Operadores europeus planeiam bloquear anúncios em telemóveis

Empresas querem levar fornecedores de conteúdos, como o Google, à mesa de negociações.

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Sistema bloqueia anúncios em aplicações e sites Maria João Gala

Alguns operadores de comunicações europeus estão a planear bloquear publicidade em sites e aplicações nos telemóveis dos clientes, numa tentativa de ganharem poder negocial junto de empresas como o Google.

A notícia foi avançada pelo jornal Financial Times, citando fontes anónimas de operadores e a startup israelita Shine, cuja tecnologia será usada para o bloqueio dos anúncios. Ao PÚBLICO, a Shine confirmou estar a trabalhar com empresas de telecomunicações, mas não especificou com quais. “Não podemos anunciar nomes. Vai acontecer em breve”, garantiu o director de marketing, Roi Carthy.

As empresas de telecomunicações há muito que argumentam que grandes fornecedores de conteúdos online – como é o caso do Google, do YouTube e de serviços de séries e filmes, como a Amazon e o Netflix – beneficiam do investimento feito pelos operadores em infra-estruturas, sem que estes sejam recompensados por isso. Os operadores pretendem que estas empresas paguem para que o seu tráfego circule de forma mais rápida na rede, algo que já acontece em alguns casos nos EUA. Este modelo colide com a generalidade do funcionamento da Internet, em que todos os dados são tratados da mesma forma, independentemente da proveniência, o que é um princípio que a Comissão Europeia pretende garantir formalmente.

De acordo com o Financial Times, são vários os operadores europeus que planeiam bloquear anúncios publicitários nos telemóveis ainda este ano, privando aquelas empresas de uma importante fonte de receitas.

Em alguns casos, o bloqueio poderá ser feito apenas para os utilizadores que optarem por não ver anúncios. Também poderá ser temporário, “só por uma hora ou um dia”, com o objectivo de levar os fornecedores de conteúdos a negociar, disse um dos executivos citados por aquele jornal.

Em qualquer das situações, o bloqueio não vai afectar publicidade inserida em redes sociais como o Facebook e o Twitter. Roi Carthy confirmou que as empresas de telecomunicações podem usar a tecnologia para fazer bloqueios selectivos. “O operador tem um controlo granular, e é capaz de ver cada conteúdo de publicidade que passa pela sua rede. Por isso, é capaz de executar várias formas de controlo de anúncios”.

Cortar a publicidade nos telemóveis significaria uma perda de receitas não apenas para multinacionais que gerem plataformas de anúncios, mas também para os sites e criadores de aplicações que os usam como forma de rentabilização, tipicamente através de um modelo de partilha de receitas com a plataforma. Carthy – que já trabalhou como jornalista para o site de tecnologia TechCrunch – argumenta que o bloqueio de anúncios é “um direito do consumidor”.

Apontando para o facto de muitos utilizadores já recorrerem a soluções informáticas para barrar publicidade online nos computadores, diz que “os consumidores estão a fazer uma afirmação muito clara em relação às redes de anúncios”. No caso dos computadores, o bloqueio é feito com recurso às chamadas extensões, como o popular AdBlock, que podem ser instaladas gratuitamente pelos utilizadores nos browsers.

Bloquear anúncios pode levantar problemas legais, bem como questões relacionadas com a chamada “neutralidade da Internet”, um princípio que determina que todo o tráfego que passa pela rede de um operador deve ser tratado da mesma forma, mas que na maior parte dos países, incluindo em Portugal, não tem forma legal.

Actualmente, não há na Europa uma regra transversal em relação à neutralidade. Como parte de um pacote de medidas mais vasto relacionadas com as comunicações digitais, a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu pretendem garantir, por lei, a neutralidade, mas o processo legislativo ainda não está terminado e esta posição tem encontrado forte oposição do lado dos operadores e também da parte do Governo de alguns países.

 

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