IEFP está a investigar denúncias de fraude nos estágios

Conselho Nacional de Juventude recusa-se, para já, a revelar os nomes das empresas. Primeiro quer garantias de que os jovens envolvidos não serão punidos.

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Jovens estagiários receiam represálias se denunciarem publicamente as empresas Enric Vives-Rubio

O Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) já está a investigar as denúncias de fraude nos estágios subsidiados, mas ainda não conseguiu identificar as empresas envolvidas. Fonte oficial do instituto garantiu ao PÚBLICO que nesta segunda-feira de manhã contactou o Conselho Nacional de Juventude (CNJ) – entidade que denunciou o caso ao Jornal de Notícias - para identificar as empresas envolvidas e perceber a dimensão do problema e que continuará a desenvolver os contactos necessários para travar a alegada fraude.

“Estamos a tentar apurar junto do CNJ e das ordens profissionais o que está a acontecer”, assegurou o responsável pela comunicação do IEFP, lamentando que o conselho não tenha revelado as empresas em causa, para que os serviços pudessem suspender o financiamento dos apoios e averiguar se está em causa matéria criminal.

“Somos os principais interessados em perceber o que está a acontecer. Era bom que o CNJ concretizasse as pessoas e as empresas que participaram nestas situações. Se sabe de casos concretos, deveria reportá-los a nós e às autoridades mas, infelizmente, ainda não temos nenhuma situação em concreto”, acrescentou.

Em causa está uma prática que pode configurar crime fiscal ou fraude na obtenção de subsídio público. De acordo com Hugo Carvalho, presidente do CNJ, há empresas a exigir a centenas de estagiários que sejam eles a suportar a comparticipação da bolsa de estágio e a pagar a taxa social única – encargos que, de acordo com o regulamento dos estágios apoiados pelo IEFP, são uma responsabilidade da entidade patronal.

Apesar das tentativas do IEFP, Hugo Carvalho não quer, para já, formalizar uma queixa e identificar, tanto as empresas que foram alvo de denúncias, como os jovens envolvidos, que podem ser acusados de conluio. “Não acreditamos que seja esse o caminho”, justifica ao PÚBLICO, alegando que os jovens que se dirigiram ao CNJ pediram sigilo e “têm medo de represálias no futuro”.

O CNJ quer iniciar um diálogo com o Governo e com o IEFP para garantir que os jovens envolvidos não terão nenhuma penalização. Só depois disso coloca a hipótese de tornar públicos os nomes dos escritórios de advogados, gabinetes de arquitectura e consultórios de psicologia - as áreas identificadas como as mais problemáticas e cujo acesso à profissão depende de um estágio profissional.

Hugo Carvalho deixa ainda uma sugestão: o IEFP deveria enviar cartas a todos os estagiários subsidiados a apelar para que não entreguem o dinheiro da bolsa aos patrões.

Mesmo sem haver a identificação das empresas suspeitas, o PÚBLICO apurou que o conselho directivo do IEFP poderá solicitar ao serviço de auditoria que investigue o assunto e, caso haja suspeitas de fraude, remeter os casos para o Ministério Público. Por outro lado, o Fundo Social Europeu, responsável por financiar parte significativa dos estágios, também deverá accionar os mecanismos de controlo para averiguar as denúncias agora vindas a público.

Antes de revelar que tinha iniciado contactos com o CNJ, o IEFP começou por enviar um comunicado aos jornalistas a dizer que “só pode actuar relativamente a casos concretos de irregularidade quando estes sejam detectados ou quando existir informação que habilite os serviços do instituto a desencadear os procedimentos adequados”. Contudo, acrescentava, até ao momento não houve “qualquer denúncia ou informação concreta neste âmbito”.

Porém, depois de a CGTP ter desafiado o Ministério do Trabalho a “aplicar a tolerância zero para este tipo de comportamentos patronais e agir, com todos os meios ao seu alcance, para criminalizar os responsáveis” e pedido a sua intervenção imediata, o instituto acabou por concretizar as diligências que estava a levar a cabo.

As práticas denunciadas pelo CNJ dificilmente são detectadas nos controlos, como reconhece o seu presidente. “Todos os meses os jovens recebem o seu salário [no caso de um licenciado, a bolsa pode chegar aos 691 euros] e depois vão ao multibanco para levantar 35% desse valor, que entregam às entidades promotoras do estágio”, exemplificou, acrescentando que há casos em que o estagiário tem também de pagar do seu bolso os descontos para a Segurança Social.

O responsável pela Autoridade para as Condições de Trabalho, Pedro Pimenta Braz, garante que também não recebeu denúncias destas práticas e que não foram detectadas situações como as relatadas pelo CNJ. Contudo, lembra ao PÚBLICO, normalmente a inspecção intervém quando estão em causa falsos estágios e “nas situações narradas parece-nos estar em causa questões penais que nos ultrapassam”. Além disso, se estiver em causa o incumprimento das cláusulas do contrato de estágio, a matéria é da competência do IEFP.

Só 16% dos estagiários ficam na empresa

Os estágios profissionais tiveram, nos últimos anos, um aumento significativo. Porém, um relatório do Ministério do Trabalho divulgado em Junho mostra que, embora 67% dos ex-estagiários apoiados pelo IEFP tenham conseguido um emprego nos 12 meses seguintes ao estágio, só 38,3% voltaram ao mercado de trabalho sem qualquer apoio adicional do Estado.

Outro dado relevante é o facto de apenas 16% dos jovens terem ficado na empresa onde tinham feito o estágio, sem qualquer apoio subsequente.

No que respeita à qualidade do emprego criado, o Ministério do Trabalho conclui que só 27% dos ex-estagiários que conseguiram emprego sem subsídios adicionais tinha um contrato permanente (sem termo), percentagem que sobe para 33% “quando o contrato é feito com a entidade onde realizou o estágio”.

Este estudo, que inclui uma análise a outros apoios ao emprego, servirá de base à revisão dos apoios ao emprego dados pelo IEFP às empresas e aos desempregados. Uma versão inicial da proposta já está em discussão com os parceiros sociais.

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