Barroso vai para o “banco que dirige o mundo”. O que é o Goldman Sachs?

O gigante financeiro já esteve envolvido em escândalos financeiros e sobreviveu sempre mais forte. O que é e por que tem tanto poder?

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A sede do Goldman Sachs, em Wall Street, Nova Iorque REUTERS/Brendan McDermid

É conhecido como "the firm" (a firma) e enquanto o mundo se debate com crises financeiras, o gigante do mundo financeiro não só sobrevive como mantém e cresce em poder. O Goldman Sachs é um grupo financeiro anglo-saxónico, que esteve envolvido na crise da maquilhagem das contas da Grécia, no escândalo Abacus em que era acusado de enganar os próprios clientes e, depois de todos esses casos, cresceu a influência que tem no mundo.

“As pessoas que se preocupam apenas em ganhar dinheiro, não vão aguentar esta empresa – ou a confiança dos seus clientes – por muito mais tempo”. Este foi um dos avisos dados por Greg Smith, banqueiro do Goldman Sachs durante 12 anos, que se demitiu com uma carta que tornou pública no New York Times. "Why I am leaving Goldman Sachs" (Porque saio do Goldman Sachs) foi um texto que caiu com estrondo no grupo financeiro, que já estava a braços com alguns problemas de reputação, não de poder, sobretudo desde o grande escândalo Abacus, de 2007.

Mas não abalou o gigante financeiro, que para o jornalista francês Marc Roche, funciona com o lema: "Quem faz mais dinheiro, detém o poder". Ou, nas palavras do próprio CEO do banco de investimento, Lloyd Blankfein: "Sou um banqueiro que faz o trabalho de Deus".

 

O demissionário Greg Smith foi apenas um dos nomes que falou sobre os problemas do gigante financeiro que, muitos dos seus críticos dizem, mais do que dominar o mundo financeiro, controla governos e instituições com relevância por todo o mundo. E como o faz? "Funcionam em todo o mundo, gostam de arranjar pessoas inteligentes de outras partes do mundo, levá-las a Nova Iorque, dar-lhes cargos importantes no Goldman. É quase como uma universidade", explicou Richard Sylla, professor da Stern Business School, no documentário "Goldman Sachs - O banco que dirige o mundo", de Jérôme Fritel, baseado no livro do jornalista Marc Roche.

 

GOLDMAN SACHS - O BANCO QUE DIRIGE O MUNDO / La Banque qui Dirige le Monde (2012) from fimda estrada on Vimeo.

Para quem analisa o mundo financeiro, o Goldman Sachs funciona assim como uma porta giratória entre o banco e lugares de influência do poder. Muitos dos nomes influentes em altos cargos políticos passaram por lá, como o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi. Durão Barroso fez o caminho inverso. Esteve primeiro em cargos de influência e agora vai para presidente não-executivo. 

Mas não só. Passaram por lá Hank Paulson, que foi presidente do Goldman Sachs e depois secretário de Estado do Tesouro dos Estados Unidos; António Borges, entretanto falecido, que chegou a ser director do Fundo Monetário Internacional para a Europa; Mário Monti, ex-primeiro-ministro italiano; Romano Prodi, ex-primeiro-ministro italiano e também ex-presidente da Comissão Europeia; Otmar Issing, que passou pelo BCE, entre outros. 

Com essa rede de influência, o grupo financeiro – que não funciona como um banco normal com agências e o edifício da sua sede nem tem sinalética a identificá-lo –, está no centro das decisões políticas em todo  o mundo. E isso já lhes trouxe alguns dissabores.

Afinal, o Goldman Sachs "é o banco que manda no mundo". Foi assim que o corretor bolsista Alessio Rastani classificou o Goldman Sachs em entrevista à BBC em 2011. Em plena crise financeira, o corretor tornou-se um fenómeno viral na Internet por ter dito aquilo que muitos críticos e políticos pensam.

