CGD vai “ter de enfrentar grandes desafios”, alerta novo presidente

António Domingues enviou uma carta aos trabalhadores onde fala da aposta em “prioridades claras" e num "programa de execução rigoroso e determinado”.

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António Domingues foi ontem oficializado como presidente executivo da CGD Fernando Veludo/NFactos

Um dos primeiros actos do novo presidente executivo da Caixa Geral de Depósitos, António Domingues, foi enviar uma carta aos trabalhadores do grupo. Nela, o gestor de 59 anos, que ocupava a vice-presidência do BPI, deixa mensagens de incentivo mas onde não faltam alertas. Começando por realçar a experiência da nova equipa de administradores, António Domingues diz que o banco irá, com “o apoio e colaboração” de todos os funcionários, “ultrapassar os difíceis problemas que têm afectado nos últimos anos esta grande instituição e, em termos gerais, o sistema financeiro português”.

Na carta, onde faz questão de escrever "clientes" com letra maiúscula, António Domingues sublinha que a CGD é o maior banco nacional, liderando em áreas como o crédito e número de clientes, dizendo querer reforçar essa posição.

“Sabemos contudo”, realça, “que vamos ter de enfrentar grandes desafios, resultantes da conjugação de factores internos e externos, num contexto de mudança estrutural do modelo de funcionamento dos serviços financeiros, em consequência das alterações tecnológicas e do próprio padrão de comportamento" dos clientes. Além disso, diz, “as previsões apontam para um cenário de limitado crescimento económico e baixas taxas de juro, maiores exigências regulamentares e de capital, tudo isto impondo uma forte pressão na margem financeira e na rentabilidade do negócio”.  O desafio será vencido, diz, “com prioridades claras e um programa de execução rigoroso e determinado”.

Sobre as prioridades, nada é dito em concreto, mas são dadas pistas: “Vamos servir os clientes cada vez melhor, vamos mobilizar-nos para cumprir os objectivos de desempenho, melhorar a receita, controlar os custos, gerir adequadamente os riscos e utilizar com o maior rigor o capital público que nos está confiado”. Na quarta-feira, o primeiro-ministro, António Costa, já enviara uma saudação e um recado público à nova gestão da CGD: desejou-lhes um "bom trabalho” e exprimiu o desejo de que os gestores “retribuam devidamente o investimento que o accionista, que são todos os contribuintes portugueses, fazem na CGD".

Totalmente omisso na missiva está o facto de o banco se preparar para avançar com um profundo programa de saída de pessoal via reformas antecipadas e rescisões por mútuo acordo, além do encerramento de balcões. O banco tem até 700 milhões para gastar com a redução de trabalhadores, valor que virá da recapitalização em curso e avaliada em 5160 milhões de euros. A fasquia mínima que está em cima da mesa para o emagrecimento dos quadros é de 2500 pessoas, mas o plano considera um adicional de 500 saídas.

Esta quinta-feira, a comissão de trabalhadores pediu já uma reunião com a comissão executiva. O objectivo, explicou ao PÚBLICO Jorge Canadelo, coordenador da estrutura que representa os trabalhadores do banco estatal, é que o encontro possa ser marcado já para a próxima semana. A comissão espera que, nessa altura, possa conhecer o plano de reestruturação da CGD e as eventuais consequências para os trabalhadores.

Sobre o tema da recapitalização, António Domingues refere que “o aumento de capital que vai ser efectuado, em condições que alguns consideravam impossíveis, vai permitir um importante reforço do balanço”, e fazer da CGD “uma das instituições mais fortes do mercado”.

A injecção de capital, diz, “cria condições para gerar rentabilidades futuras positivas e remunerar adequadamente os capitais investidos pelo Estado, objectivo essencial para a estabilidade, solidez e contínuo crescimento” do banco. Mesmo assim, puxando pela motivação dos trabalhadores (cerca de 9500 em Portugal, a que acrescem mais quase 6600 a nível internacional) sublinha que “acima de tudo contará o profissionalismo e dedicação das nossas equipas, sem os quais tudo o resto será em vão”. A carta acaba mesmo com um impulsionador “Mãos à obra!”.

Pelouros clarificados

Esta quinta-feira, após ter sido oficializada ontem a nova gestão do banco público, ficou fechada a distribuição de pelouros pelos administradores executivos.

O presidente executivo da Caixa Geral de Depósitos (CGD), António Domingues, vai ter a seu cargo áreas como a direcção de auditoria interna e a de assuntos jurídicos, ficando também com o controlo da Caixa BI e da área de Seguros e Saúde (onde está associada à Fosun, por via da Fidelidade).

Emídio Pinheiro, que estava à frente do banco do BPI em Angola (o BFA), fica com a responsabilidade dos negócios nos mercados africanos: Angola, Moçambique, Cabo Verde e S. Tomé, além do BNU e das sucursais em Macau, Timor e China.  No caso de Moçambique, a CGD tem como sócios o BPI, além de investidores locais. Quanto a Angola, o banco fez no ano passado um investimento de 174 milhões para ficar com a posição do Santander e assegurar 51% do Banco Caixa Geral Angola (onde tem parceiros como a Sonangol e António Mosquito). Também no ano passado, a CGD acompanhou um aumento de capital do banco moçambicano, o BCI. E a estratégia do banco passa por continuar a ter uma presença relevante nestes dois mercados.

Já no caso de Espanha, este mercado deverá sofrer os impactos do redimensionamento da actividade do banco, tal como acontecerá em Portugal. Henrique Cabral de Menezes, que estava colocado pela CGD no Brasil, fica com a tutela das operações neste país e em Espanha, bem como de diversas outras sucursais (incluindo França, Londres e Nova Iorque). Além disso, fica responsável pela área financeira do grupo.

No final de Junho, a CGD detinha 729 agências em Portugal, menos 35 face a Dezembro do ano passado. Já em Espanha, o número manteve-se inalterado nas 110. Olhando para o número de trabalhadores no mercado doméstico, este quase não mexeu no primeiro semestre, diminuindo apenas em nove funcionários face ao final de 2015 (para 9537).

Pedro Leitão, que esteve ligado à PT, terá a seu cargo as direcções de acompanhamento de particulares e de empresas, grandes empresas e banca institucional, além da vertente imobiliária (que inclui investimentos como o empreendimento de Vale do Lobo, via Wolfpart).

A João Tudela Martins (ex-BPI) caberá a direcção de gestão de risco, ficando Paulo Silva (que já esteve no BPI e na Vodafone) com a área de marketing e comunicação; sistemas de informação e operações. Quanto a Tiago Marques (também ex-BPI), tem a seu cargo a área de recursos humanos.

As alterações no banco incluem ainda Manuel Ferreira de Oliveira (ex-presidente da Galp), que vai presidir à comissão que fixa as remunerações dos gestores, e Guilherme d’Oliveira Martins (ex-ministro das Finanças do PS e actual administrador da Gulbenkian), que é o novo presidente do conselho fiscal. Já a mesa da assembleia geral será liderada por Paulo Mota Pinto, antigo deputado do PSD que, em 2014, chegou a ser apontado como chairman do BES antes da criação do Novo Banco.

Depois, a administração conta ainda com três não executivos: Angel Corcóstegui Guraya, Herbert Walter e Pedro Norton de Matos. Com Raquel Martins

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