Muito Bem, Obrigado

Uma pequena surpresa, esta segunda longa-metragem da realizadora e argumentista francesa Emmanuelle Cuau (que colaborou, por exemplo, com Jacques Rivette) é uma espécie de anti-"Sicko": onde o documentário de Michael Moore eleva aos píncaros o serviço nacional de saúde francês, "Muito Bem, Obrigado" descreve-o - e aos restantes serviços públicos franceses - como um burocrático labirinto kafkiano que dá aplicação prática à expressão "efeito borboleta".

Apanhado a fumar no átrio de saída de uma estação demetro, um contabilista insatisfeito com a sua vida dá por si prisioneiro de uma engrenagem diabólica emque o simples facto de querer fazer valer os seus direitos de cidadão o rotula de "per-turbado" e oleva, por uma daquelas acumulações de absurdosresultantes da aplicação estrita e cega das leis, a um hospital psiquiátrico, sem que a sua sofredora esposa taxista consiga desfazer os erros cometidos.

Emmanuelle Cuau não é a melhor cineasta do mundo (visualmente, o filme é bastante pedestre) nem sabe exactamente como "abrir" o circuito fechado que construiu tão metodicamente, terminando numa nota de resolução um pouco mais certinha do que seria de desejar. Mas a justeza da dupla Sandrine Kiberlain/Gilbert Melki, o humor seco, como um burlesco atomizado em câmara lenta, e, sobretudo, o retrato certeiro e angustiante de uma sociedadedesumanizada que parece ter perdido todo o respeito pela personalidade tornam "Muito Bem, Obrigado" num objecto mais interessante do que parece à primeira vista.

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