Na hora de sair, Portas defende que Portugal não deve menosprezar Angola

Líder do CDS-PP, em lágrimas, despediu-se do partido numa transição que considerou “ordenada” para Assunção Cristas, um “par de mãos seguras”.

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Paulo Portas despediu-se em lágrimas de um partido que se confunde com o seu nome MARTIN HENRIK
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As últimas palavras de Paulo Portas enquanto líder do CDS-PP foram emocionadas mas também ousadas: apelou a que não se menospreze Angola na diplomacia portuguesa e questionou a continuidade do governador do Banco de Portugal. Em lágrimas e com o congresso a aplaudir de pé, Portas deixa o partido a Assunção Cristas, “um par de mãos seguras”.

O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros realçou a importância de Angola na diplomacia portuguesa e apelou aos “órgãos de soberania” para, “dentro do que a Constituição dispõe e a lei impõe, evitarem a tendência para a judicialização da relação entre Portugal e Angola — esse seria um caminho sem retorno — e procurarem em todas as frentes o compromisso", afirmou. Portas falava perante uma sala cheia — e em silêncio — do 26.º congresso do partido, dias depois da tomada de posse como Presidente da República de Marcelo Rebelo de Sousa, que convidou apenas o seu homólogo de Moçambique para a cerimónia. E será este o primeiro país da Comunidade de Países de Língua Portuguesa que o chefe de Estado português escolheu para a sua primeira visita oficial.

Paulo Portas justificou o seu apelo. “Com a autoridade que tem quem trabalhou muito para melhorar as relações com Angola, Portugal não está em condições de substituir Angola na política externa, pelo número de portugueses que lá vivem, pelas duas mil empresas que estão em Angola e que merecem a nossa protecção, pela interpenetração das suas economias. Apelo a todos aos órgãos de soberania para terem isto presente”, disse.

As falhas do governador
A mensagem — avisou — era “politicamente incorrecta”. Mas o discurso estava cheio de outros recados. Alguns deles para o governador do Banco de Portugal. “Eu acho que a resolução é melhor para os contribuintes do que a nacionalização. Mas é preciso acrescentar, com a naturalidade de quem está a expor o problema, que o Banco de Portugal não tem conseguido instalar competências e capacidades transaccionais que o habilitem a vender bancos, que é uma das suas tarefas recentes. E continua a ter falhas significativas na supervisão”, afirmou. Portas justificou ter aceite, enquanto vice-primeiro-ministro, a recondução do governador, Carlos Costa, por estar em curso da venda do Novo Banco. Como essa operação ainda não se concretizou, o ainda líder do CDS sugeriu a saída do responsável máximo pela supervisão: “Eu acho que é importante que cada um saiba perguntar-se a si próprio se é parte da solução ou parte do problema." O ex-vice-primeiro-ministro aproveitou para fazer um apelo sobre o sistema bancário português: “Seria indesejável que ficássemos com um sistema financeiro que se dividisse apenas entre Espanha de um lado e Caixa Geral de Depósitos de outro.” E lembrou como o CDS defendeu que a CGD se mantivesse pública.

Uma sucessão natural
No discurso de despedida de 16 anos de liderança do partido, Paulo Portas começou por elogiar o processo de sucessão. “Uma transição ordenada mas sem quebra de espontaneidade, uma sucessão natural”, disse, referindo-se ao ambiente que se respira como “uma espécie de pax centrista”. O partido deve discutir o que o CDS vai fazer daqui para a frente, defendeu, deixando um alerta para quem está incomodado com a renovação que a futura líder está a promover nos órgãos do partido: “Não percam demasiado tempo a discutir o lugar de cada um.”

O antigo vice-primeiro-ministro percorreu os últimos anos de governação, com o PSD, e referiu-se aos riscos que pode trazer a “gerigonça”. E a esse propósito lembrou o abanão que levou o voto útil. “Há centenas de milhar de portugueses que gostam mais das ideias do CDS, dos quadros, mas que nos últimos dias de uma campanha eleitoral deixam a sua primeira escolha e emigram para segunda escolha. Com medo que o PS ganhe ao PSD. Esse medo deixou de ter razão de ser. Como sabemos, o primeiro-ministro não ganhou as eleições. O que conta não é o partido que fica em primeiro luar, mas os partidos que conseguem formar maioria. Os deputados que o CDS consegue eleger fazem a diferença”, afirmou, admitindo que a “geringonça venha a ser vítima da sua própria medicina”.

Sem revelar o que vai fazer na sua vida profissional, Portas gracejou, pedindo para não lhe perguntarem onde estará daqui a “dez anos” (numa alusão à Presidência da República). “Qualquer especulação” sobre o seu futuro com mais de seis meses “é, no mínimo, um atrevimento”, disse, deixando uma palavra para a sua sucessora, Assunção Cristas, dizendo que há uma expressão inglesa que a define: “A safe pair of hands. É exactamente aquilo que muitos portugueses esperam de ti. Que sejas um par de mãos seguras a tratar de Portugal.”

Aos 53 anos, Portas diz partir “com o sentimento de dever cumprido”, depois desta etapa que assumiu como “vocação mas não como uma profissão”. Uma actividade “porventura viciante”, movida “a cigarros e cafés”, mas que não viu como “dependente”. Limpando as lágrimas, agradeceu a todos, incluindo à sua família”, e aos seus adversários por terem permitido o combate político.

No final do discurso, o ainda líder foi rodeado pelos dirigentes que estavam na mesa da direcção para o cumprimentar. Portas não disse um "até já", mas sim um "até amanhã", já que ainda irá exercer o direito de voto para a eleição dos órgãos do partido. Alguns centristas também não contiveram as lágrimas.

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