Boris promete "dia da independência", adversários acusam-no de "não ter um plano"

Imigração e economia dominaram frente a frente na Wembley Arena, onde ninguém poupou a artilharia no último debate da campanha para o referendo à UE.

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A atmosfera podia ser a de um jogo futebol – à mesma hora, aliás, meio mundo tinha os olhos postos nos jogos do Euro 2016. Mas as seis mil pessoas que na noite de terça-feira encheram a Wembley Arena, em Londres, para o maior e último debate da campanha para o referendo à União Europeia torceram por lados opostos de um desafio que pode mudar realmente as suas vidas. Uma partida onde não faltaram ataques directos e tentativas de apanhar o adversário em falso, em que se repetiram slogans há muito testados – tudo numa última e, às vezes desesperada, tentativa de convencer os eleitores que, a pouco mais de 24 horas da abertura das urnas, continuam indecisos (11%, segundo o barómetro da revista Economist).

Se este fosse um jogo, os capitães das equipas seriam Boris Johnson e Sadiq Khan, o antigo e o actual mayor de Londres, um conservador, o outro trabalhista; o primeiro jogando no referendo à União Europeia o seu futuro político, o segundo apostando na popularidade de recém-eleito para atrair os mais jovens e o eleitorado trabalhista. Mas nas quase duas horas que durou o debate, todos os seis oradores usaram até à exaustão as baterias que foram laboriosamente preparadas por batalhões de assessores.

“Temos de recuperar o controlo”, repetiram Boris Johnson, a deputada trabalhista Gisela Stuart e a colega conservadora Andrea Leadsom, os porta-vozes da campanha pela saída de uma instituição que é “um sorvedouro de milhões de libras”, “uma máquina de destruir empregos”, “irreformável e anti-democrática” e que obriga Londres a aceitar “uma liberdade de circulação que está a criar enormes problemas no Reino Unido”.

Do outro lado do palco, os ataques de Sadiq Khan, da líder do Partido Conservador escocês Ruth Davidson e da secretária-geral do sindicato TUC Frances O’Grady foram ainda mais ferozes, na tentativa de desmontar “as mentiras” e denunciar a “inexistência de qualquer plano” de quem quer arrastar o país para fora de uma União “que garante os direitos aos trabalhadores”, “cria milhares de empregos” e “contribui para a segurança do país”.

A economia e a imigração sobrepuseram-se a todos os outros temas numa campanha que durou meses. E o debate organizado pela BBC na Wembley Arena não foi excepção.

“Qual é o teu plano Boris?”, perguntou, com a voz no limite, o actual mayor de Londres ao seu antecessor, depois de Jonhson ter acusado os rivais de terem vindo para o debate “com os velhos argumentos do Project Fear” [Projecto Medo, a fórmula usada pelos apoiantes do “Brexit” para descrever os avisos dos rivais sobre o risco de uma recessão]. “É razoável que o pai ou uma mãe que têm de pagar contas queiram saber qual é o plano [da campanha pela saída]. Um slogan não é um plano”, insistiu Khan.

O’Grady lembrou que a burocracia de que tanta gente fala quando fala da UE “são na verdade leis e directivas que protegem os direitos dos trabalhadores”, e a líder dos conservadores escoceses avisou que, fora da UE, o Reino Unido terá “não só de renegociar a forma como negoceia com os seus actuais parceiros, como também com os mais de 50 países com quem a UE tem em vigor acordos comerciais”.

O debate sobre a imigração é mais favorável aos partidários do “Brexit” e os seus porta-vozes não perderam a oportunidade de voltar a lembrar que o primeiro-ministro britânico nunca esteve perto de reduzir a imigração para os números há muito prometidos e de insistir que, enquanto estiver na UE, o Reino Unido não conseguirá controlar quem entra no país. “Eu sou o primeiro a dizer que devemos celebrar o que os imigrantes fizeram por este país”, mas “é crucial que sejamos capazes de o organizar”, afirmou Johnson, num novo sinal de que o homicídio da deputada trabalhista Jo Cox obrigou a campanha pela saída a moderar o seu discurso.

Conscientes de que a imigração é a principal preocupação dos eleitores, Khan e as aliadas reconheceram que é preciso encontrar formas para, dentro da UE, gerir melhor as entradas no país, mas insistiram que os europeus são essenciais em áreas como a saúde e a educação e insistiram que os cortes na despesa, mais do que a imigração, são responsáveis pela sobrelotação dos hospitais e das escolas. E, aproveitando o repúdio gerado por um cartaz do UKIP exibindo refugiados em marcha pela Europa, Khan deixou uma das tiradas da noite, ao acusar Johnson de pertencer a uma campanha que se lançou “não no Projecto Medo, mas no Projecto Ódio”.

Antes de o debate começar, John Curtice, especialista em sondagens e comportamento eleitoral, garantia que a tarefa dos dois campos “não era convencer os que já estão convencidos”, mas apresentar argumentos que pudessem apelar aos que ainda vacilam. A acesa troca de argumentos não pareceu, no entanto, deixar muito espaço para esclarecer as dúvidas que muitos britânicos afirmam ter. Mas nas intervenções finais houve um último piscar de olhos aos indecisos. “O Reino Unido que eu amo não vira as costas aos outros países”, disse Ruth Davidson, apelando aos eleitores para não votarem pela saída se “não estão 100% seguros”. Johnson assegurou que só a saída pode “oferecer esperança”, não só aos britânicos, mas também “aos milhares de pessoas por toda a Europa sem voz”. “Se votarmos pela saída, esta quinta-feira pode ser o nosso dia da independência”.

Terminado o debate, assessores das duas campanhas inundaram a sala de imprensa, cada um garantindo a vitória do seu campo. Nas suas casas, à mesma hora, os britânicos digeriam os soundbytes. Quinta-feira, ditarão o seu veredicto.

 

 

 

 

 

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