Zeinal Bava sai da Oi dois meses depois de Henrique Granadeiro ter deixado a PT

Da noite para o dia, Zeinal Bava renunciou à liderança da Oi, sem explicações e num momento em que surgem rumores sobre a venda da PT.

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Bava estava na Oi desde Junho de 2013 Enric Vives-Rubio

Em Agosto, Zeinal Bava estava “totalmente focado” na fusão entre a PT e a Oi. Em Outubro, está de saída da empresa brasileira. A sua renúncia ao cargo de presidente executivo foi anunciada na terça-feira a seguir ao fecho da bolsa brasileira, madrugada em Portugal, e seguiu-se a vários dias de rumores sobre a sua saída iminente, espoletados por um blogue de análise da revista brasileira Veja.

Num comunicado de dois parágrafos enviado ao regulador da bolsa, a Oi despachou o tema da renúncia de Bava limitando-se a dizer que o gestor vai ser substituído interinamente por Bayard De Paoli Gontijo, actual administrador financeiro. Já a bolsa portuguesa negociava há quase três horas e a notícia estava em todos os sites, quando, perto das 11h, o comunicado foi publicado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.

Passaram menos de dois meses desde que os administradores da Oi na PT, que se demitiram em Julho garantindo nada saber sobre os investimentos de 900 milhões de euros na Rioforte, elogiavam a “excelência na gestão” da PT Portugal (que esteve a cargo de Bava) e criticavam a actuação da PT SGPS (liderada por Henrique Granadeiro) num anúncio publicado nas páginas centrais do Expresso. Nesse anúncio de 15 de Agosto, em que também acusavam Ricardo Salgado de falsear informação, Otávio Azevedo e Fernando Portella anunciavam ainda a abertura de uma auditoria da Oi aos investimentos da PT na Rioforte.

Apesar de, num primeiro momento, parecer ter sido apoiado pelos accionistas da Oi, terá Bava ficado com a sua posição fragilizada com o escândalo Rioforte? Terá sido forçado a sair? Terá saído porque já não se revê num projecto que passa pela venda da PT Portugal, quando a sua ambição era uma fusão luso-brasileira? As leituras são várias e umas mais convenientes (e credíveis) do que outras, consoante os interesses em jogo. A evidência é que Bava deixa a liderança executiva da Oi precisamente dois meses depois de Granadeiro ter renunciado ao cargo de presidente do conselho de administração e da comissão executiva da PT.

De uma penada, os dois gestores que durante anos foram o rosto da PT (e saíram vitoriosos em momentos emblemáticos como a OPA da Sonaecom e a guerra com a espanhola Telefónica pelo controlo da Vivo) ficam agora associados a um processo em que a PT passou de uma empresa relevante com negócios em Portugal, Brasil e África, a uma subsidiária da Oi, à beira de ser vendida para financiar um projecto de crescimento no mercado brasileiro. O desfecho da operação já mereceu críticas do primeiro-ministro (ver caixa ao lado).

A Oi é uma empresa muito endividada (mais de 14 mil milhões de euros), que falhou recentemente o leilão de licenças de quarta geração por falta de capacidade financeira. Há quem veja por isso na saída do gestor português dificuldades acrescidas no caminho de futuro da Oi. Zeinal Bava “possuía as credenciais para liderar o processo” de integração entre as empresas e de redução de dívida, “e agora fica a dúvida sobre quem pode assumir esse papel”, disse ao PÚBLICO Ari Lopes, analista da Ovum, consultora internacional especializada no sector das telecomunicações. “É uma função difícil”, disse o analista, lembrando que a Oi teve três presidentes executivos em cerca de quatro anos. “Eram todos executivos respeitados, mas saíram sem poder concluir seus planos”, notou.

