Associação defende mudança da lei que dá subsídios de alojamento a governantes

PSD acusa secretário de Estado do Ambiente de “gritante falta de bom senso” e mostra-se disponível para discutir, em sede parlamentar, uma alteração legislativa.

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Carlos Martins começou por sublinhar legalidade da situação Daniel Rocha

O caso do secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, que até agora beneficiou do subsídio de residência que usou para pagar o empreéstimo de uma casa onde não mora, é apontado pela Transparência e Integridade, Associação Cívica (TIAC) como mais um exemplo demonstrativo da necessidade de se mexer na lei que data de 1980 e que nunca foi alterada.

O presidente da TIAC, Luís de Sousa, considera que o regime de ajuda ao alojamento de governantes é controverso defende que a legislação (com mais de 30 anos) deve ser alterada, devendo, ao mesmo tempo, ser aprovado um código de conduta ética para os membros do Governo, chefes de gabinete e assessores, como acontece lá fora.

O líder da JSD, e deputado do PSD, Cristóvão Simão Ribeiro, que criticou a “falta de ética” do secretário de Estado, por estar a beneficiar de subsidio, para pagar uma casa que adquiriu no Algarve, quando dispõe de uma casa na área metropolitana de Lisboa (em Cascais), disse esta quarta-feira ao PÚBLICO que o grupo parlamentar do seu partido “está disponível para um debate que possa complementar a legislação e acautelar situações idênticas a esta”. “Estamos absolutamente disponíveis para essa discussão, em sede parlamentar, com vista a melhorar a transparência e a credibilização dos agentes políticos em geral, porque esse deve ser o objectivo máximo”, acrescentou o deputado e líder da JSD.

De acordo com a lei, os governantes têm direito a um subsídio, caso tenham residência permanente a uma distância superior a 150 quilómetros de Lisboa. Segundo avançou o Expresso este fim-de-semana, Carlos Martins foi um dos contemplados com o subsídio de residência, passando a beneficiar de 360 euros líquidos extra-ordenado, por ter declarado que morava em Tavira.

Sucede que, em declarações esta semana ao Diário de Notícias, admitiu morar habitualmente em Cascais e que o dinheiro do subsídio corresponde ao valor da prestação mensal do empréstimo que contraiu para a comprar a casa que tem em Santa Luzia (Tavira), no Algarve. E embora a sua determinação fosse continuar a beneficiar do subsídio, Carlos Martins optou, depois da divulgação do caso, por abdicar da ajuda do Estado.

A atitude de Carlos Martins travou a investida do PSD que pretendia dirigir uma pergunta regimental ao governante -  mas depois de este  ter renunciado ao subsídio, os sociais-democratas recuaram. O deputado Cristóvão Simão Ribeiro entende que já não faz sentido avançar com a pergunta regimental, mas aproveita para censurar aquilo que considera  “a gritante falta de bom senso do secretário de Estado do Ambiente”. “Não posso concordar que num país em que se pedem sacrifícios às pessoas um membro do Governo recorra ao subsídio de alojamento quando dispõe de uma casa em Cascais”, declara o deputado.

Os privilégios e os benefícios dos membros do Governo são uma matéria que a TIAC acompanha com particular atenção. A este propósito, Luís de Sousa revela que do relatório que a associação cívica elaborou em 2012 consta a recomendação, "que vai ao encontro do que está previsto na lei, da criação de um estatuto para os membros do Governo, incluindo chefes de gabinete e assessores”. "O que nós dissemos na altura - e mantemos a recomendação – é que deve existir um estatuto ético, um código de conduta para os membros do Governo”, frisou Luís de Sousa que pede regulação.

“Estas situações de benefícios e de privilégios devem ser reguladas para que não fiquem muito à mercê nalguns casos de uma decisão individual”, defende o presidente da TIAC. Adverte que, se não houver regulamentação, “este tipo de situações ficam à mercê dos superiores, do primeiro-ministro ou do ministro da tutela”, o que não é bom. Por isso, proclama: ”Tem de haver uma entidade que faça a gestão não só destes privilégios, destes benefícios, mas também das questões de conflitos de interesses”.

Sublinhando, embora, que “os governantes têm de ter condições para exercerem os seus cargos de uma forma condigna”, o líder da TIAC assinala que “os subsídios de deslocação, as ajudas de custos foram sempre entendidos como uma espécie de suplemento, quando, na realidade, não é assim. É preciso justificar a efectivação dessa ajuda, quando ela é necessária”.

Para evitar situações embaraçosas, Luís Sousa deixa um conselho aos governantes: “Só devem requerer subsídios ou outros privilégios se, de facto, reunirem as condições para usufruírem deles”.

O caso do secretário Estado do Ambiente traz à memória outras situações igualmente embaraçosas para quem as protagonizou. O anterior primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, revogou, em Dezembro, “com efeito retroactivo” a Setembro, o subsídio de alojamento do então ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, que decidiu renunciar ao apoio concedido a membros do Governo sem residência permanente em Lisboa. Desta forma, Passos Coelho encerrava uma polémica que começou em Outubro, altura em que foi noticiado que nove governantes tinham direito a subsídio de alojamento, incluindo alguns, como Miguel Macedo, que declararam ter casa em Lisboa, ainda que mantivessem oficialmente casas de outras cidades como residência permanente.

Face à polémica, Macedo renunciou ao subsídio, dizendo fazê-lo “por vontade pessoal”, aproveitando para lembrar que se limitara a gozar de um direito “há muito tempo previsto na lei”. Dias depois, dois outros membros do Governo de Passos, o ministro da Defesa, José Pedro Aguia-Branco, e o secretário de Estado das Comunidades, José Cesário, renunciaram ao subsídio previsto pelo Estado para alojamento.

 

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