Momices revisteiras

Uma tentativa louvável de fazer uma comédia romântica moderna portuguesa, perdida pelo desencontro de tons entre argumento e realização.

Foto

Houve uma palavra que nos andou na ponta da língua durante os intermináveis 98 minutos de Refrigerantes e Canções de Amor mas que só após a projecção conseguimos finalmente identificar: “embaraçoso”. Embaraçoso, porque é mais um exemplo do tiro no pé que o cinema feito em Portugal dá quando quer ser “comercial” e “popular”, mas sobretudo porque é um caso gritante de desencontro entre um argumento com potencial e um realizador que o tresleu por completo.

Explicando melhor: Refrigerantes e Canções de Amor parte de um argumento original do humorista e radialista Nuno Markl, uma comédia romântica doce-amarga sobre a crise depressiva de um músico reconvertido em compositor de publicidade, onde reconhecemos muito do tom pop e non-sense que Markl soube imprimir às suas criações para televisão. (Lembrámo-nos, para dar uma ideia do universo da coisa, de Forgetting Sarah Marshall, a boa comédia de Nicholas Stoller que em Portugal levou o título idiota de Um Belo Par de Patins). Para que a coisa resultasse seria preciso um realizador capaz de saber traduzir esse tom em imagens.

Em vez disso, temos Luís Galvão Teles, um dos poucos nomes do cinema feito entre nós que se tem regularmente abalançado à comédia, com resultados geralmente bastante fracos (apesar do sucesso de bilheteira de A Vida é Bela ou Dot.com). Galvão Teles acredita que a melhor maneira de filmar esta história é carregando nas momices revisteiras e nos ângulos invulgares para “fazer moderno”, montando três grandes planos em curta sucessão onde um único plano geral chegaria, forçando os actores (sobretudo Ivo Canelas e João Tempera) ao constante over-acting, desaproveitando em absoluto as boas ideias que há no argumento. Argumento que não é perfeito (a trama secundária dos problemas do ex-colega de banda não adianta nem atrasa absolutamente nada), mas onde se percebe a espaços uma melancolia certeira e uma ideia de humor muito longe do que aparece no écrã. (Nota mais, no entanto, para a presença descontraída de Jorge Palma e Sérgio Godinho e para a frescura de Victória Guerra.) É como se pedíssemos a Benny Hill para dirigir Louis CK, e o resultado é – lá está – “embaraçoso” – uma oportunidade perdida, e é pena que assim seja.

Sugerir correcção
Comentar