Num momento em que a empresa está a completar a fusão com a Oi, está “supostamente a construir uma proposta pela TIM (a segunda maior operadora móvel brasileira), e há rumores da venda de activos da PT em Portugal”, soma-se a busca de um novo CEO. “Isso não ajuda na resolução dos problemas, apenas cria mais um”, desenvolveu o mesmo analista, acrescentando que “a saída repentina de Zeinal dá a impressão de um relacionamento tumultuoso entre os principais accionistas.”

“A mim surpreende-me que [a saída de Bava] não tenha sido mais cedo", disse ao PÚBLICO Rafael Mora, administrador da Ongoing, que tem 10,05% do capital da PT SGPS. “Quando percebi que ele não fazia parte do comité negociador [que em meados de Julho renegociou os termos da fusão depois do incumprimento de 900 milhões de euros da Rioforte], achei que podia acontecer a qualquer momento”, acrescentou.

Mora explicou ainda que a Oi terá agora de criar um comité, “onde a PT [que tem 10% da actual Oi] também estará representada”, para contratar uma empresa especializada que irá, por sua vez, procurar um executivo para o cargo. “É um processo para três meses, no mínimo”, disse. A Oi espera que o processo de fusão esteja concluído no final do primeiro trimestre de 2015.

Por enquanto, caberá a Gontijo, que é administrador financeiro e director de relações com investidores da Oi (e também o homem a quem reportam os responsáveis financeiros da PT Portugal) desempenhar as funções de super-gestor.

De empresa bandeira a activo para venda
A Oi nega ter recebido qualquer proposta de compra pela PT Portugal e diz que ainda não decidiu se os negócios portugueses são activos disponíveis para venda. Mas a Altice (fundo que tem a Cabovisão e a Oni) já sinalizou o seu interesse e há negociações com os grandes accionistas da Oi desde “há algumas semanas”, como revelou ao PÚBLICO fonte ligada ao processo.

“Eu sei que a Africatel [na qual se inclui a posição na angolana Unitel] está à venda, porque fomos confrontados com isso e demos o nosso acordo, mas sobre a PT Portugal não há qualquer deliberação, nem proposta”, disse Rafael Mora. O gestor lembrou que, “pelos acordos parassociais entre a Oi e a PT”, a PT SGPS (onde estão a Ongoing, o Novo Banco, a Controlinveste e a Visabeira) “tem poder de veto e terá sempre uma palavra a dizer sobre qualquer venda de um activo desta magnitude”.

Fontes de mercado ouvidas pelo PÚBLICO salientaram que a eventual compra da PT Portugal por uma empresa sem presença no mercado nacional suscitaria menos entraves do ponto de vista da concorrência do que outra que já tem operação (como a Cabovisão) e poderia ficar sujeita aos chamados “remédios”, ou seja, venda de activos.

Trabalhadores preocupados
Seja quem for que venha a interessar-se pela PT Portugal, para os trabalhadores as incógnitas são muitas. “As pessoas estão extremamente preocupadas, mesmo ao nível dos quadros superiores”, disse ao PÚBLICO o representante do Sindicato dos Trabalhadores da Portugal Telecom (STPT), Jorge Félix. A PT Portugal tem quase 11 mil funcionários no activo e outros seis mil nos regimes de pré-reforma e suspensão dos contratos. Jorge Félix revelou que o sindicato vai reunir-se na sexta-feira com o novo presidente executivo da PT Portugal, Armando Almeida, com o futuro da PT e a segurança dos empregos como tema central da reunião.

A saída de Zeinal Bava deve ser um momento de clarificação quanto ao futuro da PT e do seu papel na economia nacional, defende a Comissão de Trabalhadores. “O Governo não se pode demitir das suas responsabilidades, porque eliminou a golden-share sem negociar um acordo parassocial que acautelasse o interesse nacional e os direitos dos trabalhadores”, disse ao PÚBLICO fonte daquele órgão. “A solução pode ser a nacionalização da empresa”, disse a mesma fonte, frisando o impacto que o desmembramento da PT poderá ter na economia portuguesa.

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