A “central de vendas” do Bloco e a farinha do PCP

Passos Coelho aproveitou as perguntas de Catarina Martins e Jerónimo de Sousa para os questionar sobre o acordo à esquerda: "Afinal, quem saltou o muro?"

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Miguel Manso

Foi com alguma dose de ironia que Catarina Martins, coordenadora do BE, e o primeiro-ministro Passos Coelho e se defrontaram pela primeira vez na nova legislatura. Mas as críticas, de parte a parte, não foram suaves.

A dirigente bloquista começou por reafirmar o que já estava anunciado -  o chumbo do programa de Governo – e a argumentar a favor da solução governativa que tem a maioria de deputados no Parlamento. "Se PSD e CDS não têm deputadas e deputados suficientes para fazer passar o programa é porque os eleitores lhes retiraram essa confiança”, afirmou, respondendo ao discurso inicial de Passos: "Não são jogadas políticas, é a democracia a funcionar, foi a democracia que rejeitou o programa".

Nas críticas ao programa, Catarina Martins foi mais séria e mais dura ao considerar que o texto é um “programa de vendas” e o governo Passos/Portas uma “central de negócios” ao privilegiar os privados.

A bloquista manteve o tom duro que usava na última legislatura e Passos Coelho repetiu o modo mais ou menos suave como costumava responder. “À medida que a fui ouvindo foi crescendo em mim a curiosidade dos termos do acordo alcançado com o PS. Os portugueses ainda não perceberam quem catequizou quem?”, questionou, esboçando um sorriso. Passos usou a imagem do derrube dos muros entre as forças de esquerda para desafiar: “Afinal, quem saltou o muro? Deixou de existir? Passou a imaginário? Quais as posições relativas que cada um ocupa?".

 Já sobre a apreciação em torno do programa de Governo, o primeiro-ministro disse discordar, justificando a austeridade com a pré-bancarrota. “Não vejo onde esteja o negócio”, afirmou.

Numa espécie de réplica do que sempre disse nos debates quinzenais nos últimos quatro anos, o líder do PCP acusou Passos de aplicar a austeridade por “opção política”, contrariando a sua tese, no discurso inicial, do caos da bancarrota.

Jerónimo falou do desemprego, da pobreza, dos privilégios para os grandes e nos impostos e redução de rendimentos para os pobres, lembrou os milhões de euros entregues à banca sem garantias de os receber de volta; e classificou o programa de Governo como uma “continuidade” das políticas seguidas nos últimos quatro anos – “mais do mesmo, colorido com algumas proclamações”. “A realidade do país confirma as muitas razões para que o Governo do PSD não entre em funções”, vaticinou.

Na resposta, Pedro Passos Coelho vincou não ser opção do Governo – e disse-o três vezes - “andar a nacionalizar a banca e socializar as perdas privadas”. Acusou o PCP de “não se importar de impor um custo maior ao país” para controlar os bancos. Mas Passos não quer “mandar nos bancos”, preferindo acautelar a sua “estabilidade, evitando a sua nacionalização”.

Partiu depois para a provocação: disse “aguardar com toda a curiosidade” para ver como PCP e PS se vão entender na questão do euro, lembrando que os eurodeputados comunistas defenderam o apoio de Bruxelas aos países que de forma voluntária ou forçada saiam do euro.

E ainda lembrou que, nos últimos anos, o PCP alegou com insistência que PS e PSD são “farinha do mesmo saco”. Passos espera agora pelo acordo entre socialistas e comunistas para ver se as políticas económicas que o PCP defende e foram criticadas pelo PS serão aproveitadas para o futuro Governo de esquerda.

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