O mundo de sinfonias verdes de Patrick Blanc

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Museu do Século XXI de Arte Contemporânea de Kanazawa, Japão fotos dr

Os muros vegetais são uma invenção de Patrick Blanc, que os define como pedaços de natureza transplantados para um contexto urbano. Luís Maio entrevistou o botânico francês que está a converter nódoas citadinas em atracções turísticas. Uma conversa onde se fala em cobrir de verde fachadas de prédios em Paris, museus no Extremo Oriente e mesmo um centro comercial na Amadora

Os centros urbanos são cada vez mais compactos, fechados sobre si próprios, carentes de zonas verdes. O que falta ao nível do solo é, porém, o que sobra em altura, uma vez que as cidades não param de crescer na vertical. Parece então lógico, mas nada óbvio, que as paredes dos edifícios sejam a nova fronteira do verde. Nada óbvio atendendo a uma série de ideias feitas. Como que as plantas requerem terra por complemento directo, ou que a colonização vegetal dos imóveis conspira para o seu derrube.

É a própria natureza, no entanto, a rejeitar os preconceitos. Há plantas a despontar um pouco em todo o lado, sem o sustento da terra, em locais que vão de cascatas a barrancos, de penhascos a copas de árvores. Na verdade, do que as plantas mais precisam para sobreviver é de água, minerais, luz e dióxido de carbono. Já a terra é um mero suporte técnico. Essa constatação marcou Patrick Blanc, desde que, aos oito anos (nasceu em 1953), a mãe o levou a uma exposição de flores em Paris, onde as principais vedetas eram orquídeas crescidas em troncos de árvores.

A experiência decisiva ocorreu, porém, aos 19 anos, quando passou a sua primeira temporada na Malásia, um país onde há 8000 plantas recenseadas, das quais 2500 crescem sem raízes na terra. De volta a Paris, Patrick especializou-se em botânica tropical, vindo a tornar-se investigador do centro francês de pesquisa científica, ao mesmo tempo que desenvolvia um sistema original de instalar e irrigar muros vegetais. Um sistema que fez questão de patentear, embora ele próprio o descreva mais humildemente como uma tradução do modo de vida das plantas.

Convívio vegetal

Estreado numa parede do Museu da Cidade das Ciências e da Indústria, em 1986, o dispositivo desenhado por Patrick Blanc passou a década seguinte a ser ensaiado noutras fachadas da capital francesa. O sucesso destes primeiros testes levou à sua promoção à categoria de novo emblema turístico de Paris. Seguiu-se a internacionalização e hoje há fantasias verdes da sua autoria nos quatro cantos do mundo, de Nova Iorque a Sidney, passando por Gdansk e mesmo a Amadora. Seguem-se as imitações, de resto já introduzidas por cadeias de artigos de jardinagem do outro lado do Atlântico.

Em breve os muros vegetais estarão em todo o lado e serão provavelmente tão comuns quanto os jardins horizontais. Para já, no entanto, persiste o efeito de magia, o deslumbramento de ver a natureza despontar onde menos se espera. Mas, afinal, o que são estas paredes cobertas de verde? Responde o autor: "Um muro vegetal não é bem um jardim, porque o princípio de um jardim é que se possa circular lá dentro. Uma floresta também não pode ser,

porque não há árvores, mas apenas arbustos, os maiores dos quais terão dois metros de altura. Será mais um fragmento de natureza que é trazido para a cidade. Como uma falésia vegetal, dessas que se encontram à beira das cascatas".

O efeito é prodigioso, mas a técnica é bastante simples. Uma moldura metálica é incrustada num muro, de modo a suportar uma folha PVC na qual são aplicados feltros com sementes, excertos e plantas já crescidas. Estas só precisam depois de ser alimentadas por uma solução nutriente, que vai fluindo através de um sistema de vasos capilares, controlados electronicamente a partir do telhado. Há cerca de 20 plantas por metro quadrado, o que torna a estrutura relativamente leve. Os benefícios são a protecção ambiental, o isolamento do ruído urbano e da poluição, mas também paisagísticos, e os muros verticais de Patrick Blanc têm sido frequentemente comparados a obras de arte. µ

± O próprio não enjeita essa vertente criativa, mas remete-a para segundo plano, definindo-se como botânico, não como artista ou sequer arquitecto paisagista. "O mais importante é saber escolher as plantas que conseguem viver juntas num determinado espaço, durante muito tempo. Porque se os meus muros vegetais têm tanto sucesso e são tão imitados é justamente porque agora, passada mais de uma dúzia de anos das primeiras instalações, se sabe que funcionam. Só depois vem o aspecto artístico, que se prende com a organização dos desenhos das plantas, a forma que assume cada mancha vegetal, o número de exemplares de cada espécie a empregar, a própria perspectiva segundo a qual as pessoas vão perceber a instalação".

Os cenários urbanos podem variar do museu ao centro comercial, passando pela loja de roupa e o parque de estacionamento, mas a verdade é que a técnica, o "método Patrick Blanc", persiste invariável. Não haverá o perigo da repetição, ou algo de semelhante ao sindroma dos arquitectos estrelas, que desenham sempre o mesmo edifício, seja qual for a cidade? Defende-se o botânico: "Em 15 anos desenhei cerca de 300 muros e não há dois em que tenha usado o mesmo desenho e a mesma lista de plantas. Quando se trabalha com o orgânico, o problema da imitação não se coloca, até porque a mesma espécie evolui de forma diferente em sítios diferentes. Por outro lado, estou sempre à procura de coisas novas e agora aproveito imenso os convites que me fazem para dar conferências nos quatro cantos do mundo e enriquecer as minhas pesquisas pelo caminho. No mês passado fui convidado para ir à cidade do México e aproveitei para visitar uma floresta nas redondezas onde vi plantas que conhecia, mas que não sabia que cresciam nas falésias, de modo que agora vou usá-las nas minhas próximas paredes vegetais. Pouco antes, a caminho de uma conferência em Hong Kong, encontrei finalmente uma planta na Malásia, que procurava desde a minha primeira visita em 1971".

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