Fed sobe taxas no meio de uma “nuvem de incerteza” chamada Trump

Decisão era esperada pelos mercados e confirma que política monetária nos EUA se está a tornar menos expansionista a pouco mais de um mês da tomada de posse de Trump.

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Janet Yellen decidiu subir as taxas de juro nos EUA Chip Somodevilla/Getty Images/AFP

Com uma nova subida das taxas de juro e previsão de que três novas subidas poderão vir a acontecer em 2017, a Reserva Federal norte-americana confirmou esta quarta-feira que, após várias hesitações, está pronta para finalmente abandonar a política monetária ultra expansionista que adoptou desde o início da crise financeira internacional em 2008. No entanto, uma dúvida subsiste: “a nuvem de incerteza” que representa a eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos.

A decisão de subir a principal taxa de juro de referência da Fed em 0,25 pontos percentuais para um intervalo situado entre 0,5% e 0,75% era esperada pela generalidade dos analistas.

Por isso, as atenções nos mercados viraram-se muito rapidamente para as previsões – divulgadas por cada um dos membros da Fed – do número de novas subidas de taxas esperadas para o próximo ano. Aqui, notou-se uma maior agressividade por parte da autoridade monetária na sua estratégia de retirada das medidas de estímulo. Em vez das duas subidas previstas em Setembro, agora os responsáveis da Fed apontam em média para três subidas no ano que vem.

O que justifica esta mudança? Será apenas a melhoria da economia ou a perspectiva de uma presidência Trump que promete medidas de estímulo à economia como cortes de impostos e aumento do investimento público?

Na conferência de imprensa que se seguiu ao anúncio da decisão de subir taxas, a presidente da Fed garantiu que a razão por trás das decisões da Fed é a melhoria da conjuntura principalmente ao nível do mercado de trabalho, afirmando que a subida de taxas “é um voto de confiança” na economia norte-americana e traçando um cenário em que a economia está a crescer mais, o desemprego continua a cair e a inflação permanece controlada.

Janet Yellen esforçou-se igualmente para evitar um confronto directo com o presidente eleito dos Estados Unidos, que durante a campanha eleitoral a criticou em diversas ocasiões. A responsável máxima da Fed, no entanto, não conseguiu evitar passar alguns sinais de que a relação entre a autoridade monetária e a futura Casa Branca não irá ser fácil.

Depois de muito pressionada a dar indicações sobre a forma como as políticas de Trump poderão vir a influenciar as decisões tomadas, Yellen admitiu que a Fed “está neste momento a operar sob uma nuvem de incerteza”, uma vez que não é possível saber ao certo qual a estratégia económica que será de facto implementada pela Administração Trump.

Nos mercados, uma das ideias mais discutidas é a hipótese de se vir a assistir a um corte de impostos significativo e ao lançamento de um plano ambicioso de investimento público pode levar a Fed a ser mais rápida a subir taxas de juro, para evitar uma subida da inflação acima do previsto. Yellen, mesmo insistindo que não quer dar conselhos à nova administração, sempre foi afirmando que não é favorável a uma política que coloque a economia “sob alta pressão”, defendendo que “neste momento, não é óbvio que seja preciso um estímulo da política orçamental para trazer de volta a economia para o pleno emprego”.

Outra área de potencial confronto entre a Fed e a presidência é a política de regulação financeira, que Trump diz ser preciso suavizar. Yellen defendeu a imposição de maiores restrições às acções dos bancos, afirmando que essa é a forma de evitar uma nova crise de grande dimensão.

Questionada sobre a forma como irá lidar com um presidente que é conhecido por expressar publicamente a sua opinião sobre os mais diversos assuntos, tanto nas redes sociais como na imprensa, a presidente da Fed aproveitou para marcar terreno em relação a possíveis futuros confrontos. “Acredito muito na independência da Fed”, disse.

Janet Yellen irá concluir o seu actual mandato na Fed em 2018 e a maior parte das apostas vai no sentido de não ser a escolhida por Trump para liderar a Fed a partir desse momento. “Reconheço que posso ser indicada ou não para um segundo mandato”, afirmou Janet Yellen, mas, com um sorriso, deixou claro a quem a ouvia (incluindo Trump) que está decidida a concluir o seu primeiro mandato. Os próximos dois anos na Fed prometem ser agitados.

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