O factor humano

Um vilão supérfluo e uma duração excessiva mancham o digno sucessor de um dos melhores Bonds nos 50 anos da série.

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Se pensarmos bem, o primeiro desafio que se coloca a qualquer realizador incumbido de fazer um 007 é que consiga fazer existir um filme, com cabeça, tronco e membros, pelo meio de uma máquina de marketing que já não quer saber do conteúdo. Tire-se, por isso, o chapéu a Sam Mendes, que o consegue pela segunda vez depois do excelente 007 Skyfall (2012): Spectre prolonga o questionamento existencial do espião “à moda antiga” numa “nova ordem mundial” que o parece tornar redundante, ao mesmo tempo que reforça a necessidade do “factor humano” para contrabalançar a utopia totalitarista tecnológica.

Mas nesse movimento que transforma Bond de super-agente invencível em herói humano e falível, o peso que o “vilão” memorável tinha nos velhos tempos da série tem-se diluido até, no novo filme, praticamente ceder sob si mesmo, ao mesmo tempo que a necessidade de “encher o olho” faz Spectre inchar pelo menos meia hora para lá do que seria necessário. Mesmo que a ideia de opor Bond ao seu “gémeo negro” seja muito boa, na prática o vilão de Christoph Waltz não traz nada ao filme (e a culpa não é do actor, que na verdade só tem tempo de reciclar o seu número do costume); a verdadeira batalha dá-se nos bastidores, entre o M “moral” e recto de Ralph Fiennes e o C “político” e venal de Andrew Scott. Menos Blofeld e mais concisão tornariam Spectre num dos melhores blockbusters com cabeça dos últimos anos. 

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