Uma capital de risco que se sente como uma startup

A Faber Ventures surgiu com a nova onda de empreendedorismo em Portugal. Como muitas das empresas em que investe, quer partir de Lisboa para o mercado internacional.

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Alexandre Barbosa, co-fundador e sócio gerente da Faber Ventures Rui Gaudêncio

Para uma startup, ter ambições globais implica gastar muito dinheiro pelo caminho. A Faber Ventures, uma empresa de capital de risco cuja estratégia passa por investir cedo (às vezes, apenas numa ideia), surgiu em 2012, acompanhando a proliferação de startups tecnológicas em Portugal e de jovens a tentarem criar uma aplicação ou serviço online de sucesso mundial. É uma onda cujo início corresponde aproximadamente ao pedido de empréstimo internacional à troika (um particularidade portuguesa) e à massificação de tecnologias como os smartphones (um fenómeno global).

"Em Portugal, começava a haver indícios do que hoje é evidente: uma vaga incontornável de empreendedorismo", recorda Alexandre Barbosa, co-fundador e sócio gerente da Faber Ventures. "A Beta-i [um acelerador de startups] iniciava operações, a Startup Lisboa [uma incubadora] estava a formar-se, a Portugal Ventures [a sociedade de capital de risco do Estado] estava a ser preparada. Foi nesse período que uma série de agentes do actual ecossistema se lançaram", observa o empresário, que já criou uma agência digital em 2000 e que administrou durante três anos o Pavilhão Atlântico, até à privatização do espaço. 

A Faber Ventures surgiu também "por observação do que se passava em Berlim, em Londres, e também em Espanha", nota Alexandre Barbosa, referindo-se às cidades que são os dois exemplos de empreendedorismo tecnológico europeu. "Durante um ano estive a aconselhar-me com várias pessoas e a perceber o que fazia falta em Portugal e a nível europeu". 

A empresa foi fundada por quatro sócios e com investimento da Tagus, uma sociedade financeira. Arrancou com meio milhão de euros, "apenas o capital necessário para iniciar o trabalho". Nos dois anos seguintes, angariaram quatro milhões. Hoje, a Faber planeia criar um fundo de investimento. "Não operamos um fundo do ponto de vista formal. Se operássemos, seriamos um veículo de cerca de dez milhões", diz Barbosa. É um valor relativamente reduzido para este sector e o gestor não hesita em usar expressões como "micro-escala" para se referir à actividade da empresa. "Na verdade, a Faber é uma startup na indústria do venture capital [capital de risco]". 

Trabalho de formiguinha
Tipicamente, a Faber Ventures investe entre 50 mil e 150 mil euros numa empresa. No máximo, desembolsa meio milhão. Se investir cedo – em fases que na gíria do meio se chamam seed e pré-seed –, é provável que seja co-investidora quando a startup voltar a tentar obter investimento (no caminho para o sucesso internacional ou para o fracasso, muitas destas empresas fazem sucessivas rondas de angariação de capital).

 A estratégia foi começar por startups nacionais e depois seguir para a Europa. "Durante o primeiro ano, concentrámo-nos a fazer investimentos em Portugal, ou em equipas portuguesas que estavam a fazer empresas não necessariamente em Portugal”, diz o fundador. No portefólio de investimento estão startups como a Hole19 (uma aplicação para golfistas criada em Lisboa), a Codacy (um serviço de análise de código informático, com sede em Londres, mas fundado por um português) e a Seedrs (uma plataforma luso-britânica que permite a qualquer pessoa investir online em startups). 

"A dez ou 15 anos, queremos ter construído um operador pan-europeu respeitado, a partir de Portugal. Este é um plano que, como com todas as startups, é uma maratona. Estamos a fazer trabalho de formiguinha", diz Alexandre Barbosa. A empresa está agora a começar a explorar o mercado de Berlim. 

A Faber, tal como outras capitais de risco, pretende tornar as startups em que investe maduras o suficiente para irem procurar capital a Londres, onde estão os pesos-pesados do investimento de risco europeu. Mas Barbosa nota que há vantagens em que este tipo de empresas passem tempo em Portugal antes de se mudarem para o Reino Unido ou os EUA. E (como fazem muitas startups portuguesas) até podem manter as equipas de desenvolvimento de produto em Lisboa ou no Porto, "onde é bom e barato, e onde, sobretudo, as equipas conseguem proteger os seus engenheiros e designers de serem contratados pelo Google antes do tempo". Para além disto, há as características que levam alguns dos mais entusiastas a descrever Portugal como uma Califórnia europeia: o clima, as praias e a qualidade de vida. 

Não basta o cheque
Amadurecer uma startup tecnológica, argumenta Barbosa, não implica apenas passar um cheque. "É preciso saber como funciona a cabeça de um engenheiro, de um designer, e saber quais são os truques para escalar as empresas muito cedo". Para que os empreendedores se concentrem no produto que estão a criar, a Faber oferece alguns serviços pontuais às empresas em que investe – por exemplo, ajuda-as em processos de recrutamento e faz sessões de aconselhamento.

Se uma startup precisar de mão de obra extra por um período limitado de tempo – um sprint de algumas semanas com mais programadores e designers –, a Faber disponibiliza estes recursos a preço de custo.  

A proximidade entre as startups participadas e o capital de risco parece ser grande. Algumas daquelas empresas funcionam no mesmo edifício em que a Faber tem sede, um andar de escritórios modernos na Avenida da Liberdade, no centro de Lisboa. "Sermos sócios de uma equipa que está a montar um negócio nos primeiros meses de vida só faz sentido se conseguirmos acrescentar valor", resume Alexandre Barbosa. "Se não, o nosso dinheiro vale tanto como outro dinheiro qualquer."  

Boa equipa e grandes problemas
Operar uma capital de risco implica desembolsar dezenas ou centenas de milhares de euros (em alguns casos, milhões) em muitos projectos, sabendo que, estatisticamente, vários vão falhar. O que convence a Faber Ventures a investir? A resposta rápida de Alexandre Barbosa é a que se ouve mais frequentemente neste meio. “Em primeiro lugar, a equipa”. Em segundo, um problema “claro e grande” que essa equipa esteja a tentar resolver.

“Para o capital de risco entrar, tem de haver cenários de saída no horizonte, perfeitamente teóricos numa primeira fase, mas que permitam perspectivar que há espaço para, tendo uma pequena parte do mercado, construir uma empresa grande”, diz o investidor. “Não pode ser um problema de nicho – o que é legítimo fazer, qualquer pessoa pode criar uma empresa pequena e ser feliz na vida. Mas para isso não vai precisar de capital de risco.”

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