Trump escolhe uma antiga "Never Trump" para embaixadora nas Nações Unidas

A governadora da Carolina do Sul, Nikki Halley, é a primeira mulher nomeada pelo Presidente eleito. Filha de imigrantes indianos, é a governadora mais jovem dos Estados Unidos.

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Uma semana depois de ter começado a preencher o seu futuro Governo apenas com homens brancos, a maioria conotados com uma linha dura e pelo menos um ligado à extrema-direita, Donald Trump nomeou esta quarta-feira, de uma só vez, um exemplo de conservadorismo menos radical e representativo de várias categorias demográficas que tinham ficado de fora até agora: Nikki Haley, uma mulher filha de imigrantes indianos, feroz opositora de Trump até à vitória do candidato nas primárias do Partido Republicano e a mais jovem governadora dos Estados Unidos, vai ser a próxima embaixadora do país nas Nações Unidas.

As diferenças entre a governadora da Carolina do Sul e Donald Trump ficaram enterradas depois dos comunicados que ambos divulgaram esta quarta-feira.

"A governadora Haley deu provas de conseguir unir as pessoas, independentemente dos seus contextos sociais ou das suas filiações partidárias, para pôr em prática decisões benéficas para o seu estado e para o nosso país", escreveu Donald Trump. O Presidente eleito dos Estados Unidos salientou também o que diz ser a habilidade da governadora da Carolina do Sul para negociar: "Ela tem provas dadas a negociar acordos, e nós queremos negociar muitos acordos. Vai ser uma grande líder como nossa representante no palco mundial."

Nikki Haley respondeu aos elogios dizendo que gostaria muito de poder terminar os dois anos que lhe faltam para cumprir dois mandatos como governadora da Carolina do Sul, mas não podia recusar a proposta de Trump: "Quando o Presidente acredita que temos uma contribuição importante a dar para o bem da nossa nação, e para a posição do nosso país no mundo, é preciso levar em conta esse apelo."

A governadora só deixará o seu cargo na Carolina do Sul depois de ver confirmada a nomeação como embaixadora dos EUA nas Nações Unidas pelo Senado norte-americano, uma câmara em que o Partido Republicano está em maioria. Em 2013, quando o Partido Democrata estava em maioria no Senado, a actual embaixadora, Samantha Power, viu confirmada a sua nomeação pelo Presidente Barack Obama com apenas dez votos contra dos republicanos.

Apoio do Tea Party

Haley foi eleita governadora da Carolina do Sul em 2010, incluída na onda de vitórias do movimento ultraconservador Tea Party – não era sequer favorita para vencer as primárias no seu partido, mas a três semanas dessa decisão recebeu o apoio de Sarah Palin, uma das figuras mais conhecidas desse movimento. Foi reeleita em 2014 com 55,9% dos votos, a maior diferença registada na Carolina do Sul desde 1990.

Nascida em Bamberg, na Carolina do Sul, filha de imigrantes indianos, Nimrata Nikki Randhawa tem 44 anos e é casada com Michael Haley, um oficial da Guarda Nacional norte-americana que esteve no Afeganistão entre 2012 e 2013. Foi criada numa família sikh mas converteu-se ao cristianismo e frequenta a Igreja Metodista.

A mulher agora escolhida por Donald Trump para embaixadora dos EUA nas Nações Unidas não tem experiência em política externa, mas os seus admiradores elogiam-lhe a capacidade para negociar e estabelecer pontes no seu estado.

Foi a primeira mulher e a primeira candidata de uma minoria étnica a ser eleita governadora da Carolina do Sul, um estado marcado por divisões raciais. Saltou para a ribalta nacional no ano passado, depois do tiroteio numa igreja em Charleston, em que o jovem branco Dylann Roof matou nove afro-americanos – no seguimento do tiroteio, Nikki Haley defendeu, e conseguiu, a retirada da bandeira da Confederação do edifício do Capitólio da Carolina do Sul: "Todas as pessoas devem sentir que fazem parte deste local. Há lugar para esta bandeira, mas não é num sítio que representa todas as pessoas da Carolina do Sul."

Apesar de ter recebido o apoio de Sarah Palin em 2010, Nikki Haley tem governado a Carolina do Sul como um misto de Tea Party, conservadorismo tradicional e um pouco de abertura a ideias defendidas pelos mais liberais: defende a redução de impostos, menos regulação e é contra os sindicatos; é contra uma lei que obrigaria os transgénero a usarem as casas de banho de acordo com o seu sexo biológico em vez da sua identidade de género; é contra o aborto sempre que não esteja em causa a vida da mulher; estimula a imigração legal mas combate activamente a ilegal e defende que os cidadãos têm de mostrar um documento com fotografia nas eleições – uma proposta que é vista pelos seus opositores como prejudicial para as minorias, principalmente os afro-americanos mais pobres, para quem obter um documento de identificação pode ser muito dispendioso, e que votam tendencialmente em maior número no Partido Democrata.

Durante a campanha para a escolha do representante do Partido Republicano que iria lutar pela Casa Branca, Haley criticou duramente Donald Trump, e apoiou primeiro Marco Rubio e depois Ted Cruz. As diferenças em relação a Trump ficaram evidentes em Janeiro deste ano, durante a resposta oficial do Partido Republicano ao discurso de Barack Obama sobre o Estado da União: "Vivemos num tempo de ameaças com poucos paralelos na memória recente. Durante estes tempos de ansiedade, pode ser tentador seguir o apelo das vozes mais furiosas. Temos de resistir a essa tentação. Ninguém que esteja disposto a trabalhar muito, a seguir as nossas leis e a amar as nossas tradições deve sentir-se mal recebido neste país."

Haley confirmou no dia seguinte que aquelas palavras dirigiam-se também a Donald Trump, e transformou-se rapidamente num alvo das vozes mais extremistas nas redes sociais e no site de notícias Breitbart, que foi dirigido pelo actual principal estratego de Donald Trump na Casa Branca, Steve Bannon.

Trump respondeu às críticas de Haley no Twitter no dia 1 de Março: "O povo da Carolina do Sul sente vergonha da Nikki Haley!" E Haley respondeu à crítica de Trump na mesma rede social: "Bless you heart" – uma expressão que no Sul dos EUA é muitas vezes usada para substituir uma resposta mais dura.

Apesar da guerra que travaram durante as eleições primárias no Partido Republicano, Nikki Haley acabou por anunciar que iria votar em Donald Trump nas eleições gerais, ainda durante a convenção do partido, em Julho.

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