Depressa e mal, ou como a Samsung queimou um telemóvel

O Galaxy Note 7, o smartphone topo de gama da sul-coreana Samsung, protagonizou o mais desastroso lançamento da história recente da tecnologia de consumo com as suas baterias incendiárias. Lição: depressa e bem não há mesmo quem.

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Enquanto os engenheiros da Samsung prosseguem a autópsia do Galaxy Note 7, o smartphone topo de gama da marca sul-coreana que protagonizou o mais desastroso lançamento da história recente da tecnologia de consumo com as suas baterias incendiárias, estes podem pelo menos retirar já uma lição: depressa e bem não há mesmo quem. Se continuamos sem saber o que causou exactamente a falha técnica, acumulam-se no entanto pistas e testemunhos sobre uma decisão ao mais alto nível da empresa que poderá ter precipitado o descalabro.

Recuemos ao início do ano, quando começaram a circular rumores de que a Apple pós-Steve Jobs voltaria a desiludir consumidores, analistas e investidores com o lançamento de um aborrecidíssimo iPhone no final do Verão. A sétima geração do smartphone da Apple, escrevia-se, não traria nenhuma inovação entusiasmante e teria o mesmo aspecto dos modelos anteriores. A Samsung terá visto aqui uma janela de oportunidade para desferir um golpe na rival norte-americana – note-se, aliás, a decisão de saltar um número no nome do modelo, do 5 para o 7. E, avançava a Bloomberg e a Reuters em Setembro, terá dado ordem às suas equipas e aos fornecedores para acelerar o desenvolvimento do Galaxy Note 7. A revista norte-americana fala numa antecipação de pelo menos uma semana, a agência britânica admite um mês.

Fontes contactadas pela Bloomberg afirmam que, apesar da antecipação de prazos não ser incomum, a Samsung terá sido particularmente exigente, introduzindo alterações no modelo já na recta final do desenvolvimento. Isso não só terá implicado mais horas de trabalho como terá levado muitos funcionários a dormir nas instalações das empresas envolvidas.

À Reuters, Jeff Fieldhack, da consultora tecnológica Counterpoint, explicava que é normalmente o período de teste de produto a ser sacrificado quando se antecipa um lançamento. “É possível que nem todos os cenários de utilização de bateria tenham sido exaustivamente testados”, afirmou.

Os testes não envolveram apenas a Samsung. O Galaxy Note 7 começou a chegar a algumas operadoras móveis internacionais em Maio, mas estas não detectaram qualquer problema da bateria. Em Agosto, porém, e assim que o smartphone começou a chegar às mãos dos consumidores, surgiram os relatos de incêndios. Terá havido alterações de última hora?

A CPSC, agência federal norte-americana para a defesa do consumidor, avança uma explicação: a bateria do Galaxy Note 7 seria grande demais para o seu compartimento, o que poderá estar na origem dos curtos-circuitos. Isso colocaria a responsabilidade não no fornecedor da bateria, a Samsung SDI (detida em 20% pela Samsung e que, curiosamente, também fornece a Apple), mas num defeito de desenho do smartphone. No entanto, em Setembro, e depois de ter estudado outros casos de retiradas de produtos, nomeadamente da Toyota, a Samsung encomendou baterias a outro fornecedor, a japonesa Amperex. O problema manteve-se, com relatos de smartphones de substituição a incendiarem-se. Esta semana, a Samsung decidiu desligar definitivamente da ficha o Galaxy Note 7.

O caso da Samsung é particularmente grave mas os lançamentos falhados não são inéditos no sector. Olhe-se, aliás, para a Apple. No mês passado, a mais recente actualização do sistema operativo do iPhone e do iPad, o iOS 10, fez muitos utilizadores perderem os seus telemóveis. Não foi a primeira vez que tal aconteceu e não deverá ser a última.

Para os consumidores, também há uma lição sobre pressa a assinalar: de pouco vale ser o primeiro a comparar um aparelho ou a actualizar um sistema operativo. Não há lançamentos perfeitos e é melhor esperar pelas primeiras impressões e correcções.  

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