China destronou Portugal como principal fornecedor de Angola

Dados agora divulgados pelo INE de Angola mostram que as empresas chinesas garantiram uma quota de mercado de 17% no ano passado, cabendo às empresas portuguesas uma fatia de 15%

Foto
Empréstimos chineses têm como contrapartida a compra de maquinaria e outros materiais ligados ao sector da construção Claro Cortes/Reuters

A China já tinha ganho balanço nos anos anteriores e acabou por conseguir ultrapassar Portugal em 2015, tornando-se no país que mais produtos vende a Angola. As relações comerciais entre aqueles dois países estão a estreitar-se há mais de uma década e a crise do petróleo veio ajudar a uma ligação mais forte.

Os números do quarto trimestre, agora divulgados, vêm confirmar que Portugal perdeu o estatuto histórico de principal fornecedor. Segundo o Instituto Nacional de Estatística angolano, as compras feitas à China representaram 17% de todas as importações feitas por Angola no ano passado. Foram cerca de 337 mil milhões de kwanzas, ou 1800 milhões de euros ao câmbio actual (o kwanza está a sofrer uma forte desvalorização). Portugal ficou-se pelos 294 mil milhões de kwanzas, que significaram 15% do valor total gasto por Angola. Em ambos os casos, é uma queda em relação a 2014, mas a descida de Portugal foi muito maior.

A capacidade de compra da economia angolana encolheu, numa altura em que o preço do petróleo – uma matéria-prima crucial para as contas do país – está em valores historicamente baixos e tem poucas perspectivas de recuperação a curto prazo. O país pediu este mês ajuda ao FMI, num empréstimo cujos moldes ainda não são conhecidos, mas que o Governo se esforçou por distanciar da imagem de resgate. A situação económica repercute-se no comércio externo: a descida nas importações foi abrupta no ano passado, com uma diminuição de 30%. No anterior, a queda rondara os 5%.

PÚBLICO -
Aumentar

No caso português, a quebra nas importações foi particularmente acentuada: uma descida de 34% em 2015 (um pouco mais de mil milhões de euros, com sectores importantes como a maquinaria e a indústria alimentar a serem particularmente afectados). A China teve um melhor desempenho, com uma contracção de 10%. Recuando mais um ano, torna-se claro o contraste entre as tendências nas compras feitas à China e a Portugal: em 2014, as exportações portuguesas tinham subido 1% face ao ano anterior, ao passo que as vendas chinesas tinham então disparado 26%.

As estatísticas angolanas e chinesas são menos detalhadas do que os números que os países europeus tipicamente disponibilizam. Mas a explicação para a ascensão chinesa estará, pelo menos em parte, relacionada com a concessão de crédito por parte de bancos chineses. Em contrapartida pelo dinheiro, Angola fica obrigada a usar matérias e maquinarias daquele país.

“O que poderá estar aqui em causa será o intensificar das relações e trocas entre os dois países, fruto das condicionantes impostas pela queda abrupta e sustentada do preço do petróleo”, explicam as economistas do BPI Paula Carvalho e Vânia Duarte. “A China tem vindo a assumir um papel dominante na concessão de financiamento a Angola. Esse financiamento terá como contrapartida a utilização de meios quase exclusivamente chineses para execução dos projectos financiados.”

O caminho de aproximação das duas economias tem sido longo e remonta à reconstrução pós-guerra. Números compilados pela agência Reuters indicam que a China emprestou cerca de 20 mil milhões de dólares a Angola desde 2002, ano em que terminou a guerra civil de quase três décadas e na mesma altura em que a China avançava com uma política expansionista.

As economistas do BPI afirmam que “tudo aponta” para que os dois países se mantenham próximos. Mas argumentam que uma recuperação do crude poderia ajudar a uma retoma nas vendas portuguesas: “Num cenário de alguma retoma dos preços do petróleo e menor dependência do exterior para obtenção de financiamento, é possível que as trocas comerciais com Portugal se intensifiquem de novo por uma questão de preferência e hábitos de consumo das marcas portuguesas”, observam. Paula Carvalho e Vânia Duarte frisam, porém, que “será tão mais difícil recuperar terreno quanto mais tempo prevalecer a actual situação”. com Luís Villalobos

Sugerir correcção
Comentar