “Apesar de ir ouvindo sempre coisas diferentes e as minhas inspirações se reflectirem nos discos”, considera, “acho que não conseguiria reinventar-me como fiz agora sem a ajuda dele, acabo por ir muito para os mesmos sítios”. A ajuda, diga-se em bom rigor, não se limitou à figura de Joe Henry aos comandos na régie. Chamados pelo produtor, músicos de topo como Marc Ribot (guitarrista de Tom Waits e habitual na esfera de John Zorn), Greg Leisz (colaborador próximo de Bill Frisell, k.d. lang ou Joni Mitchell) ou Patrick Warren (teclista fácil de encontrar em gravações de Lana del Rey, Lucinda Williams ou Bob Dylan) deixaram a sua marca no disco. Parte destes currículos acabou por ser uma surpresa para Luísa, que não se demorou demasiado a analisar a lista de músicos com que iria gravar. Tanto assim que, ao perceber numa conversa em estúdio que Warren tocava regularmente com Dylan, apressou-se a ligar ao pai e enviar-lhe um vídeo em que os músicos actuavam na Casa Branca.

Nada, ainda assim, que lhe tenha roubado o sono. Tendo tirado um curso superior de música, Luísa Sobral diz que entre músicos a língua que se fala é a mesma, não há grande espaço para sentir-se deslumbrada ou acanhada. “Parece que sou presunçosa, mas não é nada disso”, garante. “Só que quando chegamos ali ao estúdio somos todos músicos. Claro que eles têm carreiras incríveis e são de uma outra geração, mais velhos do que eu, mas não me trataram como uma miúda, respeitaram-me sempre muito enquanto compositora.”

Três dias e meio

Luísa foi gravado em três dias e meio, sem grande preparação. A “rotina” com músicos tão experimentados era simples de seguir e de uma eficácia comprovada: a cantora mostrava-lhes uma canção, tocava para eles, os instrumentistas tomavam umas notas em relação à estrutura, depois seguiam para as cabines e experimentavam juntos um par de vezes – I’ll be home with you tonight, por exemplo, foi registado à primeira e em nenhum caso excederam os três takes. Aquilo que se ouve no quarto álbum são, portanto, as canções acabadas de tomar uma forma colectiva, sem tempo de caírem em repetições ensaiadas, captando uma forma totalmente espontânea, um estado que a autora classifica como “muito puro”.

Algo que Luísa quis preservar também na gravação da voz. Quando Joe Henry lhe sugeriu guardar o último dia de trabalho para regravar as vozes, ela recusou, preferiu manter “a reacção verdadeira àquilo que aconteceu no momento” de partilha com os músicos. “Cada vez mais a música é demasiado próxima da perfeição, mas de uma forma negativa”, queixa-se. As excepções foram as duas letras que pediu a João Monge – uma referência da sua infância, que aprendeu a admirar como “alguém que transformava o mundano e o simples em poesia” –, por receio de que pudessem não soar claras, e um tema em francês cujo texto precisava ainda de ser limado.

Agora chegou a hora de Luísa, álbum em que a sua música acolhe de forma mais declarada a folk numa relação já anterior entre jazz e pop, se mostrar em palco com a banda habitual – a que se juntou, recentemente, o guitarrista Mário Delgado. Nas próximas semanas, Luísa Sobral actua em Lisboa (Tivoli, esta quarta-feira), Porto (Casa da Música, 8 de Fevereiro), Benedita (Centro Cultural, 11), Theatro Circo (Braga, 14) e Leiria (Teatro José Lúcio da Silva, 23), seguindo-se, em Março e Abril, Ponte de Lima, Loulé, Marinha Grande e Lousada.

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