CGD tem até 700 milhões para gastar com cortes de pessoal

António Domingues assume nesta quarta-feira a presidência do banco público e uma das suas principais missões será reduzir o número de trabalhadores e de balcões, sob pressão política.

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PCP está contra qualquer plano que reduza “a actividade” da CGD Paulo Pimenta

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) tem até 700 milhões de euros reservados para gastar com rescisões por mútuo acordo e reformas antecipadas, em Portugal e no estrangeiro. Estes cortes, que poderão chegar aos 3 mil trabalhadores, são um dos maiores desafios de António Domingues, o novo presidente do banco público, que assume funções nesta quarta-feira.

O montante a despender com as compensações a funcionários que deixarem a instituição financeira tem um tecto mínimo de 500 milhões, mas está previsto que possa ser reforçado em 200 milhões. Este valor é encarado como uma margem de segurança para garantir o objectivo de redução de custos com pessoal e que envolve ainda o encerramento de balcões, no âmbito da recapitalização negociada com Bruxelas. A fasquia mínima que está em cima da mesa para o emagrecimento dos quadros é de 2500 pessoas, mas o plano considera um adicional de 500 saídas. O redimensionamento deverá ser feito de forma faseada e com recurso a parte do montante da recapitalização (até 2700 milhões no aumento de capital, 960 milhões de conversão de capital contingente e 500 milhões de transferência das acções da Parcaixa, a que se juntam mais 1000 milhões de dívida subordinada).

É certo que a CGD já tem vindo a reduzir o número de funcionários, e de balcões, mas a velocidade tenderá agora a acelerar. Aliás, o plano de reestruturação aprovado em 2013 no âmbito da última recapitalização já previa uma “melhoria da eficiência operacional” para continuar a reduzir os custos via agências e trabalhadores. Também os negócios em Espanha foram já alvo deste processo, com redução de pessoal.

No caso da actividade bancária em Portugal, o relatório e contas da CGD de 2015 dá conta de uma redução de 448 funcionários (-5,1%) face ao ano anterior, chegando ao total de 8410 trabalhadores. De acordo com a CGD, esta diminuição foi influenciada pelo programa Horizonte, lançado no ano passado para facilitar as pré-reformas ou aposentações voluntárias.

Olhando para os dados até 2010, o ano anterior à entrada da troika de credores em Portugal, verifica-se que o ritmo de corte de pessoal e de balcões tem sido menos acentuado do que o dos principais bancos privados, como é o caso do BCP e do BPI. De acordo com os dados disponibilizados recentemente pela Associação Portuguesa de Bancos (APB), entre 2010 e 2015, o BCP reduziu o número de balcões em 25% e o BPI em 22%, contra os 12% da CGD. E se o BCP era o líder em agências em 2010, essa posição cabe agora à CGD, com 764 (que compara com as 656 do BCP).

Olhando para a geografia da presença da CGD, verifica-se que foi o distrito do Porto o mais afectado, com menos 18,5% (baixando a fasquia dos cem balcões, para 97). Segue-se Setúbal, Leiria e Viana do Castelo. No caso de Lisboa, a descida foi de 14,7%, para 185 balcões, registando aqui a descida mais pronunciada em termos absolutos, com menos 32 unidades no distrito. No sentido contrário está Bragança, que foi o único a registar um reforço, com mais um balcão.

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Também a diminuição de pessoal tem sido feita de forma mais expressiva nos dois bancos privados, com os dados a mostrarem que a maioria dos trabalhadores está há mais de 15 anos no banco público.

Recados e receios

“O negócio bancário tem evoluído, a forma de comunicação entre banca e clientes também. É um processo natural que a CGD tem de acompanhar”, defenderam já as Finanças. Na semana passada, o ministro Mário Centeno voltou a sublinhar, falando sobre a CGD, que os bancos europeus “têm vindo a redimensionar-se face às novas condições de mercado e à crescente digitalização dos serviços bancários”.

O certo é que o discurso do Governo sobre o redimensionamento da CGD foi evoluindo: primeiro, falou-se do negócio em Espanha, e só depois se mencionou a operação do mercado doméstico. E, se numa primeira instância o corte de pessoal era por via de reformas antecipadas, na semana passada o ministro já falou também em “rescisões por mútuo acordo, num ambiente de cooperação e paz social”.

A Comissão de Trabalhadores da CGD já demonstrou o seu desagrado, afirmando que os cortes são “contraditórios” com o discurso de reforço do banco público. Quanto aos partidos à esquerda do PS, estes querem conhecer o plano de reestruturação, mas se o BE foi menos exigente, falando sobretudo da importância da capitalização, o PCP colocou outras balizas opondo-se a qualquer plano de reestruturação que reduza postos de trabalho.

À partida, os comunistas estão contra qualquer plano que reduza “a actividade” da CGD e isto é o mesmo que dizer que não apoiam a redução de balcões e de trabalhadores através de reformas antecipadas ou de rescisões por mútuo acordo. No léxico do PCP, estas duas formas de redução significam apenas a destruição de postos de trabalho. “Discordamos da forma restrita de se considerar despedimento apenas quando é despedimento colectivo”, disse Jorge Pires, da comissão política do comité central do PCP. “Não apoiamos soluções que passem pela saída de trabalhadores”, acrescentou.

Contas auditadas

Outro dos trabalhos que o novo presidente da CGD tem em mãos a partir desta quarta-feira é a contratação de uma auditoria independente anunciada pelo ministro das Finanças. Logo em Junho, quando falou pela primeira vez da situação do banco público, o governante anunciou a realização de uma “auditoria independente a actos de gestão da CGD praticados a partir de 2000”.

Apesar de ser uma auditoria a pedido do executivo, será contratada pela nova administração da instituição financeira. A recapitalização deve avançar só depois da sua finalização, mas as Finanças não estão preocupadas com o timing e acreditam que este é um trabalho que estará concluído antes do final do ano.

Esta auditoria foi a resposta do Governo às iniciativas da oposição. PSD e CDS avançaram com duas propostas no Parlamento: a comissão de inquérito, que avançou, e uma auditoria “externa e independente” à gestão do banco público. Também o BE pedia uma auditoria, mas forense, às contas do banco público. Apesar das iniciativas, a proposta do Governo será a única a avançar além do inquérito parlamentar. Com Liliana Valente

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