O mal-estar húngaro
Um “filme-sintoma”. E em vez de zombies ou extraterrestres, temos cães rafeiros.
É um filme suficientemente estranho (desde a dedicatória inicial a Miklos Jancsó) para se ver sempre com interesse, mesmo que a ideia (a revolta dos cães rafeiros de Budapeste) seja melhor do que aquilo que o filme acaba por ser – e em particular aquele final, demasiado preparado, demasiado composto.
Mas é impossível deixar de o ver como um “filme-sintoma”, ao género dos que, com zombies ou extraterrestres em vez de rafeiros, Carpenter ou Romero já fizeram mais do que uma vez, e “filme-sintoma” que possivelmente não podia vir de outro sítio senão da Hungria, o país que está na vanguarda da Europa no regresso a leis socialmente repressivas (da perseguição a ciganos à criminalização dos sem-abrigo) e que propicia a “leitura” daquela matilha enquanto metáfora, mais ou menos clara, de uma revolta de excluídos e perseguidos.
No futuro, muito provavelmente olharemos para Deus Branco como uma manifestação do profundo mal-estar na Europa dos anos 2010.