Défice abaixo de 3% não é impossível, mas pode exigir mais austeridade

Comissão reviu ligeiramente em baixa a previsão para o défice público português, de 3,2% para 3,1%. Previsão de crescimento económico em 2015 mantém-se nos 1,6%.

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Comissão liderada por Jean-Claude Juncker está ligeiramente mais optimista em relação a Portugal

Apesar de estar mais optimista em relação ao desempenho orçamental que Portugal irá conseguir apresentar este ano, a Comissão Europeia continua a duvidar da capacidade do Governo para cumprir o seu objectivo de atingir um défice público abaixo de 3% já em 2015.

Nas previsões de Primavera publicadas nesta terça-feira, o executivo europeu liderado por Jean-Claude Juncker reviu a sua projecção para o défice orçamental português, dos 3,2% que tinha apresentado em Fevereiro para 3,1%.

A descida ligeira neste indicador aponta para um maior optimismo de Bruxelas, mas significa que se continua a duvidar da capacidade de Portugal de sair do procedimento por défices excessivos já a partir deste ano, algo que apenas é possível registando um saldo orçamental negativo inferior a 3% do PIB. O Governo português tem garantido que a meta de 2,7% que apresentou no Orçamento do Estado para 2015 irá ser cumprida.

Pierre Moscovici, o comissário dos Assuntos Económicos e Monetários, explicou que o facto de não prever um défice abaixo de 3%, não significa que ele não possa acontecer. Mas com condições.

"Obviamente não é inalcançável [Portugal] chegar à meta de 3%" do défice”, afirmou nesta terça-feira. O objectivo, diz Moscovici, pode acontecer graças a "condições de crescimento melhores do que o previsto" ou recorrendo "a medidas adicionais". Em todo o caso, "pode ser feito e tem de ser feito".

Na resposta, dada em Londres onde se encontrava para participar numa conferência, a ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque manteve, "categoricamente", que Portugal vai sair do procedimento por défice excessivo este ano. E até deu a entender que terá de ser a Comissão Europeia a corrigir as suas projecções no futuro. "Estão cada vez mais próximos da nossa previsão", disse a ministra.

A descida de uma estimativa de défice de 3,2% para 3,1% é explicada pela Comissão Europeia com o facto de a retoma económica em Portugal estar agora “mais consolidada”. “A melhoria ligeira em relação às previsões de Inverno são o resultado de um cenário macroeconómico revisto”, refere o relatório no qual se lê ainda que,“em particular, devido ao consumo privado e emprego mais altos, se prevê que as receitas dos impostos directos e indirectos, assim como das contribuições sociais, cresçam ligeiramente”.

Mas a Comissão Europeia continua a não acreditar na previsão mais optimista do Governo para o défice, devido à “incerteza” que diz haver em torno dos ganhos que se espera obter com o combate à fraude fiscal.

Bruxelas volta ainda a destacar o facto de o défice estrutural se agravar, de 0,8% em 2014 para 1,5% em 2015, o que significa que o Governo não cumpre outra das regras do pacto orçamental: uma redução de pelo menos 0,5 pontos percentuais neste indicador até que o défice estrutural chegue aos 0,5% do PIB.

No que diz respeito à evolução da dívida pública, as projecções da Comissão Europeia também apresentam uma melhoria ligeira. Para este ano, estima-se agora um rácio de 124,4% do PIB, quando em Fevereiro o valor previsto era de 124,5%. Em 2016, a previsão mudou de 123,5% para 123%. Este é um ritmo de redução da dívida bastante inferior ao do Governo, que espera chegar ao final de 2016, com a dívida pública já em 121,5% do PIB.

Mais consumo e investimento
Em relação à evolução da economia, apesar de falar de uma “aceleração” da retoma, a Comissão Europeia não altera a sua estimativa de crescimento para este ano, situada em 1,6%, o mesmo valor já apresentado em Fevereiro e que é também a previsão feita pelo Governo no Programa de Estabilidade divulgado em Abril.

Para 2016, Bruxelas faz uma ligeira revisão em alta da previsão de crescimento do PIB, de 1,7% para 1,8%. Este valor fica, ainda assim, abaixo das perspectivas do Governo, que antecipa um crescimento de 2%.

No entanto, apesar destas alterações tão ligeiras em relação ao crescimento do PIB, a Comissão procede a revisões bastante significativas nas previsões que faz para as diversas componentes do produto.

O consumo privado deverá crescer 1,8% este ano, diz a Comissão Europeia, quando em Fevereiro apontava para uma subida de apenas 1,5%. Para 2016, a previsão passa de 1,6% para 2%. Bruxelas diz que vários factores explicam esta aceleração do consumo: os indicadores de confiança dos consumidores estão a níveis elevados e o rendimento disponível das famílias está a ser favorecido pela descida dos preços do petróleo, pelas melhorias no mercado de trabalho e pela subida gradual dos salários, para além, embora num menor grau, da reforma do IRS.

A Comissão está também mais optimista em relação ao investimento. Agora prevê taxas de crescimento de 3,5% em 2015 e de 4% em 2016, quando em Fevereiro apontava para 2,9% e 3,1%, respectivamente. O executivo europeu diz que, apesar do elevado nível de endividamento das empresas, o investimento deverá ser reforçado devido à recente subida na utilização da capacidade produtiva, à política monetária expansionista e à esperada melhoria das condições de crédito. A reforma do IRC operada no ano passado - da qual se distancia agora o PS - também é vista como uma razão para esperar uma aceleração do investimento.

Do lado das exportações, a Comissão também espera taxas de crescimento ligeiramente superiores. Passou de 5% para 5,3% em 2015 e de 5,4% para 6,1% em 2016. A aceleração prevista na actividade económica dos restantes países da zona euro explica este resultado.

A dúvida surge: como é possível que, subindo todos estes componentes do PIB (e o crescimento das importações diminuindo), a previsão de crescimento económico se mantenha inalterada? A explicação está no facto de, em 2014, Portugal ter acumulado um elevado stock de petróleo (que não foi refinado por causa da paragem na Galp). Para 2015, prevê-se agora uma redução desse stock acumulado, o que pode ter um efeito negativo no valor do PIB de 0,3 pontos percentuais.

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