Shyamalan e os flashes

Tudo se resume a truques e flashes.

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Bom, pelo menos é um regresso de Shyamalan (depois dos desastres de O Último Airbender e Depois da Terra) ao recreio em que ele está mais vontade, o do filme-brinquedo que passa três quartos do tempo a fingir que é uma coisa antes de um inevitável golpe de rins — que é o que “faz” o filme — virar do avesso a percepção que o espectador estava a ter.

É o filme de um realizador habilidoso mas terrivelmente superficial, como Shyamalan quase sempre foi com eventual excepção de O Acontecimento (que por acaso ou não também é o seu filme menos “habilidoso”). Domina com eficácia os mecanismos do fantástico e tem arte para criar pequenos acontecimentos dramáticos a partir de não-acontecimento narrativos (quando todo o efeito vem da possibilidade de uma coisa acontecer, mais do que de ela acontecer mesmo). Mas tudo se resume a truques, da estratégia do “filme de telemóvel” (o Cloverfield de Matt Reeves era bem melhor, no género), demasiado “limpa” para trazer mais do que uns diálogos onde se ouve a expressão mise en scène (porventura pela primeira vez num filme americano de grande público), ao quase imperdoável twist nos últimos minutos, a mudar radicalmente o nosso olhar sobre algumas personagens e a transformá-las em monstros com os quais já nenhuma relação é possível. Pelo meio, uns flashes — a chuva e a lente desfocada na cena de dénouement, por exemplo — dão a medida de um talento que tem tendência a revelar-se assim: uns flashes, e é quase tudo.

 

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