Não é só rock’n’roll (mas ela gosta)

Meryl Streep salva este filme em que Jonathan Demme trata o tema do regresso à família lembrando Os Amigos de Alex — mas sem qualquer big chill.

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Com a sua mistura de dureza e humor, Meryl Streep sustém o filme DR

Vindo da oficina de Roger Corman, Jonathan Demme sempre esteve mais à vontade a trabalhar dentro de uma lógica de géneros, mesmo se para os abocanhar e virar do avesso.

Preferimos nele essa fronteira definida, essa existência clara de um tema em torno do qual variar. Parece menos à vontade — ou apenas menos interessante — dentro de uma estrutura menos coesa, como era a de O Casamento de Rachel, e como não era a de O Candidato da Verdade (remake do filme de Frankenheimer nos anos 60), a melhor obra de Demme de entre os seus últimos títulos estreados em Portugal.

Uma estrutura menos coesa é também a de Rick e os Flash, a partir de argumento escrito pela famosa Diablo Cody (a argumentista do tão sobrevalorizado Jason Reitman nos tão sobrevalorizados Juno e Jovem Adulta), e talvez não seja uma coincidência que também aqui exista uma longa sequência num casamento, como no “de Rachel”, sequência aliás bastante “aguada” na sua procura de uma recomposição familiar. É um pouco isto o tema do filme, o “regresso à família”, no caso o de uma velha country-rocker tradicionalista (e razoavelmente reaccionária), a cargo de Meryl Streep. Streep, claro, não deixa a personagem cair em saco roto, e de certa maneira é aquela sua mistura de dureza e sentido de humor que mais e melhor sustém o filme, equilibrando a sua Ricki na justa medida entre o retrato tipológico e a persona de corpo inteiro (algo que passa também muito bem pelas cenas de actuações ao vivo — Demme é um homem rodado na filmagem de concertos rock...).

Ainda assim, a pretensão sociológica de Ricki e os Flash (não será um acaso a presença de Kevin Kline no elenco, como ex-marido de Ricki, ele que foi um dos protagonistas de Os Amigos de Alex de Lawrence Kasdan, filme sobre um “ponto da situação” geracional que muito ao fundo parece espreitar este), a sua radiografia das relações e diferenças entre pais e filhos, entre a “sofisticação” (até política) de uns e o “tradicionalismo” de Ricki, resulta um pouco curta, um pouco óbvia, sem nenhum “big chill” e também sem nenhuma ironia digna desse nome. Que parece — a ironia — sobretudo concentrada em Streep, autêntico flash que atravessa o filme a injectá-lo com a sua energia e a salvá-lo do que, sem ela, seria por certo um completo domínio da modorra.

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