Polícia branco matou pelas costas homem negro desarmado nos EUA

Morte provoca novas acusações de racismo contra a polícia norte-americana. Agente só foi detido e acusado depois de surgir um vídeo com o incidente.

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Cena retirada do vídeo mostra Walter Scott em fuga no momento dos disparos DR

Um polícia norte-americano branco foi detido e acusado de homicídio nesta terça-feira, por ter disparado oito tiros pelas costas contra um cidadão negro, que estava desarmado e em fuga.

No sábado, dia do incidente (e quando ainda não se sabia que o caso tinha sido filmado), o agente Michael Slager alegou que temera pela sua vida, pois Walter Scott, de 50 anos, tentara roubar-lhe a arma de atordoamento (taser). Mas o vídeo que levou a que Slager fosse acusado de homicídio, na terça-feira, mostra que Scott estava em fuga e desarmado quando os oito tiros foram disparados.

Walter Scott foi mandado parar por ter um farol partido numa operação stop, no estado da Carolina do Sul, mas pôs-se em fuga a pé – o seu irmão diz que ele fugiu da polícia por não ter pago a pensão de alimentos aos quatro filhos.

De acordo com o relatório da polícia, o agente disparou a arma de atordoamento contra Scott, sem conseguir travar a sua fuga. Os dois envolveram-se então num breve confronto, e em seguida Scott volta-se de costas para o agente e começa a fugir. É então que o polícia dispara oito vezes, sem que antes se ouça qualquer ordem para Scott parar.

Depois dos disparos, e já com um segundo agente no local, Michael Slager dirige-se para o local do confronto com Walter Scott, apanha do chão um objecto e deixa-o cair perto do corpo da vítima. Não é claro se esse objecto é a arma de atordoamento que Slager afirma que Scott lhe tentara tirar. Para além disso, apesar de o relatório da polícia indicar que foram realizadas manobras de reanimação, o vídeo mostra que Scott continuou algemado no chão durante minutos sem que os agentes tivessem tentado reanimá-lo.

O debate sobre o tema da violência policial contra cidadãos negros nos Estados Unidos tem sido recorrente desde a morte de Michael Brown, o jovem abatido a tiro por um polícia em Ferguson. Tal como aconteceu com Michael Brown, também as mortes de Eric Garner, Tamir Rice e Rumain Brisbon geraram ondas de protesto nos EUA e uma discussão sobre racismo e impunidade na polícia norte-americana.

Todos estes homens eram negros e estavam desarmados na altura em que foram mortos (Tamir Rice, de apenas 12 anos, tinha uma pistola de ar comprimido). A indignação em torno destes casos agravou-se com o facto de nenhum dos agentes envolvidos ter sido acusado de qualquer crime. Desde então, por intervenção da Casa Branca e do gabinete do procurador-geral dos EUA, foram publicados relatórios em que se comprovou a existência de práticas racistas nas forças de autoridade norte-americanas. Um deles arrasa as práticas da polícia de Ferguson, onde morreu Michael Brown (apesar de não ter encontrado indícios de que o agente agiu de uma forma irregular ou ilegal).

A pergunta que se coloca agora no caso de Walter Scott é: teria Michael Slater sido acusado de homicídio, se o vídeo dos disparos não tivesse sido divulgado? "O que aconteceu hoje não acontece sempre", disse Chris Stewart, o advogado da família de Walter Scott, depois de o polícia ter sido acusado e detido. "E se não existisse nenhum vídeo?", deixou no ar o causídico.

"Nunca se saberia que isto tinha acontecido. O caso teria sido varrido para debaixo do tapete, tal como fizeram em muitas outras situações", respondeu o pai da vítima, Walter Scott Sr., numa entrevista ao programa Today, da estação NBC.

Naturalmente emocionado, o pai de Scott contou qual foi a sua reacção quando viu o vídeo: "Deixei-me cair e fiquei de coração partido. Da forma como ele disparou aquela arma, parecia que queria abater um veado. Não sei se foi um caso de racismo ou se ele tem algum problema mental", disse Walter Scott Sr.

As mortes de Eric Garner e Tamir Rice foram registadas em vídeo, o que não contribuiu para que os polícias fossem acusados, mas acentuou a indignação popular. No início de Março, registou-se também um vídeo dos disparos fatais da polícia contra um sem-abrigo em Los Angeles.

Walter Scott, de 50 anos, foi atingido por cinco dos oito tiros disparados por Michael Slater. Três atingiram-no nas costas (um deles no coração), um nas nádegas e outro na orelha. Mas o médico legista não confirmou se a morte foi, ou não, imediata, de acordo com o que é avançado pelo The New York Times.

Pelo que afirma o irmão de Walter Scott, a razão pela qual este terá fugido da polícia deve-se ao facto de não ter as pensões dos quatro filhos em dia. O The New York Times, que cita um jornal local, diz que Scott fora detido pelo menos dez vezes, a maioria delas por não ter pago as pensões aos filhos e por ter faltado a audiências em tribunal, embora tenha sido detido também por um caso de agressão, em 1987. 

O caso da morte de Walter Scott aconteceu na cidade de North Charleston, na Carolina do Sul. Apesar de dois terços da população do estado da Carolina do Sul ser de raça branca, em North Charleston a população negra é mais numerosa, com 47% dos habitantes. Mas a polícia de North Charleston contraria a demografia: 80% dos agentes são brancos.
 

   


 

   

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