O Medo já não o que era

Quando apareceu, "Jeepers Creepers" despertou algum entusiasmo, porque apresentava um modo inesperado de figurar o terror: toda a primeira parte construia-se de misteriosos fragmentos, de um "puzzle" que se ia perfilando perante nós. O medo não surgia de choques visuais ou de monstruosas criaturas, mas de uma habilidosa teia de sugestões e de suspensões. Por outro lado, conseguia-se que o espectador simpatizasse com o par (quase a roçar a imbecilidade), que o "guiava" pelo filme dentro, para melhor o enredar. A partir da aparição do "monstro" tudo se banalizava, mas restava a atmosfera criada e um simpático tom artesanal de série B, assumida enquanto tal.

No âmbito deste equilíbrio, já de si precário, a aparição de uma sequela fazia temer o pior. O melhor do original residia na sua capacidade para retardar o esperado e basear o terror no nada, na não-ficção, socorrendo-se sobretudo de sinais.

"Jeepers Creepers 2" começa logo com o ataque da criatura, aproveitando o corpo de um espantalho, mas salta o que poderia constituir um interessante modo de figurar a dúvida ou o "suspense", para se concentrar no último dia (o "monstro" regressa por vinte e três dias cada vinte e três anos, para se alimentar) da existência possivel, com um óbvio ataque a um autocarro escolar, que conduz uma equipa de basquetebol. E, a partir daqui, ou seja praticamente todo o filme, encontramo-nos num vulgar filme de terror, com cabeças cortadas, evidentes sustos nos momentos mais prevísiveis e uma longa e cansativa carnificina selectiva, com pinceladas de politicamente correcto nos conflitos rácicos ou tratamento das mulheres do grupo (convenientemente chefes de claque da equipa) , para não mencionar um ridículo "sub-plot gay", apenas esboçado.

Não contente com este muito pouco estimulante enredo, resolvido com a clássica eliminação das vítimas escolhidas uma a uma, "Jeepers Creepers 2" traz à liça um temerário "caça-monstros", armado de artesanal arpão, que é, nem mais nem menos, que o pai da primeira vítima. Tudo tão pobrezinho, tão pouco imaginativo... E, para quem achava que mais longe (e mais ridículo) era impossível, ainda temos direito a um inacreditável "flash-forward", quase vinte e três anos depois, para que o ciclo se prolongue e a próxima sequela se prefigure.

Que o terror não é o que era, já nós sabíamos, mas com "Jeepers Creepers" tínhamos ficado com algumas ilusões de que se poderia, com poucos meios inclusive, fazer diferente. Pois bem, tudo caíu por terra.

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