Há 100 instituições e 144 autarquias disponíveis para receber refugiados em Portugal

Para já, prevê-se que apenas instituições acolherão refugiados, mas há cada vez mais famílias portuguesas a oferecerem apoio que o Conselho Português para os Refugiados admite vir a ser gerido pelas autarquias. Dois pais partem esta sexta-feira para a Croácia e Hungria para trazerem refugiados.

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Portugal deverá receber cerca de 70 milhões de euros, até 2020, em fundos comunitários para integrar refugiados YANNIS BEHRAKIS/REUTERS
Refugiados sírios na Jordânia: dezenas de milhares já passaram a fronteira
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Refugiados sírios na Jordânia: dezenas de milhares já passaram a fronteira Khalil Mazraawi/AFP

Pelo menos 100 instituições em Portugal já se disponibilizaram para acolher refugiados no âmbito do programa europeu delineado para fazer face à crise resultante da guerra na Síria. Entre elas estão escolas, paróquias, empresas e instituições particulares de solidariedade social em todo o país. Segundo a Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), que está articulada com o Governo e com o Conselho Português para os Refugiados (CPR), 50 já foram seleccionadas para acolher refugiados, enquanto outras 50 estão a terminar a fase de avaliação. Os números foram confirmados ao PÚBLICO por Rui Marques, presidente do Instituto Padre António Vieira, e um dos dinamizadores que tem liderado a PAR. Também a presidente do CPR, Teresa Tito de Morais, adiantou que 144 autarquias se mostraram disponíveis para acolher migrantes.

Do total de 160 mil refugiados, a recolocar por toda a Europa, Portugal receberá entre 4500 e 5000, provenientes de Itália e Grécia. Deverão chegar no final de Novembro, segundo o CPR. O acolhimento desse número de refugiados, conforme as quotas acordadas recentemente entre os países europeus, está a ser preparado a nível interministerial em conjunto com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Será feito pelos canais oficiais e através da PAR e do CPR. Neste âmbito, só instituições se poderão candidatar ao programa de acolhimento, apesar de serem cada vez mais as pessoas e famílias que nas redes sociais ou em contacto com estas entidades se oferecem para acolher refugiados nas suas casas.

O plano do Governo não prevê, pelo menos para já, o acolhimento individual por famílias, mas já há sinais de que tal poderá alterar-se. O Ministério da Administração Interna e o SEF remeteram respostas para o gabinete do Ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional que, porém, não enviou esclarecimentos em tempo útil.

Teresa Tito Morais diz que têm chegado inúmeras ofertas ao CPR. De particulares, câmaras municipais, paróquias, misericórdias ou instituições particulares de solidariedade social. “Temos recebido muitas propostas que têm que ser coordenadas e estruturadas para serem operacionalizadas no terreno”, afirma.

Relativamente às ofertas dos particulares, Teresa Tito Morais defende que as câmaras são as entidades mais bem preparadas para fazer a triagem e a avaliação das ofertas. “As câmaras que têm equipas multidisciplinares é que podem coordenar estes apoios, nomeadamente fazer uma avaliação para perceber se as famílias candidatas possuem de facto condições para receber os refugiados”, sustenta.

O Grupo de Trabalho dos Refugiados, criado recentemente a nível interministerial, reúne-se na manhã desta sexta-feira no SEF, em Lisboa, pela primeira vez com a PAR, o CPR e a Associação Nacional de Municípios Portugueses. O encontro deverá ser decisivo quanto à eventual assinatura de memorandos com estas entidades. Uma questão importante para organizar e definir as fases de trabalho que se aproximam.

As instituições que recebam refugiados terão de cumprir uma série de requisitos obrigatórios, entre eles o fornecimento de alojamento autónomo, alimentação e vestuário, apoio à integração laboral, apoio no acesso à educação das crianças, apoio no acesso à saúde e apoio à aprendizagem do português.

