Uma comissão de inquérito à Caixa? Com certeza, impõe PSD

PS e PCP acusam PSD de querer fragilizar o banco público e contestam comissão. No debate quinzenal, Costa garantiu que não haverá despedimentos, mas admite fecho de balcões da CGD no estrangeiro. Prometeu redução de portagens ainda no Verão e uma estratégia para a agricultura biológica em Outubro.

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Rácio de crédito vencido a mais de 90 dias sofreu agravamento NELSON GARRIDO

Do debate quinzenal saiu mais uma comissão de inquérito parlamentar, desta feita à situação da Caixa Geral de Depósitos, e a garantia de que não haverá despedimentos no banco público – pelo menos do que o primeiro-ministro conhece do plano de reestruturação da CGD. A comissão será imposta pelo PSD que, pela voz do líder parlamentar, anunciou que os seus deputados vão “requerer a constituição imediata e obrigatória de uma comissão de inquérito”. A grande dúvida é se consegue estar em andamento antes do Verão.

O PSD conseguirá sempre constituí-la se a requerer potestativamente ou poderá bastar-lhe o apoio do Bloco sob as condições que Catarina Martins traçou logo no plenário: "Que seja para investigar tudo", impôs a porta-voz. "Mas, se for para serem vocês a escolherem sozinhos o objecto e os negócios a escrutinar, não contem com o Bloco." Entretanto, PS e PCP já torçeram o nariz. Numa nota à Lusa, Carlos César classificou a ideia como uma "irresponsabilidade" por sujeitar o banco à "devassa pública" numa comissão de inquérito e logo "em pleno processo de reestruturação e recapitalização", e criticou o PSD por "só saber destruir e desprestigiar tudo quanto encontra pela frente". O PCP seguiu a mesma linha crítica, com o deputado Miguel Tiago a acusar o PSD de querer "instrumentalizar" a CGD para a "fragilizar" e a levar à "privatização total ou parcial".

Já após o debate da tarde de ontem, Luís Montenegro especificou ao PÚBLICO que o âmbito da comissão será o “apuramento das circunstâncias de tutelas de vários governos e administrações que levaram a esta necessidade de recapitalização" e que a bancada decidiu optar pela via potestativa para que a comissão “avance já, antes do Verão". Mas há "abertura para analisar o objecto", assumiu. O texto será apresentado até ao final desta semana, mas Montenegro admite só o entregar depois de falar com os outros partidos. Existe, no entanto, um problema de agenda: ainda decorre a comissão ao Banif e os trabalhos do Parlamento terminam daqui a um mês e uma semana.

Montenegro fez o anúncio da comissão depois de ter questionado com insistência o primeiro-ministro sobre as necessidades de recapitalização da CGD e António Costa repetir aquilo que logo no início dissera ao líder comunista: que ainda não sabe, que essa análise está a ser feita e que “em breve” o valor será calculado e tornado público. “O seu conceito de esclarecimento ao parlamento e ao país é: quando o facto estiver consumado, eu explico”, ironizou o social-democrata.

“É ou não verdade que o crédito mal-parado foi decidido no tempo de um Governo a que pertenceu? Os negócios ruinosos e especulativos vêm desse tempo”, apontou Montenegro, acrescentando terem sido “negócios feitos por amigos do Governo PS de então”.

Costa afirmou-se “perplexo” com a pergunta de Montenegro. “Se algo de ilegal existia, espero que [Passos Coelho e Maria Luís] o tenham comunicado e que as autoridades judiciais e supervisoras não tenham andado distraídas”, rematou Costa sob palmas dos socialistas. E desvalorizou a comissão de inquérito: “Pode ser que façam na comissão de inquérito o que não fizeram nos quatro anos de Governo.”

Falando de "negócios ruinosos", o secretário-geral do PCP lembrou o "BPN, o BCP, o empreendimento de Vale do Lobo e outras iniciativas com concessão de crédito sem avaliação de risco", mas também a venda da Caixa Seguros. Jerónimo defendeu que "isto tem de ser apurado, mas não pode ser utilizado para pôr em causa a Caixa como banco público", deixando no ar que está contra a comissão de inquérito. " A recapitalização não pode servir para enfraquecer como banco público, nem para obedecer às imposições da Comissão Europeia ou do BCE", disse.

Já a porta-voz do BE tinha outra cartada na manga e desafiou Costa a "promover uma auditoria forense aos créditos [atribuídos] da CGD e a partilhar os resultados com a Assembleia da República e o Ministério Público". E o primeiro-ministro prometeu “ponderar a sugestão”.

O debate entre a líder do CDS e o primeiro-ministro não foi brando, com acusações de parte a parte. Assunção Cristas quis saber o porquê de o investimento cair e do atraso das candidaturas aos fundos comunitários e António Costa respondeu-lhe lendo "devagarinho" os números de candidaturas aos fundos europeus, que disse estarem a recuperar caminho face aos do anterior Governo. E foi aí que tocou no nervo da líder centrista, falando na "desgraça tão grande” que encontrou nos ministérios da Agricultura e da Economia onde o investimento “estava parado". A ex-ministra da Agricultura defendeu o seu legado, acusando Costa "de mostrar a sua ignorância" em relação ao assunto uma vez que "cada proposta entrada é uma proposta executada", porque fora o seu Governo que alterou as regras para que isso fosse possível.

Ainda no campo da CGD, questionado pela ecologista Heloísa Apolónia, Costa foi obrigado a admitir que “do que conhece” do plano de reestruturação do banco não haverá despedimentos mas sim diminuição de funcionários pelo recurso à reforma. No entanto, na rede internacional, “pode haver redução de balcões”.

Sobre o aumento dos vencimentos para a administração, criticados por Jerónimo e Catarina, Costa justificou-se com o facto de o banco actuar em ambiente concorrencial, o que lhe permite ser excepção à limitação de salários e disse que deu ordem à futura comissão de vencimentos para estabelecer os salários para a CGD pela média do praticado para o sector bancário.

Dominado pela CGD, o debate teve poucos mais temas, mas ficou o compromisso de Costa ao PCP de reduzir as portagens nas ex-SCUT ainda no Verão, de rever o traçado ferroviário entre Sines e Caia na zona de Évora (ao PEV) e de apresentar, até 31 de Outubro, uma estratégia nacional para a agricultura biológica (ao PAN).

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