Direita aposta na linha dura de Fillon como antídoto para Le Pen

“Os eleitores viram na minha candidatura os valores franceses com os quais se identificam", disse o antigo primeiro-ministro. Frente Nacional diz que resultado da votação é "uma boa notícia".

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Reuters/GONZALO FUENTES

O antigo primeiro-ministro François Fillon é o candidato da direita às eleições presidenciais francesas do próximo ano, após uma vitória esmagadora sobre o autarca de Bordéus, Alain Juppé.

Fillon obteve cerca de 67% dos votos e venceu em quase todos os departamentos do território. O resultado não deixou margens para qualquer dúvida: os eleitores do centro-direita acreditam que a sua linha dura é o antídoto para conter a Frente Nacional de Marine Le Pen. A generalidade das sondagens prevê uma segunda volta, em Maio, entre ambos.

No seu discurso de vitória, Fillon posicionou-se claramente à direita, incluindo referências ao “orgulho em ser francês”. Definindo a presidência de François Hollande como “patética”, o candidato disse que “a França quer a verdade e os actos”. “Os eleitores viram na minha candidatura os valores franceses com os quais se identificam: vou defender esses valores e iremos partilhá-los com todos aqueles que, dentro das suas diferenças, amam a França”, acrescentou.

O secretário-geral da Frente Nacional, Nicholas Bay, disse que a vitória de Fillon é “uma boa notícia para Marine Le Pen”, uma vez que o candidato conservador “não vai conseguir unir os franceses”. “Em campanha, a direita fala como a Frente Nacional; no poder, governa como a esquerda”, acrescentou.

À medida que a vitória de Fillon se tornava mais evidente, dirigentes da Frente Nacional lançavam mensagens no Twitter em que recordavam frases antigas do candidato que contradizem a imagem de “duro” em questões de imigração ou segurança. “Voz forte mas mãos moles: o verdadeiro Fillon quer pôr imigrantes nas nossas cidades”, escreveu um conselheiro regional.

Uma das questões que a escolha de Fillon levanta é qual a estratégia que Marine Le Pen adoptará daqui para a frente. A aproximação do programa de Fillon às posições da Frente Nacional em alguns dos temas que lhe rendem mais apoios – a imigração e o terrorismo – pode obrigar o partido a reorientar a sua abordagem na corrida ao Eliseu.

A partir de agora, a palavra de ordem entre a direita é "união". Sarkozy, que tinha manifestado apoio a Fillon, foi o primeiro a felicitar o vencedor e pediu que o partido se una em redor da sua candidatura. Juppé reconheceu a “grande vitória” do seu adversário e garantiu-lhe o seu apoio.

À esquerda, o secretário do Partido Socialista, Jean-Christophe Cambadélis, qualifica o resultado como a vitória da “ultradireita”, juntando-se a outros dirigentes que destacaram a “violência” do programa de Fillon. Em plena crise interna, as sondagens dão como quase certo falhanço dos socialistas no objectivo de passar à segunda volta. François Hollande ainda não desfez o tabu quanto à sua recandidatura, mas o primeiro-ministro, Manuel Valls, deu indicações de que pode avançar “dentro de dias”.

A escolha de Fillon representa uma viragem à direita dos Republicanos, numa tentativa de conseguir atrair algum eleitorado da Frente Nacional. O ex-primeiro-ministro de Sarkozy recusa a visão de uma sociedade francesa “multicultural”, nomeando concretamente o Islão como um “problema” para o país. Quer ainda travar a adopção de crianças por casais homossexuais e é contra a descriminalização do aborto. O programa de Fillon inclui ainda um conjunto de reformas económicas duras, que passam por despedimentos no sector público e pelo alargamento do horário semanal de trabalho.

Cerca de 4,5 milhões de eleitores registaram-se para escolher o candidato do centro-direita, superando ligeiramente a participação da primeira volta, de acordo com a organização. A subida sugere que o eleitorado de esquerda – há uma semana foram 500 mil a votar nas primárias da direita – se voltou a mobilizar, embora sem conseguir impedir a eleição de Fillon. Segundo uma sondagem do canal BFMTV, 64% dos eleitores que votaram neste domingo dizem-se de centro e de direita, enquanto 15% diz ser de esquerda e 9% da Frente Nacional.

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