Todos os nomes dos pães

São variados e saborosos os pães portugueses, de côdea e lar estaladiços. sejam de trigo, centeio ou milho. Ou da mistura destes cereais. Temos pães para o dia-a-dia. E pães para
os dias de festa. Mas, agora, ao menos quanto ao pão, todos os dias podem ser de festa

a O pão é um alimento suficiente. Havendo pão, não há fome que meta medo. Há dois provérbios portugueses que ilustram esta realidade: "Para boa fome não há ruim pão" e "Com pão e vinho já se anda o caminho".O pão dos pães em Portugal é o de trigo.
Não há nenhum exagero na afirmação de que a civilização europeia tem os seus fundamentos na cultura agrícola dos cereais: trigo, centeio, aveia e cevada. Em Portugal, os dois primeiros e, mais tarde, o milho, são as matérias-primas dos pães mais saborosos. O trigo a Sul, com destaque para o Alentejo; o centeio no Nordeste e Beira Interior. E a situação mantém-se até aos dias de hoje.
O pão de trigo, nas suas versões doce e salgada, tinha e, em certa medida ainda tem, a particularidade de se estender a todo o país nas épocas festivas: na Páscoa, nos folares para os afilhados; e no Natal; e ainda durante a matança do porco, que também era, é, uma festa. Nestas alturas, mesmo nas regiões onde escasseava o trigo, coziam-se fornadas para as ofertas e refeições rituais.
No III volume da obra Produtos Tradicionais Portugueses, recolha de 2001 da Direcção-Geral de Desenvolvimento Rural, do Ministério da Agricultura, citam-se os seguintes pães de centeio: da Guarda; de Barroso, de Castro Laboreiro; e do Sabugueiro. Os dois primeiros são de farinha de centeio; o de Castro Laboreiro junta centeio, trigo ou milho; o do Sabugueiro trigo e centeio. Há ainda pão de Escalhão, de trigo e de centeio; de Padronelo (com quatro cantos e estrangulamento central) de centeio e de trigo.
O pelotão dos pães de trigo é comandado pelo do Alentejo, cozido em fornos de lenha; cada terra tem o seu, mas o da Vidigueira e de Alcácer do Sal são muito citados e são muito bons. Há também o pão de trigo em padas, os mais conhecidos dos quais são de Ul, Ílhavo e Bairrada; o pão santoro de Pêga (espalmado e alongado, parecido com a forma das bôlas recheadas de Lamego), do distrito da Guarda; o pão sovado arregueifado (o redondo das zonas raianas da Beira Alta; e o de calo do Baixo Alentejo e Algarve); o pãozinho (carcaça de Lisboa e Vale do Tejo; bijou e molete de Entre-o-Douro e Minho; papo-seco do Ribatejo, Alentejo e Oeste; a rosca e a vianinha da Grande Lisboa).
Outros pães recenseados são: o pão doce das 24 horas, também conhecido como bolo doce das 24 horas e bolo das 24 horas. Trata-se de um pão levedado de farinha, leite, ovos, azeite, banha e levedura espontânea seleccionada; o pão de casa ou pão regional, pão de trigo da terra ou pão de família da Madeira, feito com farinha de trigo e batata-doce, cozido em forno de lenha; se for cozido sobre uma laje quente ou em frigideira chama-se bolo do caco; pão de alfarroba, confeccionado no Barrocal e Serra algarvios, com 85% de farinha de trigo e 15% de farinha de alfarroba, quase redondo, muito escuro e de sabor adocicado; a açoriana massa sovada, também conhecido por bolo de massa sovada ou bolo de massa. Mas ganha o lindo nome de "brindeira" se for para oferecer e folar na Páscoa (farinha de trigo, ovos, banha, açúcar, leite e fermento de pão); doce, muito leve, aromatizado com funcho ou erva-doce, é obrigatório das "funções" do Espírito Santo; folar de Vouzela, bolo de massa lêveda, muito rico em ovos e gordura, obtida pela mistura de manteiga e banha; folar de Trás-os-Montes, sendo o folar de Valpaços e a bôla de carne transmontana os mais conhecidos; confeccionado com massa de pão de trigo, enriquecida com ovos e azeite, recheada com carnes de porco, aves de capoeira e vitela; antigamente confeccionava-se apenas na Páscoa. A fogaça da Feira, que um grupo de amigos anda a tentar classificar, é bolo, pequeno ou grande, semicircular, figurando