E se a extrema-direita austríaca conseguir anular as presidenciais?

Jurisprudência sobre recursos eleitorais pode levar Tribunal Constitucional a decidir a favor da impugnação apresentada pelo FPÖ.

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Hofer e Van der Bellen, num debate televisivo antes da segunda volta GEORG HOCHMUTH/AFP

Será possível que o Tribunal Constitucional austríaco dê razão ao recurso do Partido da Liberdade (FPÖ), de extrema-direita, e anule a disputadíssima segunda volta das presidenciais, baseando-se na jurisprudência de umas eleições locais de 1927, embora emitida pelo juiz que é tido como pai da Constituição da Áustria?

Os alarmes acenderam-se na última audiência do tribunal, cuja decisão é esperada na próxima quarta-feira, 6 de Julho – dois dias antes da tomada de posse de Alexander Van der Bellen, o ex-dirigente do partido Os Verdes, eleito a 22 de Maio por 30.863 votos de diferença em relação a Norbert Hofer, o candidato nacionalista e anti-imigração do FPÖ. Para este resultado foram decisivos os votos por correspondência – e é sobre estes que se centra o recurso do partido de extrema-direita.

John Schnizer, um dos juízes, perguntou aos advogados do Presidente eleito se tinham presente a “antiga e dura lei” do Tribunal Constitucional: não é preciso detectar prova de que houve manipulações com resultados eleitorais, basta apenas a possibilidade de haver manipulação. Trata-se de jurisprudência estabelecida em 1927, pela decisão de Hans Kelsen, que julgou o caso de uma estação de voto reaberta depois de já terem sido contados os votos em urna. Kelsen é respeitado como o pai da Constituição Federal austríaca, sublinhou o juiz Schnizer.

O caso agora em apreciação é diferente: a FPÖ diz que houve irregularidades na contagem de 573.000 votos, e centra-se na votação por correspondência, que foi determinante para decidir quem ganhou. Diz que muitos foram contados por pessoas que não estavam habilitados a fazê-lo, e/ou foram abertos antes do prazo. São ainda levantados problemas com a divulgação dos resultados antes do tempo na Internet e na rádio.

Por isso, o que o partido de extrema-direita austríaco diz é que o seu adversário não é o Presidente eleito. “O nosso recurso não é contra Van der Bellen. Ele é uma vítima, tal como Norbert Hofer, da Comissão Eleitoral Federal”, diz a FPÖ, assumindo-se como garante do Estado de direito.

De forma preocupante, entre as dezenas de testemunhas ouvidas pelo Tribunal Constitucional muitas reconheceram ter havido irregularidades – envelopes do voto postal abertos antes do tempo, e por pessoas que não eram qualificadas para o fazer. Por exemplo, foram abertos 14 mil votos por correspondência na circunscrição de Innsbruck-Land logo no domingo, quando não deveriam ter sido abertos antes das 9h da manhã de segunda-feira, 23 de Maio.  A testemunha que o relatou disse ter recebido autorização para o fazer, de forma oral, da Comissão Eleitoral. Mas não ficou nenhum registo dessa permissão.

Tudo isto foi feito na pressa de anunciar os resultados, numas eleições de alta tensão, em que os dois candidatos se mantinham empatados. Outras testemunhas relataram ter recebido instruções para trazer mais pessoal para contar os votos.

“Se as eleições foram canceladas será uma desgraça”, disse ao semanário Österreich o ministro do Interior, Wolfgang Sobotka.

 

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