Dois milhões de portugueses estão em risco de desenvolver diabetes

Relatório do Observatório Nacional da Diabetes alerta que todos os dias surgem 150 casos da doença em Portugal. Apesar disso há números positivos, como as amputações que estão a baixar.

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Há cada vez mais obesos entre os diabéticos MANUEL ROBERTO

Em Portugal, mais de 13% das pessoas com idades entre os 20 e os 29 anos têm diabetes, o que significa que mais de um milhão de pessoas têm esta doença que rouba pelo menos nove anos de vida a quem tem menos de 70 anos. A juntar-se a este dado, há outros preocupantes: além das pessoas com diabetes, há dois milhões de pessoas em risco de pré-diabetes – pelo que é muito provável que venham a desenvolver esta doença. Os dados, antecipados ao PÚBLICO, fazem parte do relatório Diabetes: Factos e Números, que será apresentado nesta terça-feira, em Lisboa.

O documento, da responsabilidade do Observatório Nacional da Diabetes, deixa vários alertas. Existem cada vez mais portugueses com diabetes. Há praticamente 150 novos casos por dia. Apesar deste número elevado, estima-se que cerca de 40% das pessoas não saibam que têm a doença, pelo que não estando devidamente acompanhadas e medicadas desenvolvem complicações com as quais é mais difícil de lidar numa fase avançada. “As pessoas com diabetes perdem mais anos de vida. Em 2013, apontava-se para uma perda de oito anos de vida por cada óbito na população com idade inferior a 70 anos. Em 2014, o número de anos perdidos sobe para nove”, diz o relatório.

O director do Programa Nacional para a Diabetes, em declarações ao PÚBLICO, mostrou-se preocupado com os dados nacionais e sublinhou que o combate à doença precisa de ser cada vez mais feito pelo lado da prevenção. “Temos de ir para além dos serviços de saúde. Quase 70% a 80% dos casos podem ser prevenidos”, alertou José Manuel Boavida, que adiantou que em 2016 vai arrancar nos centros de saúde um programa focado na educação das populações. A ideia é formar “não no sentido proibitivo, mas fomentando o exercício e a alimentação saudável”, explicou.

No campo das preocupações, o médico alerta que no ano passado também se verificou “uma preocupante redução” do número de pessoas com diabetes sujeitas a rastreio da retinopatia. O número de rastreios a esta frequente complicação caiu 17% entre 2013 e 2014, para um total de apenas 95.535 pessoas analisadas, “o que significa que estes rastreios atingiram apenas cerca de 13% das pessoas com diabetes registadas nos cuidados primários do Serviço Nacional de Saúde”, diz o relatório.

Apesar disso, há alguns pontos positivos identificados pelo relatório. De destacar, por exemplo, que as amputações de membros inferiores registaram o valor mais baixo da década. Em 2014 foram registadas 1385 amputações, 560 das quais de grandes membros. No ano anterior o total tinha sido de 1556, sendo destas 689 amputações “major”. Uma melhoria que o director do programa da diabetes atribuiu ao empenho dos cuidados de saúde primários. Também o número de internamentos em que a causa principal foi a diabetes continuou a cair, com uma descida de mais de 23% desde 2009. Pelo contrário, o número de doentes internados por outros motivos e que tinham diabetes como complicação aumentou. Os óbitos associados à diabetes caíram de 4546, em 2013, para 4211 no ano passado – mas a doença ainda se mantém no “top 5” das principais causas de morte.

O grande número de doentes já com diabetes avançada e os novos casos fazem com que a patologia tenha um forte impacto nas contas do país. Cerca de 1% do produto interno bruto diz respeito a despesa nesta área, que representa já 10% de toda a despesa em saúde. A contribuir para este factor estão os medicamentos, que com a chegada de inovadores viram o seu valor duplicar nos últimos dez anos.

O Observatório Nacional da Diabetes foca alguns grupos populacionais que inspiram preocupação. Cerca de 90% dos diabéticos têm excesso de peso ou mesmo obesidade. No ano passado ainda foram detectados mais de 17 novos casos de diabetes tipo 1 em cada 100 mil jovens entre os zero e os 14 anos. O grupo das grávidas também tem indicadores mais negativos. Em 6,7% dos partos feitos no Serviço Nacional de Saúde as mães tinham diabetes gestacional, quando em 2013 o valor tinha ficado em 5,8% – o que pode ter consequências tanto para o bebé como para a mulher e aumenta a probabilidade de desenvolver diabetes no futuro.

Para José Manuel Boavida, o retrato negro desta doença em Portugal – país da Europa com maior taxa de prevalência de diabetes – justifica outro tipo de intervenções. Por exemplo, defende que as bebidas com alto teor de açúcar deveriam ter um alerta sobre o conteúdo. “É uma poluição do organismo”, ilustra o especialista, apelando a medidas semelhantes ao que acontece para o tabaco.

A própria Assembleia da República aprovou, durante a última legislatura, algumas recomendações neste sentido. Uma das ideias passava por aprovar “legislação que desincentive o consumo de refeições, lanches, alimentos e bebidas pobres em nutrientes e com elevado teor de açúcar, de gorduras saturadas ou de sódio, e sejam principalmente destinados a menores”. A recomendação tinha também o objectivo de proibir a comercialização destes produtos com oferta de brindes e a publicidade aos mesmos entre as 7h00 e as 22h00.

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