Um Toque de Pecado

Jia Zhang-ke bem pode dizer que Um Toque de Pecado é a sua homenagem (discreta, retorcida, mais temática que estilística) aos velhos filmes de artes marciais chineses, inspirada por casos verídicos de gente normal que partiu para a justiça pelas suas próprias mãos quando percebeu que nenhum dos trâmites legais oficiais alguma vez seria capaz de compensar a dignidade perdida. O que daqui sai é mais um dos seus painéis atentos e desencantados sobre a nova China em movimento, reflectindo o “estado das coisas” de uma sociedade onde o dinheiro, mais do que nunca, se tornou numa divisão fracturante entre quem o tem e quem não o tem. Um Toque de Pecado vê-se com o nó na garganta de quem reconhece nas suas personagens desesperadas as vítimas de um capitalismo mercenário e despersonalizador, sem que essa dimensão moral afecte minimamente a determinação observacional e fluida do cinema de Jia - mesmo que por vezes passe a sensação de que a habitual subtileza do realizador chinês surja um pouco embotada pela necessidade de fazer passar a mensagem.

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