Compras mensais de dívida portuguesa pelo BCE podem voltar a cair

Draghi deverá anunciar prolongamento de pelo menos seis meses do programa de compra de activos do BCE. Mas escassez de dívida elegível prejudica Portugal.

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AFP / FREDRIK VON ERICHSEN

Todas as previsões apontam para que o Banco Central Europeu (BCE) decida esta quinta-feira prolongar por mais seis meses o seu programa de compra de dívida pública na zona euro, mas Portugal, já com um montante baixo de títulos elegíveis para serem adquiridos pelo BCE, pode não vir a beneficiar por inteiro dessa decisão.

A expectativa nos mercados em relação à última reunião deste ano do conselho de governadores do BCE é bastante elevada. Todos querem saber se Mario Draghi, no meio de um ambiente de incerteza criado pela crise política italiana, irá optar por reforçar a política monetária expansionista na zona euro ou se, pelo contrário, decide dar os primeiros sinais de que o banco central vai brevemente começar a inverter a marcha perante os sinais mais positivos dados pela economia.

No caso de querer dar um novo impulso expansionista, Draghi anunciará que o ritmo de compras mensais de 80 mil milhões de euros se mantém e por mais seis ou nove meses. Se quiser começar a recuar, pode baixar o volume mensal das compras para 60 mil milhões de euros, que era o nível aplicado em 2015, no início do programa.

Uma coisa, contudo, é dada como praticamente certa por todos os analistas: o BCE deverá prolongar pelo menos até Setembro o seu programa de compras de dívida pública, que na sua presente forma seria suposto terminar já no próximo mês de Março.

Para Portugal, que tem tido nas compras do BCE uma ajuda preciosa para limitar o nível das taxas de juro da dívida nos mercados, esta notícia pode implicar efeitos contraditórios. A garantia de que o BCE irá estar a actuar no mercado de dívida por mais alguns meses é certamente uma notícia positiva, principalmente no actual cenário de instabilidade a que se assiste na zona euro.

No entanto, se as regras aplicadas pelo BCE no seu programa de compra de activos se mantiverem inalteradas, existe toda a probabilidade de o banco central ter de diminuir o valor da dívida pública portuguesa que compra em cada mês.

Isto acontece porque o BCE impõe a si próprio limites para a percentagem da dívida elegível de um país que pode deter. O BCE não pode ser dono de mais de um terço da dívida total de um país ou de uma série de títulos de dívida em particular.

No caso de Portugal - que em termos relativos tem mais dívida comprada pelo BCE do que a maior parte dos outros países porque foram feitas aquisições antes do lançamento do actual programa – esses limites estão próximos de ser alcançados.

Aquilo que o BCE tem feito – em coordenação com o Banco de Portugal que operacionaliza as compras – é garantir que é possível fazer continuar a fazer compras até ao fim do programa, acertando qual é o volume mensal que é adquirido. O que isto pode agora significar é que, ao alargar o prazo de realização das compras por mais seis meses, e estando limitado na dívida pública portuguesa disponível para comprar, o BCE pode ver-se forçado a reduzir o montante de compras mensais de títulos de tesouro emitidos por Portugal.

Isto, aliás, é algo que já aconteceu durante este ano. Depois de no início deste ano o BCE ter prolongado de Setembro de 2016 para Março de 2017 o prazo para o final do programa e de ter reforçado as compras mensais de 60 para 80 mil milhões de euros, Portugal não beneficiou de um reforço da ajuda do BCE. Pelo contrário, registou-se uma ligeira redução do montante mensal de dívida e uma descida da percentagem das compras do BCE que se destinavam a Portugal.

No início, Portugal beneficiava de 2,5% das compras de dívidas dos Estados da zona euro, um valor que corresponde à percentagem de capital do país no banco central. Mas desde meados deste ano, essa percentagem caiu para 1,6%. Isto é, as compras de dívida pública portuguesa estão a ser feitas abaixo do valor que corresponderia ao peso do país no eurosistema. Um desvio que ainda se poderá alargar mais nos próximos meses.

A única forma de evitar esse cenário é o BCE anunciar esta quinta-feira uma alteração de algumas das regras do seu programa de activos, nomeadamente, aumentando os limites para a percentagem de dívida de que pode ser detentor. Alguns analistas acreditam que essa é uma possibilidade real, principalmente porque a dificuldade em encontrar títulos de dívida disponíveis se começa a fazer sentir também em países como a Alemanha, o que colocaria em causa a exequibilidade do programa.

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