Vender-se ou encolher ainda mais são as opções para o futuro da BlackBerry

A empresa já foi sinónimo de smartphones, mas viu os clientes desertarem nos últimos anos. Agora, procura comprador. Patentes, serviços e tecnologia são chamarizes para potenciais interessados.

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O director executivo, Thorsten Heins, já tinha indicado antes que a empresa estava disponível para ser comprada TIMOTHY A. CLARY/AFP

Encontrar comprador para a BlackBerry está a ser uma tarefa difícil. Várias vezes a multinacional canadiana tinha dado sinais de estar à venda, incluindo em declarações do director executivo, Thorsten Heins, que em Maio afirmou que essa seria uma hipótese, embora não a primeira escolha, para o futuro de uma empresa que está rapidamente a ficar sem opções.

Três meses depois, o anúncio de que a Blackberry quer um comprador, feito na segunda-feira com a notícia de que formou um comité para estudar opções estratégicas, só tem uma interpretação para Francisco Jerónimo, analista da IDC em Londres: “Claro que não há interessados. O que estão a dizer é ‘não conseguimos encontrar comprador, estamos disponíveis para ofertas’”.

A BlackBerry tem para oferecer uma situação financeira positiva, com cerca de três mil milhões de dólares (2300 milhões de euros) em dinheiro e investimentos de curto prazo, e sem dívidas. Tem tecnologia: o mais recente sistema operativo, o BlackBerry 10, não conseguiu o interesse dos consumidores, mas teve boas críticas de analistas e imprensa especializada (nesta terça-feira, a empresa lançou um novo modelo, equipado com o anterior sistema operativo). Por sua vez, o sistema em que o BlackBerry 10 assenta, chamado QNX, é usado noutros sectores, incluindo na indústria automóvel.

Há ainda o sistema de mensagens próprio, outrora muito popular e que foi recentemente alargado a outras plataformas, com o lançamento de aplicações para Android e iOS, da Apple. E a BlackBerry tem também um portefólio de patentes que é um activo precioso na indústria das telecomunicações — foi por causa das patentes que o Google comprou a Motorola Mobility por 12.500 milhões de dólares (9400 milhões de euros, ao câmbio actual).

“A empresa tem não apenas o negócio de smartphones, mas também o negócio dos serviços de mobilidade. Potenciais compradores ou parceiros podem ser concorrentes nestas áreas de negócio ou fabricantes de tecnologia que estejam interessados no grande portefólio de patentes”, explica ao PÚBLICO Bill Menezes, analista da Gartner nos EUA. “Outros potenciais compradores são investidores que possam ver uma oportunidade de lucro ao dividir a empresa”, tirando-a da bolsa e separando os telemóveis dos serviços de comunicação.

Qualquer investidor, porém, vai também comprar os riscos de um negócio em queda livre. A empresa já praticamente perdeu o segmento dos consumidores e está a ver os clientes empresariais mudarem para a concorrência, embora esse seja um processo mais lento. A Gartner tem perspectivas sombrias para a BlackBerry, estimando que, no próximo ano, menos de 1% dos telemóveis enviados para o retalho em todo o mundo serão da marca. Em 2016, de acordo com esta analista, só um em cada 100 utilizadores terá um destes telemóveis.

Potenciais compradores

A Microsoft poderia ser uma compradora, considera Francisco Jerónimo, sobretudo pela tecnologia da BlackBerry destinada ao mercado empresarial. “Os consumidores são um segmento morto para a BlackBerry, sem qualquer possibilidade de o conquistarem”, diz taxativamente.

A Microsoft tem tido um crescimento lento. O sistema Windows Phone ultrapassou este ano a BlackBerry e passou a ser a terceira plataforma de smartphones com mais quota de mercado, mas a fatia continua a ser pequena. Os dados da IDC indicam que, no segundo trimestre, o sistema Android liderava com 79,3% do mercado, seguido do iOS, com 13,2%. O Windows Phone tinha 3,7% e a BlackBerry, 2,9%. Não há indicação oficial de que a Microsoft esteja interessada.

Já a fabricante chinesa Lenovo está a ser apontada como outra potencial compradora. A multinacional tem uma posição forte no mercado de smartphones na China, onde está apenas atrás da Samsung, mas tem uma presença menor noutros territórios. Para além disso, está nos calcanhares da HP na corrida pelo título de maior fabricante mundial de PC — mas este é um mercado a encolher, contrariamente ao dos telemóveis e tablets.

Em Março, o director executivo da Lenovo, Yang Yuanqing, afirmou que a compra da fabricante canadiana “poderia fazer sentido”, mas que era preciso analisar o negócio. Em declarações à agência Bloomberg, um porta-voz da empresa disse agora que não está a ser feita qualquer avaliação para uma aquisição.

Uma intenção de compra por parte da Lenovo levantaria ainda um problema político: a maior parte dos serviços públicos dos EUA usam BlackBerry e o Governo americano não deixaria que este tipo de serviços fosse prestado por uma empresa chinesa.

Sem comprador, a BlackBerry parece destinada a encolher. “Tornar-se-ia num nicho ou num fornecedor de serviços e de smartphones muito específicos, na melhor das hipóteses”, antevê Bill Menezes, da Gartner. Francisco Jerónimo, da IDC, diz que teria de “continuar a despedir, cortar custos”, mas considera que haverá interessados, se o valor do negócio baixar para o preço certo.

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