AdC esclarece que Pedrosa não é quem manda mais na TAP

Análise da Autoridade da Concorrência diz que Humberto Pedrosa, apesar de ser maioritário no consórcio comprador da TAP, a Atlantic Gateway, partilha o controlo com David Neeleman.

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Humberto Pedrosa e David Neelman assinaram o contrato de compra no passado dia 24 de Junho Rui gaudêncio

O projecto de decisão da AdC sobre a venda da TAP ao consórcio detido pelo empresário português Humberto Pedrosa e pelo empresário David Neeleman, com nacionalidade norte-americana e brasileira, considera que o negócio “não é susceptível de criar entraves significativos à concorrência" e por isso dá-lhe um parecer prévio positivo. Mas o documento consultado pelo PÚBLICO refere ainda que, pelas várias disposições dos acordos parassociais da Atlantic Gateway, está em causa a aquisição de “controlo conjunto da TAP por parte da HPGB [sociedade de Pedrosa] e da DGN [sociedade de David Neeleman]”.

Por outras palavras, o entendimento da AdC é o de que a TAP será controlada conjuntamente por Humberto Pedrosa, dono da Barraqueiro, e David Neeleman, dono da Azul.

A questão do controlo da TAP tem sido um dos pontos mais polémicos no dossier de privatização da companhia. Os representantes legais do candidato derrotado, Germán Efromovich, têm defendido que está em causa a aquisição do controlo conjunto da TAP (posição com que a AdC concorda), o que dizem violar as leis europeias dos serviços aéreos. Já a Associação Peço a Palavra, que também se constituiu como contra-interessada neste processo, entende que a venda da TAP à Atlantic Gateway traduz a entrega do controlo exclusivo da TAP a David Neeleman.

A legislação europeia define que a licença de transportador aéreo só pode ser entregue nos casos em que “mais de 50 % da empresa pertencer e for efectivamente controlada por Estados-Membros e/ou nacionais de Estados-Membros, directa ou indirectamente através de uma ou várias empresas intermediárias”.

Ainda em Julho, no Parlamento, o ministro da Economia, António Pires de Lima, refutou as críticas à composição do consórcio a quem o Governo pretende vender 61% do capital da TAP: "Não é verdade que o consórcio vencedor não seja liderado pelo empresário português Humberto Pedrosa. É muito injusto que um empresário português com uma tão longa tradição de construir seja desvalorizado e desqualificado nas críticas implícitas à sua posição neste consórcio", afirmou Pires de Lima, citado pela Lusa.

O ministro tem garantido que o Governo tem segurança jurídica quanto à composição do consórcio e que está certo da sua aprovação pelos reguladores.

No seu processo de decisão, a AdC  destaca que a análise ao negócio de venda da TAP tem um âmbito bem definido: o da apreciação do impacto desta operação de concentração do ponto de vista da lei da concorrência. De fora ficam quaisquer considerações sobre matérias como o interesse público da venda da companhia, o modelo de privatização escolhido pelo Estado ou o cumprimento dos regulamentos europeus sobre a exploração de serviços aéreos no espaço europeu, frisa a AdC.

Contudo, é taxativa quanto a quem caberá o controlo da empresa: “A AdC considera que a presente operação de concentração consiste na aquisição de controlo conjunto da TAP por parte da HPGB e da DGN, ainda que através da Atlantic Gateway”.

Embora os accionistas do consórcio não partilhem de forma equitativa os direitos de voto desta sociedade, uma vez que a HPGB (ou seja, Humberto Pedrosa) tem 51% e a DGN (David Neeleman) tem 49%, a AdC considera que o primeiro ficará dependente do segundo para tomar decisões estratégicas para a companhia. É que há matérias estratégicas que estão dependentes, por via dos estatutos do consórcio, de aprovação (quer no conselho de administração, quer na assembleia geral da Atlantic Gateway) “por maiorias qualificadas que implicam actuação conjunta”, refere o parecer.

A AdC lembra que Pedrosa e Neeleman “elegem, em conjunto, todos os órgãos sociais das participadas da empresa veículo, ou seja, da TAP SGPS e das suas subsidiárias”. E que esta “eleição conjunta dos órgãos sociais é um elemento fundamental na caracterização do controlo na presente operação de concentração”.

A entidade presidida por António Ferreira Gomes reforça esse entendimento citando a Comissão Europeia, que afirma que o “poder de determinação conjunta da estrutura dos órgãos de gestão, como os membros do conselho de administração, confere em geral ao seu detentor [do direito de veto ou de oposição] o poder de exercer uma influência decisiva sobre a política comercial de uma empresa”.

O financiamento da empresa é outro ponto que reforça a certeza de que haverá controlo conjunto na TAP. É que uma vez que é a Neeleman, enquanto accionista minoritário, que cabe a principal fatia do investimento na TAP (95% das prestações acessórias, ou 214,5 milhões de euros), cria-se uma situação em que o accionista maioritário fica dependente do accionista minoritário.

Regressando à legislação europeia, a AdC salienta que o controlo conjunto pode verificar-se “também quando um accionista maioritário depende acentuadamente de um accionista minoritário”, seja porque “a empresa comum depende económica e financeiramente do accionista minoritário” ou porque este “é o único que dispõe do saber-fazer necessário e é chamado a desempenhar um papel crucial na empresa comum”. E aqui, porque está no negócio da aviação, Neeleman tem primazia sobre Pedrosa. Além de ter direito a ficar com cerca de 75% dos lucros da TAP, cabendo 25% ao empresário português.

Os contra-interessados têm menos de duas semanas para pronunciar-se sobre este projecto decisão, de que foram notificados na terça-feira. Em paralelo está a decorrer a análise do regulador sectorial, a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), que deverá pronunciar-se sobre a legalidade da decisão de acordo com as regras europeias, nomeadamente sobre o detentor do controlo da companhia.

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