Uma tentativa de normalidade numa cidade em estado de alerta

Escolas fechadas, escritórios abertos. Cafés vazios, restaurantes a meio gás. O medo e a convicção de que a vida tem de continuar. Segunda-feira em Bruxelas foi assim.

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Soldados patrulharam as ruas comerciais do centro da cidade EMMANUEL DUNAND/AFP

Nunca visto. Os habitantes de Bruxelas, capital da Bélgica mas também da Europa, viveram uma segunda-feira inédita, confrontados com a ameaça do terrorismo, ao som intermitente das sirenes da polícia e debaixo da vigilância apertada de militares fortemente armados, mas bem decididos a não ceder ao medo.

Na Grand-Place, um blindado da Defesa Nacional estava estacionado em frente ao edifício gótico da câmara municipal. Soldados com uniformes camuflados, armas automáticas em punho, patrulharam as ruas comerciais do centro da cidade.

As autoridades, que colocaram toda a região da Grande Bruxelas em alerta máximo na sexta-feira à noite, recomendavam a todos os habitantes a maior das prudências. Numa decisão sem precedentes, as escolas não abriram neste início da semana e vão ficar fechadas “até nova ordem”.

No centro da cidade, um fotógrafo da AFP testemunhou alguma actividade, camionetas a descarregar mercadorias para as lojas, operários municipais a instalarem barraquinhas de madeira na proximidade da Bolsa e da Grand-Place para o tradicional mercado de Natal, que deverá abrir na próxima sexta-feira. Alguns cafés estavam abertos, mas os clientes eram raros.

Quando tocou para a saída, na pequena escola primária de Haren, não se ouviu um som, os portões estavam fechados, não havia crianças a correr e a gritar. Uma jovem mãe, Tatiana, estava ali para confirmar que o acesso ao edifício era impossível, depois seguiu para a creche vizinha, onde um aviso lacónico na porta informava que, “na sequência da decisão do Governo, a creche está fechada esta segunda-feira”.

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“Eu sei o que se está a passar, é muito triste”, explica Tatiana. O seu filho de oito anos, Oleg, saiu sozinho de manhã para ir para a escola e voltou rapidamente para casa, depois de dar com as portas fechadas. “Ficou em casa com a irmã mais nova, Alissa, que também não pôde ir para a creche. Espero que seja só hoje, que amanhã esteja tudo mais calmo.”

No parque do Cinquantenaire, um dos grandes espaços verdes da capital belga, próximo da sede das instituições europeias, algumas famílias passeavam com os seus filhos, sob um frio sol de Inverno, enquanto alguns turistas japoneses tiravam fotografias.

O trânsito era bem menos intenso do que é normal à hora de ponta no início de uma semana de trabalho, mas ainda assim aconteceram engarrafamentos “normais para uma cidade como Bruxelas”, explicou o serviço de trânsito da RTBF.

Nas paragens de autocarro, com as carreiras reforçadas para compensar a ausência de metropolitano, as pessoas esperavam pacientemente nas filas. Os eléctricos e os comboios estavam a circular normalmente.

“É claro que estamos a tomar as medidas necessárias para garantir o mais possível a segurança das pessoas, mas a vida tem de continuar em Bruxelas.  O sector público, por exemplo, está a funcionar. Os trabalhadores foram trabalhar esta manhã”, explicou na rádio o ministro do Interior, Jan Jambon. Mas a maioria das infra-estruturas culturais e desportivas permaneceu encerrada.

Christophe, o gerente de um restaurante de comida rápida, preparava-se para abrir, como é hábito, às 11h00. “Espero fazer um pouco mais de dinheiro para compensar os outros dois dias em que estive fechado. Os escritórios estão a funcionar, as pessoas vão precisar de almoçar.” Mas ainda assim Christophe tencionava fechar mais cedo do que é habitual, “ao cair da noite”.

Michel e Patricia, um casal de reformados dos subúrbios flamengos de Bruxelas, deu de caras com as portas fechadas de uma grande loja de artigos desportivos onde pensavam comprar um casaco novo para o Inverno. “Eu percebo a segurança, mas a vida tem de continuar, senão é a ruína do país”, dizia Patricia. O marido resmungava qualquer coisa que o filho lhe tinha dito essa manhã: “Será que não podemos pegar na nossa casa e instalá-la junto ao Yser [rio na fronteira franco-belga] como em 14-18? Lá ninguém nos podia fazer mal.”

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