Como podem fazer as pessoas e famílias que desejem contribuir para o acolhimento? “As pessoas que queiram podem contribuir com a doação de verbas através do PAR — Linha da frente. É um projecto que prevê a recolha de fundos até ao final deste ano. As verbas serão de imediato enviadas para a Cáritas Médio Oriente e para o Serviço de Jesuítas no Médio Oriente Oriente e Norte de África, particularmente Síria, Líbano e Jordânia, no apoio a refugiados e deslocados internos”, explicou Rui Marques. Existem ainda iniciativas de recolha de fundos como a que ocorreu na noite desta quinta-feira no Teatro da Trindade, onde o Chapitô apresentou a peça Édipo. As receitas reverteram para a campanha.

O site da Plataforma deixa ainda sugestões a quem queira ajudar a título individual. Quem quiser poderá escolher a via do voluntariado e apoiar as instituições de acolhimento, apoiar na divulgação da campanha da PAR ou contactar a plataforma se estiver interessado em fazer uma “oferta específica de bens ou serviços”.

Há, porém, quem não se contente com estas opções institucionais e não fique sentado a aguardar que o Governo resolva o problema, concordando, aliás, com o mote da PAR no seu site dado pelos versos de Sophia de Mello Breyner Andresen: “Vemos, ouvimos e lemos. Não podemos ignorar”. Por isso, dois pais de família, ambos com formação em Direito, partem de Lisboa na noite desta sexta-feira a caminho das fronteiras da Croácia ou da Hungria. Cada um, trará uma família de cinco pessoas. Nuno Félix e Pedro Policarpo conseguiram contactar com organizaçções não-governamentais que estão nessas regiões e estão em contacto com refugiados e vão preparar o seu resgate.

Resgate de refugiados
“No Facebook já tivemos inúmeras mensagens de apoio e até pessoas que se ofereceram para vir. Talvez partam no total seis carros dos jardins em frente ao Palácio de Belém pelas 19h. Sabemos que podemos ser depois retidos nas fronteiras, sabemos que viajar com pessoas sem documentos poderá ser um crime, mas vamos tentar e esperamos contar com a boa vontade das autoridades se formos mandados parar. São os Estados que estão a falhar com a Convenção de Genebra e eu não quero ter vergonha de ser europeu, nem de ser português”, afirmou ao PÚBLICO Nuno Félix. O que o motivou? Os quatro filhos viram as imagens de sofrimento passar vezes sem conta na televisão e perguntaram por que ninguém os ajudava. Nuno resolveu dizer-lhes que ele, como pai, os iria ajudar. E irá conduzir mais de seis mil quilómetros, de ida e volta, gastando mais de mil euros em combustível e em portagens. “Sou pai, vou dar o exemplo. Não basta ensinar. Os Estados estão a demorar muito tempo. Quero provar que se uma pessoa quiser pode ajudar”, acrescenta. Em casa tem um quarto para acolher os migrantes. Quando chegar, informará o SEF e espera que a Segurança Social não vá lá a casa “criar problemas”.

Esta terça-feira, em conferência de imprensa depois da cimeira extraordinária, em Bruxelas, o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, recordou que a chegada de refugiados a Portugal acontecerá apenas depois da sua identificação e registo noutros países. “Portugal não poderá, como é evidente, receber refugiados antes de eles estarem devidamente identificados e registados. Isso faz-se, não em Portugal, mas nesses centros” de acolhimento desses países, explicou o chefe de Governo.

Portugal deverá receber cerca de 70 milhões de euros, até 2020, em fundos comunitários para integrar refugiados e migrantes, de acordo com uma proposta da Comissão Europeia. Teresa Tito Morais explica que será “o SEF a administrar o apoio financeiro a estas famílias”. A presidente do CPR reconhece que ainda falta um regulamento que defina as prioridades e as condições em que serão dados esses apoios. “Serão feitos protocolos com as instituições de acolhimento para cobrir algumas das necessidades”, refere.

Esse dinheiro deverá servir também para financiar as instituições que acolherem os refugiados, mas a PAR sublinha que o modelo de financiamento ainda não está definido. “De certeza que parte desse dinheiro será para isso, mas o modelo quanto a isso ainda não foi definido”, esclareceu Rui Marques.

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