Quando um escândalo não vem sozinho

Apesar de ter descido os lucros, os proveitos do grupo financeiro em 2015 foram de 5,6 mil milhões de dólares (cerca de cinco mil milhões de euros), o que fez aumentar o bónus salarial de Lloyd Blankfein, o CEO do grupo, para quase 30 milhões de dólares (27 milhões de euros). E, mesmo assim, o valor é mais baixo porque o banco teve de pagar multas por causa de casos judiciais.

Quais? Tudo remonta a 2007 quando o banco foi acusado de enganar os próprios clientes no caso Abacus, vendendo activos imobiliários que desvalorizaram, provocando perdas avultadas de dinheiro aos clientes e lucros astronómicos ao banco. Nesse ano, apesar do caso, os lucros do Goldman Sachs foram de 13 mil milhões de euros (quase 12 mil milhões de euros).

 

A vítima judicial deste caso foi apenas um jovem banqueiro Fabrice Tourré – que se auto-apelidava de "Fab, o Fabuloso". O banco só em 2010 viria a ser acusado, por não ter informado com rigor os seus investidores acerca do novo produto que colocou no mercado, o Abacus, antes de a crise eclodir. Associado ao chamado crédito de alto risco, este novo produto acabou por determinar perdas de mil milhões de dólares para quem nele arriscou o seu dinheiro.

Abalou o prestígio do Goldman Sachs, sobretudo nos Estados Unidos, isto apesar de um das vítimas deste esquema ter sido um banco alemão, IKB, que teria perdas avultadas e depois foi nacionalizado.

Pouco tempo depois, o banco veria o seu nome ser envolvido num escândalo, mas por outros motivos. Em plena crise financeira, o seu principal concorrente, o Lehman Brothers, pediu ajuda ao Governo norte-americano. E o secretário de Estado do Tesouro recusou, dizendo que não queria onerar os contribuintes com o resgate de um banco de investimento.

 

O que à partida poderia parecer um acto de defesa dos norte-americanos, revelou-se para muitos como um acto de defesa do Goldman Sachs. Tudo porque Hank Paulson, o homem que negou o resgate ao Lehman Brothers, tinha chegado ao Governo de George W. Bush depois de ter sido presidente daquela instituição bancária. Mais do que isso: não salvou o Lehman Brothers, mas salvou a seguradora AIG, que se falisse teria provocado perdas ao Goldman Sachs que poderiam ultrapassar os dez mil milhões de euros, descreve Marc Roche no documentário sobre o banco.

Mais tarde, Hank acabou por ser ouvido no Congresso norte-americano sobre o caso, mas nunca chegou a admitir que a sua acção tinha ajudado o banco onde anteriormente tinha trabalhado. 

 

Contudo, o verdadeiro poderio do Goldman Sachs só foi reconhecido do lado de cá do Atlântico quando foi descoberto o seu papel na maquilhagem das contas da Grécia, desde o início deste século. Para responder às regras do euro, o Tesouro grego aceitou uma operação de dívida com o grupo financeiro, que viria a contribuir para que as contas do país parecessem melhores do que realmente estavam. E quando o acordo falhou, a Grécia caiu. 

Ora os ecos da ligação entre Goldman Sachs e a Grécia não se fizeram apenas sentir na finanças dos estados soberanos, com a crise a alastrar. Fizeram também sentir-se politicamente, mesmo que sem resultados práticos. Durante a audição no Parlamento Europeu antes da sua nomeação como presidente do BCE, Mario Draghi, acabou por ser confrontado sobre se sabia ou não do que tinha feito a gigante financeira. Aos eurodeputados, disse que essa relação era anterior à sua entrada no banco. "Não tive nada a ver com estes negócios, nem antes, nem depois", disse. E repetiu que nunca trabalhou com o sector público, mas com o privado e que essa foi uma das condições para ter entrado no Goldman Sachs.

 

Ao longo dos anos, vários têm sido os casos que atingem o grupo financeiro anglo-saxónico, mas o Goldman Sachs continua a ser, para muitos, o banco de investimento com mais poder no mundo.

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