Indústria reduz pessoal e não consegue compensar as perdas provocadas pela taxa ambiental

Redução de vendas chega aos 20% em algumas empresas. Outras perderam o seu maior negócio e rescindiram contratos de trabalho. No Pingo Doce, a venda de sacos caiu para metade.

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Fábricas que produziam sacos de plástico leves perderam fatia importante do negócio Miguel Manso

Contratos que não se renovaram, máquinas paradas, novos negócios. A indústria de plásticos teve de se ajustar em tempo recorde à nova taxa ambiental sobre os sacos de plástico leve e, de acordo com Isabel Ferreira da Costa, directora da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos (APIP), “não há dúvida de que está a sofrer com isso”. Nem o aumento do consumo de sacos do lixo, que a APIP também constata, está a ajudar a compensar as perdas porque “a maioria é encomendada pelos hipermercados a países asiáticos”

Pelas contas da APIP, seriam produzidos por ano 20 mil toneladas de sacos de plástico de alças e uma espessura igual ou inferior a 0,05 milímetros. Com a entrada em vigor da taxa de dez cêntimos, paga pelo consumidor desde Fevereiro, ainda não há dados sobre o número de sacos deste género que são, agora, produzidos. Contudo, é certo que a “redução é substancial”. Quanto às novas alternativas, de maior qualidade e espessura e que estão a ser vendidas pelas cadeias de distribuição por cerca de dez cêntimos, “esperavam-se grandes encomendas mas não é isso que está a acontecer”, conta Isabel Ferreira da Costa.

Os impactos desta medida da fiscalidade verde traduziram-se em redução de vendas (em alguns casos de 20 a 30% segundo a APIP), reestruturação do negócio e contratos de trabalho que não foram renovados. Na Sacos 88, os sacos de plástico leves valiam 40% do negócio e, como diz Amardo Reis, director-geral, foi preciso encontrar alternativas em tempo recorde, “andar para a frente e ter sangue frio”. “Mais do que a lei, o mais triste nesta história foi não darem tempo às empresas nem sequer para respirar. Se quisermos mandar vir uma máquina para produzir um produto novo demora seis a oito meses e a lei foi aprovada em final de Dezembro para entrar em vigor em Fevereiro”, lamenta.

Armando Reis admite que não renovou alguns contratos e teve de mudar trabalhadores noutras áreas “para não despedir”, adaptar as máquinas que tinha e “gastar muitos milhares de euros”. Mas acredita que, com o passar do tempo, o mercado vai perceber que gastar dez cêntimos num saco de melhor qualidade até compensa. “Todos precisamos de um saco para colocar o lixo. Quando as pessoas perceberem que este novo saco de asas com mais espessura pode ser usado em várias compras e pode, no final, ser utilizado como saco de lixo, já não vão achar que estão a deitar dinheiro à rua”, argumenta. Atingir o mesmo número de vendas que tinha é um cenário improvável, mas Armando Reis está “cansado de falar sobre o assunto”. Já só quer “olhar para a frente”.

Na Plasgal o cenário é o mesmo. Paulo Almeida, director-geral, revela que não foram renovados 20 contratos de trabalho e, se antes as encomendas da grande distribuição pesavam 65% do negócio, agora pesam menos de 15%. “Éramos um dos principais players nessa operação [dos sacos de plástico leves] mas tivemos de realocar equipamentos e recursos para outros produtos, mais técnicos, como sacos de transporte para valores”, exemplifica.

A Plasgal está longe de compensar as perdas provocadas pela taxa ambiental e só no início do próximo ano terá capacidade de produção para fabricar mais produtos alternativos. Paulo Almeida também confirma “plenamente” que não é à indústria nacional que estão a chegar as encomendas de sacos do lixo. Até porque o produto é completamente diferente. “Estou alinhado para fabricar para a área alimentar e ter a indústria contaminada com um plástico desse género é muito complicado”, sustenta. Cada máquina tem uma função e “não há varinhas mágicas para produzir vários produtos numa só”, continua, acrescentando que, neste momento, tem 60 a 70% dos equipamentos parados.

Há ainda outras consequências da nova lei. “As seguradoras de crédito, perante esta legislação, aumentam o risco e diminuem o valor a segurar ao cliente. Levamos com mais um aperto. Os prazos de pagamento são, de repente, esmagados.” Isto num contexto em que é preciso investir para mudar o negócio.

Nas grandes cadeias de hiper e supermercados, os sacos de plásticos leves deixaram de estar à disposição de um dia para o outro. Ana Isabel Trigo de Morais, directora-geral da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED) diz que os portugueses se adaptaram rapidamente à mudança, passando a reutilizar e a usar outras opções em ráfia ou pano, por exemplo. Não há dados sobre o número de sacos actualmente vendidos, mas no caso do Pingo Doce, uma das maiores cadeias do sector, venderam-se “sensivelmente metade”, face ao ano anterior, diz fonte oficial da empresa, do grupo Jerónimo Martins.

“O que temos verificado nas nossas lojas, e os números confirmam, é que a maioria dos clientes tem optado mais pela reutilização, trazendo de casa os sacos de que necessita para o transporte das suas compras”, adianta. O Pingo Doce, que já cobrava dois cêntimos pelos sacos desde 2007, diz que há um segmento de clientes “mais conservadores que continua a procurar os de plástico (de gramagem superior e, por isso, mais resistentes)”. Mas a maioria dos consumidores prefere a versão em papel. “São os que registam maior adesão”, diz a mesma fonte. Ao mesmo tempo, as vendas de sacos de ráfia aumentaram a dois dígitos desde que a lei entrou em vigor.

Contactado, o Continente (do grupo Sonae, o mesmo do PÚBLICO) diz sem adiantar números que a nova taxa “contribuiu para sensibilizar os consumidores portugueses para reutilizarem os sacos de plástico, o que se reflecte nas vendas dos sacos”.

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