Croácia tenta forçar Hungria a receber refugiados

Primeiro-ministro croata diz que vai continuar a enviar autocarros para a Hungria, sem qualquer acordo com o governo de Viktor Orbán. Hungria ameaça vetar acesso da Croácia ao espaço Schengen.

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Nos últimos dias chegaram mais de 20.000 refugiados à Croácia Stoyan Nenov/Reuters
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As profundas divisões na União Europeia sobre a melhor forma de lidar com a chegada de centenas de milhares de pessoas, a maioria em fuga de guerras e perseguições em países como a Síria, o Iraque ou o Afeganistão, estão a deixar a Croácia e a Hungria à beira de um incidente diplomático.

Depois de o governo húngaro ter erguido um muro e várias cercas de arame farpado ao longo da sua fronteira com a Sérvia, e de ter decidido criminalizar a entrada de pessoas sem documentos, milhares de refugiados e migrantes que deixaram de poder atravessar o país para chegarem ao Norte da Europa viraram-se para a Croácia.

Na terça-feira, o primeiro-ministro croata, Zoran Milanovic, disse que o seu país iria receber refugiados e migrantes "independentemente da sua religião e cor de pele", lançando duras críticas à Hungria: "Arame farpado no século XXI não é uma resposta, é uma ameaça."

Mas o discurso do governo de centro-esquerda da Croácia foi mudando à medida que a sua capacidade para lidar com a situação foi diminuindo – desde que aquelas palavras foram pronunciadas pelo primeiro-ministro, na terça-feira, entraram no país mais de 20.000 pessoas, a maioria em busca de uma passagem para outros países-membros da União Europeia, como a Alemanha, que em Agosto prometeu recebê-las.

Apesar de a resposta da polícia croata não ter sido violenta – ao contrário do que aconteceu na quarta-feira, quando centenas de refugiados e migrantes tentaram entrar na Hungria a partir da Sérvia –, as autoridades do país dizem que já não conseguem lidar com a chegada de mais pessoas, e começaram a encaminhar algumas delas para a Hungria, na sexta-feira, uma decisão que enfureceu o governo húngaro liderado por Viktor Orbán.

Numa passagem pela cidade de Beli Manastir, perto da fronteira com a Hungria, o primeiro-ministro croata disse que vai continuar a "forçar" o governo húngaro a receber alguns dos refugiados e migrantes, sem os registar previamente: "Não houve nenhum acordo. Forçámo-los a aceitá-los, e vamos continuar a fazê-lo", disse Milanovic.

Em resposta, o ministro dos Negócios Estrangeiros húngaro, Peter Szijjarto, acusou o governo croata de "violar a soberania da Hungria" e de "mentir de forma reiterada aos húngaros, croatas e a todos os cidadãos da União Europeia". "Que tipo de solidariedade europeia é esta?", questionou o ministro da Hungria.

O governo húngaro ameaçou também vetar a entrada da Croácia no grupo dos países que formam o espaço de livre circulação na Europa.

"Se a Croácia levantar as mãos e disser que não quer defender as fronteiras, a Hungria só pode concluir que não está preparada para se juntar ao espaço Schengen quando chegar o momento da decisão", disse Antal Rogan, chefe de gabinete do primeiro-ministro húngaro, em declarações à rádio pró-governamental InfoRadio, citado pela agência Reuters.

"Uma das condições para entrar no espaço Schengen é que o país esteja decidido a defender as fronteiras externas da Europa. Se falhar este objectivo de forma tão explícita, então é porque não está pronto para ser membro de Schengen", declarou o responsável húngaro.

O espaço Schengen é constituído por 26 países europeus, mas há seis membros da União Europeia que não integram este grupo – o Reino Unido e a Irlanda por decisão própria; a Croácia, a Bulgária, a Roménia e Chipre por ainda não terem garantido que cumprem as exigências necessárias. A decisão sobre a eventual entrada destes quatro países deverá ser tomada ao longo do próximo ano.

Na próxima quarta-feira, os chefes de Estado e de governo da União Europeia vão reunir-se em Bruxelas para tentarem chegar a acordo, mas há poucas esperanças de que isso venha a acontecer – a Comissão Europeia quer que todos os países recebam um total de 160.000 refugiados, cada um na medida das suas possibilidades, mas essa proposta já está em cima da mesa há pelo menos duas semanas, e países como a Hungria, a Eslováquia ou a República Checa nunca deram sinais de que venham a aceitá-la sem condições.

Enquanto isso, centenas de milhares de pessoas estão encurraladas entre a Hungria, a Croácia e a Sérvia, e todos os dias procuram um novo caminho que possa levá-las até ao Norte da Europa – quando a Hungria fechou as portas, viraram-se para a Croácia; quando a Croácia disse que não conseguia registá-las, viraram-se para a Eslovénia. E agora muitas delas estão a ser transportadas de um lado para o outro: da Croácia para a Hungria e da Hungria para a Áustria, sem nunca passarem das zonas de fronteira e colocadas em campos para refugiados.

Nas últimas horas, pelo menos 1200 pessoas entraram na Eslovénia a partir da Croácia, ficando um pouco mais perto de países como a Áustria e a Alemanha, mas também aí enfrentaram a falta de uma resposta conjunta da União Europeia. Sem saberem ainda muito bem o que fazer, as autoridades eslovenas já usaram gás pimenta para dispersar refugiados e migrantes, na sexta-feira à noite (deixando-os depois entrar em grupos mais pequenos), e já disseram que vão falar com os seus vizinhos sobre a possibilidade de abrir um "corredor" para deixar passar essas pessoas, se a situação nas suas fronteiras se agravar.

E a crise só poderá piorar nos próximos tempos, já que muitos milhares continuam a chegar à Grécia a partir da Turquia, partindo depois pela chamada rota dos Balcãs, em direcção aos mesmos países que vão empurrando de um lado para o outro os que já lá chegaram.

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