UE acusa Roménia de “violar sistematicamente” a Constituição

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Victor Ponta encontrou-se na semana passada com Durão Barroso, que lhe manifestou as preocupações da União Europeia Georges Gobet/AFP

Atropelos à Constituição, ameaças a juízes e “manipulação do sistema democrático” são algumas das críticas feitas ao Governo romeno de Victor Ponta num relatório divulgado nesta quarta-feira pela Comissão Europeia. A Roménia está sob vigilância desde a sua entrada na UE, em 2007.

Num relatório de 22 páginas, a Comissão Europeia criticou as “acções sistemáticas” do Governo romeno contra o Estado de Direito, nomeadamente relacionadas com a independência da justiça. A Roménia é acusada de não ter cumprido as normas legais da União Europeia, o que poderá comprometer a adesão do país ao espaço Schengen.

Bruxelas sublinha que a maioria de centro-esquerda no poder em Bucareste não hesitou em promover a destituição do Presidente Traian Basescu, contestando decisões judiciais e contornando procedimentos estabelecidos.

As actuações do chefe do Governo e dos que o apoiam no Parlamento “deixam sérias dúvidas sobre o compromisso de respeito pelo Estado de Direito ou a compreensão do seu significado num sistema pluralista democrático”, adianta o relatório. Segundo a Comissão Europeia, a Roménia tem que “restabelecer o respeito pelo Estado de Direito”, tal como se comprometeu Victor Ponta.

O primeiro-ministro romeno foi chamado a Bruxelas na semana passada e prometeu ao presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, alterar a sua actuação em relação ao que Bruxelas considerou ataques ao Estado de Direito e enfraquecimento do poder judicial. Foram-lhe pedidas mudanças urgentes no que se refere ao respeito pela independência dos juízes, que o primeiro-ministro romeno prometeu cumprir.

Em Bruxelas, Ponta prometeu fazer adoptar pelo Parlamento legislação que respeite “precisamente e inteiramente” as deliberações do Tribunal Constitucional, adiantou uma fonte da União Europeia citada pela AFP, para além de revogar medidas que limitam os poderes deste tribunal.

Crise política desencadeada pela destituição do Presidente

A crise política na Roménia, marcada por uma forte rivalidade entre o primeiro-ministro e o Presidente, subiu de tom a 10 de Julho, quando Traian Basescu passou temporariamente o poder ao seu rival político e Presidente do Senado, Crin Antonescu, depois de o Parlamento ter aprovado a sua destituição e o Supremo Tribunal ter validado a suspensão de funções. Entretanto foi marcado um referendo para 29 de Julho sobre a destituição de Basescu, que só será validada se a maioria dos romenos a aprovar. Em 2007 Basescu já tinha sido alvo de uma tentativa de destituição semelhante, mas sobreviveu politicamente no referendo.

Entetanto, Crin Antonescu, o líder do Partido Nacional Liberal (PNL), uma das forças que integra a coligação governamental União Social Liberal (USL), assumiu interinamente a presidência e, pressionado por Bruxelas, reintroduziu a lei que estabelece uma participação mínima de 50% no referendo para que a destituição do Presidente entre em vigor. A União Europeia tinha manifestado preocupações relacionadas com a rapidez do processo de destituição e com o facto de o Governo ter tentado fazer aprovar as leis relativas aos referendos para tornar mais provável o afastamento de Basescu.

A participação da maioria do romenos será difícil de alcançar, o que dá a Basescu uma hipótese considerável de voltar a assumir a presidência, sublinhou a Reuters, ainda que as sondagens indiquem que a maioria dos romenos aprova a destituição de Basescu devido à austeridade e aos casos de corrupção em que esteve envolvido, juntamente com os seus aliados políticos.

A actuação de Victor Ponta para tentar destituir o Presidente esteve na origem de várias críticas feitas por Bruxelas, ainda que a UE tenha sublinhado que houve progressos relativos ao combate à corrupção. “A confiança nos parceiros romenos por parte da UE só será restabelecida quando for provado que o Estado de Direito está acima dos interesses dos partidos, que todas as partes mostram respeito pelo poder judicial e Constituição e que as reformas são irreversíveis”, lê-se no relatório.

Ponta considerou o relatório “equilibrado” e prometeu tirar “as conclusões necessárias”, garantindo que irá respeitar os compromissos que assumiu em Bruxelas. E Barroso considerou que “a Roménia recuou um passo quando estava à beira do precipício”, mas sublinhou que “não se pode dizer que se tenha chegado ao fim do processo”.

Um novo relatório deverá ser divulgado no final do ano e deverá centrar-se na forma como o Governo romeno respondeu às preocupações apresentadas sobre a independência do sistema judicial e o respeito pelo Estado de Direito. Até lá, Bruxelas deverá acompanhar a situação através de “missões regulares” e de conversações com as autoridades romenas.

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