O elogio do espírito colectivo

Os estádios de futebol americanos são hoje o equivalente moderno das arenas romanas onde valia tudo menos tirar olhos. É aí, como quer mostrar Oliver Stone em "Num Domingo Qualquer", que hoje ecoam as pulsões ancestrais desses combates guerreiros até à morte - lá estão, em banda sonora, as ressonâncias tribais de evocação dos espíritos. Na imagem e no som, portanto, tudo como dantes em Stone. Ou seja, uma barragem de artilharia a caminho de uma transcendência qualquer.

O que é que traz de novo "Num Domingo Qualquer"? Mostra que Stone está mais velho, mais "optimista", como ele diria, e que até se aventura a contar uma história que poderia estar num "feel good movie" da televisão.

Há uma equipa, os Sharks, em crise de resultados, um treinador em perda (Al Pacino, com a receita nevrótica habitual), uma estrela em decadência (Dennis Quaid) e outra, como contraponto, em ascensão (Jamie Fox), e ainda a proprietária da equipa (Cameron Diaz), mulher fria e calculista, mesmo quando entra nos balneários dos jogadores, que só pensa na equipa num negócio rentável.

Resumo: "Num Domingo Qualquer" é o elogio do espírito colectivo, está a favor da equipa e contra a propretária. Ou seja, é um Stone reconciliador, uma celebração americana do espectáculo, do "show".

Se o realizador diz que encerrou uma fase da sua obra, se diz que com "Num Domingo Qualquer" deixou para trás a morte e os "complots" (sobretudo porque o anterior "U Turn" foi um enorme fracasso), podia também ter abandonado o formato "a fazer documentário" que é a sua assinatura. Ou seja, podia ter abdicado do seu próprio "show". Mas não. Isso permite-lhe que brilhe no som e na fúria - a montagem foi, certamente, uma aventura que daria um épico - só que aniquila o coração do filme e cria um vazio difícil de preencher. "Num Domingo Qualquer" escapa-se por entre a parafernália visual e sonora. Na personagem saturada de Pacino, apesar de tudo, ou no jogador em decadência que faz Dennis Quaid, passa a angústia do envelhecimento, mas Stone parece que nem repara. É difícil, portanto, não sentir: tanto barulho para nada.

Temos, portanto, que estar a favor da proprietária. Cameron Diaz, a "glamour girl" que não quer ser "glamour girl", faz uma personagem pouco convencional, a de uma mulher no meio do "espírito de balneário", alheia à sua sexualidade. Como se poderá confirmar com "Being John Malkovich", de Spike Jonze, que estreará em Portugal este ano, Diaz tem vindo a dar um rumo original à sua carreira, não recusando "secundarizar-se" ou escondendo-se em personagens sombrias e pouco vistosas, como se quisesse negar aquele plano, em "A Máscara", em que a sua aparição fazia com que se estatelassem no chão os maxilares de Jim Carrey.

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