na parte superior as torres do Castelo da cidade da Feira; bolo de farinha de trigo, ovos, açúcar, manteiga, fermento, água, canela, sal e casca de limão; é o protagonista da Festa das Fogaceiras, realizada todos os anos a 20 de Janeiro, em honra de S. Sebastião, Mártir. O bolo folar da Guarda, de trigo e ovos, fermento de padeiro, aguardente, azeite, ácido ascórbico, sal e água é bom, bem como o bolo da sertã ou da laje, conforme seja cozido numa ou noutra, pão redondo, achatado, que se come quente, comum nas ilhas açorianas, confeccionado com farinha de milho, sem fermento, só com água e sal; bôla de Lamego, com recheios de presunto, carne de porco entremeada marinada em vinho tinto, sardinha, bacalhau ou vitela, confecionado com farinha de trigo, fermento de padeiro, água, manteiga, banha ou azeite; bôla de centeio do Barroso, recheada com carne de porco entremeada, chouriça de carne e cebola; bôla de torresmos, bolo de torresmos ou torta de torresmos, alentejana, pequenas bolas com recheio de linguiça ou torresmos; e, para um final açucarado, a arrufada de Coimbra, pão doce e fofo, de sabor a canela, confeccionado com farinha de trigo, ovos, açúcar, manteiga, leite e canela.
A palavra broa é utilizada, entre nós, sobretudo pelas populações do Norte, quando nomeamos os pães que não são de trigo, como é o caso das broas de milho e de centeio. O vocábulo deriva do céltico bron ou do germânico broth, que, nestes idiomas, significa pão. Em alemão pão é brot e em inglês bread. A Sul, onde se come pão de trigo, o pão dos romanos, o nome adoptado deriva do latim panis.
A broa de milho ou o pão de milho, cozida em forno de lenha, é feita com farinha de milho e de centeio, em proporções variáveis, conforme a região, mas que oscilam entre os 2/3 de milho para 1/3 de centeio e 1/2 de milho para 1/2 de centeio. O centeio usa-se por o milho ser muito pobre em glúten. É um pão ligeiramente ácido com um teor de humidade de cerca de 40 por cento. Tem forma arredondada e pesa entre 1 e 4 kg, segundo o mesmo livro Produtos Tradicionais Portugueses, recolha publicada em 2001 pela Direcção-Geral de Desenvolvimento Rural, do Ministério da Agricultura.
Segundo a mesma fonte, a broa de Avintes, o mais conhecido dos pães de milho portugueses, resulta da mistura de farinha de milho branco e de centeio, tem uma cor escura, é ligeiramente húmida, quase não tem côdea e tem um gosto específico, com um toque adocicado. Apresenta-se em dois tamanhos, conforme a massa é moldada numa tigela ou numa escudela. O tamanho grande (moldado em tigela) pesa 8 a 9 kg, tem um diâmetro de 30 cm e 15 cm de altura. O tamanho pequeno (moldado em escudela) pesa 1 kg e tem um diâmetro de 10 cm e 15 cm de altura.
O fabrico de pão de milho em Avintes deve-se ao rei D. Dinis (1261-1325), quando o monarca proibiu a cozedura de pão no Porto: "... as padeiras de trigo para Valongo e as de milho para Avintes". Porém, o fabrico da broa de Avintes só é citado pela primeira vez num Alvará de 16 de Setembro de 1563. A freguesia de Avintes organiza anualmente, desde 1989, na última semana de Agosto, a Festa da Broa e decorre, nas instâncias comunitárias, o processo da sua certificação.
Na obra citada, há o registo de mais dois pães de milho: a broa de milho da Beira Alta, feita com o cereal de grão amarelo; e a broa de Vil Moinhos, confeccionada em todo o distrito de Viseu, mas sobretudo na freguesia dos arredores da cidade que, na Idade Média, se chamava Villa de Molinis. A broa de Vil Moinhos é confeccionada com farinhas de milho e de centeio tipo integral.
Como se sabe, o milho "maiz" só chegou à Europa no século XVI, após a descoberta da América por Cristóvão Colombo. Mas já se comia broa antes dessa data, nomeadamente no Norte de Portugal. Era confeccionada com milho miúdo. Daí que, num célebre poema sobre os minhotos, de diga que eles comem pão feito com "milho de passarinho".

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