Objectivo de quem quer comprar uma televisão deve ser “investigado”

Acordos dos direitos televisivos só agradaram aos donos dos clubes de futebol, diz o presidente da Vodafone, que não vê sentido económico em que um operador de telecomunicações possa comprar uma televisão.

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"Não faz sentido que os operadores de telecomunicações estejam na produção de conteúdos", diz o presidente da Vodafone Nuno Ferreira Santos

O grupo Vodafone, dono da Vodafone Portugal, já sabe que o mercado português “é muito proactivo, inovador e por vezes sui generis”, mas ainda assim “não foi fácil” convencer o accionista do investimento que a empresa foi forçada a fazer para assinar o acordo de partilha dos investimentos nos direitos televisivos do futebol, admitiu Mário Vaz.

“Acho que os únicos accionistas que ficaram satisfeitos foram os das Sociedades Anónimas Desportivas (SAD) dos clubes”, disse ao PÚBLICO, a propósito do acordo assinado em Maio com a Nos para partilhar os direitos sobre os jogos do Benfica e do Sporting, ao qual viriam a aderir a PT (que comprou os direitos do FC Porto) e a Cabovisão. O presidente da Nos, Miguel Almeida, afirmou que só avançou para o negócio com os clubes porque a PT/Altice procurou assegurar primeiro a exclusividade dos jogos em casa do Benfica.

A Vodafone defendia o “acesso universal aos conteúdos”, mas “houve movimentações no mercado” e tornou-se “inevitável” o investimento para levar os jogos aos clientes da Vodafone, explicou Mário Vaz.

É por isso que, perante os rumores de que PT pode vir a comprar a TVI (um negócio que o presidente da PT afirmou ao PÚBLICO que não foi e não está a ser discutido), Mário Vaz diz que a posição da Vodafone continua a ser “clara”: “À semelhança do futebol, achamos que não faz sentido que os operadores de telecomunicações estejam na produção de conteúdos”.

Mas, se por acaso, os rumores tiverem fundamento (“e há tanto fumo que provavelmente alguma coisa se passará”), o presidente da Vodafone diz entender a expressão “vai haver guerra” usada por Miguel Almeida numa entrevista ao Expresso sobre a hipotética compra da TVI. “É uma expressão que subscrevo no contexto de que, se aparecer algo novo no mercado, vai ter consequências”, adiantou o gestor ao PÚBLICO.

Se o negócio acontecer, Mário Vaz entende que os reguladores (ERC, Autoridade da Concorrência e Anacom), deverão não só avaliar a sua implicação para os sectores das telecomunicações e media, como “questionar o objectivo de quem quer comprar” uma televisão, já que o negócio envolve licenças das quais decorrem obrigações legais. Se do ponto de vista económico “não se vê razão” que faça sentido, então o objectivo de quem compra “deve ser devidamente investigado e esclarecido”, sustentou.

As receitas dos canais provêm da distribuição em plataformas, da publicidade e da revenda de conteúdos, recorda Mário Vaz. A compra de uma estação por um operador talvez fizesse sentido se houvesse um “conteúdo de entretenimento, relevante e com mercado lá fora”, o que não parece ser o caso.

Quanto ao mercado publicitário, “é um bolo cada vez mais espartilhado”, que também está dependentemente da questão das audiências, e isso também parece “afastar o interesse na exclusividade”. O “único benefício” seria a redução do custo para transmitir, enquanto operador, porque também é cliente, “mas como tem de pagar o prémio para adquirir”, é um “modelo de negócio que acaba por ficar estranho”, diz o presidente da Vodafone.

Por isso, sugere ainda outra motivação: “Quem compra provavelmente quererá inflacionar o custo da distribuição desses conteúdos para os seus concorrentes, para distorcer a concorrência”, o que teria de ser visto à lupa pela regulação.

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