Portugal é dos países onde mais alunos pobres conseguem bons resultados

Os resultados dos alunos de contextos desfavorecidos no PISA mostram que as escolas têm feito um "trabalho notável", destaca investigadora.

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“os melhores alunos sabem hoje mais do que em 2000, mas os alunos com maiores dificuldades também”, diz o ministro da Educação Marco Duarte

Ser resiliente significa também conseguir superar o meio de onde se vem. Em Portugal isto acontece com 38,1% dos estudantes oriundos de contextos socioeconómicos desfavorecidos, mais 4,4 pontos por comparação a 2006. O país é assim 13.º num total de 70 estados e economias analisados no PISA com mais “alunos resilientes” — ou seja, que conseguem desempenhos a Matemática, Ciências e Leitura elevados, apesar de pertencerem a meios mais pobres.

O PISA (Programme for International Assessment) é um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico que visa avaliar a literacia dos alunos de 15 anos em Ciências, Leitura e Matemática. Realiza-se de três em três anos. Os resultados da última edição, datada de 2015, foram conhecidos nesta terça-feira e, pela primeira vez, Portugal conseguiu ultrapassar a média da OCDE nos três domínios analisados.  É um “marco histórico”, frisou o investigador do Instituto de Avaliação Educativa (Iave), João Marôco, coordenador da participação portuguesa em estudos internacionais.

Mas o PISA não dá só a conhecer as médias dos desempenhos dos alunos. Através de múltiplos indicadores e de milhares de questionários a alunos, professores e pais, avalia, por exemplo, em que medida os sistemas educativos promovem a inclusão. A resiliência é um dos aspectos focados no PISA 2015. Segundo a OCDE, os “estudantes resilientes” são aqueles que apesar de serem oriundos de contextos desfavorecidos (o grupo dos 25% mais desfavorecidos em cada país), conseguem ter desempenhos que os colocam entre os que obtêm melhores resultados nos testes do PISA (no grupo dos 25% melhores resultados).

Neste domínio, Portugal está nove pontos à frente da média da OCDE (29,2%). À sua frente estão países ou economias como o Vietname, Hong Kong, Finlândia ou Espanha. Atrás, embora não no fim da tabela, estão a Dinamarca, a Suécia ou a França.

A que se deve a posição portuguesa? Isabel Flores, investigadora do projecto aQeduto, que no último ano analisou em pormenor os resultados do PISA 2012 para apurar o que estes dizem sobre o sistema educativo português, diz que “ainda é cedo” para tirar conclusões. “As bases de dados do PISA são gigantescas e é preciso tempo para as analisar em profundidade”, justifica em declarações ao PÚBLICO.

Escola faz a diferença

Mas não estranhará se se deparar com algumas das mesmas tendências registadas em 2012, como estas duas: “A família, embora importante, não é determinante para o sucesso escolar.” O que será então? Nos resultados de 2012 constatou-se que “o efeito escola foi dos mais determinantes na variação positiva dos resultados” ou seja, houve uma grande percentagem de escolas de meios desfavorecidos que se destacou por ter conseguido melhorar de forma considerável o desempenho dos seus alunos”.

São escolas que “fazem um trabalho notável”, descreve Isabel Flores, que acrescenta não ter ficado surpreendido com os bons resultados dos alunos portugueses no PISA de 2015: “Todas as variáveis apontavam nesse sentido.”

Ainda assim, Portugal destaca-se pela negativa na ligação entre chumbos e o estatuto socioeconómico dos alunos, sendo que a maioria dos repetentes vem de meios desfavorecidos, como destacou nesta terça-feira o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues (ver texto nestas páginas).

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Menos alunos nos níveis básicos

Falando na sessão de apresentação dos resultados do PISA, Tiago Brandão Rodrigues lembrou também outra forma de medir as desigualdades dos sistemas: a diferença entre a percentagem de alunos que estão nos níveis mais avançados e aqueles que se ficam pelos escalões elementares. “Portugal foi dos poucos países que melhoraram os resultados consistentemente, sem aumentar as desigualdades” – ou seja, precisou, “os melhores alunos sabem hoje mais do que em 2000, mas os alunos com maiores dificuldades também”.

Uma das tendências assinaladas no PISA, no que respeita a Portugal, é a subida da percentagem dos alunos nos níveis de desempenho mais elevados, que tem vindo a acontecer ao longo das várias edições, em simultâneo com uma descida dos estudantes que se ficam pelos níveis mais básicos. A Ciências, que é o domínio para o qual há mais dados, por ser o que esteve em foco na edição de 2015, a percentagem de alunos nos níveis 5 e 6, os mais elevados do PISA, passou de 3,1% para 7,4% entre 2006 e 2012, e os que ficaram no escalão dois ou abaixo desceu, no mesmo período de 24,5% para 17,4%.

Isabel Flores lembra que este resultado foi atingido numa altura em que Portugal passou por uma forte crise económica, que se traduziu também em cortes nos salários dos professores e nos meios ao dispor das escolas. Para a investigadora, isto mostra que os estabelecimentos de ensino fizeram um trabalho de “excelência”. “Temos que sentir orgulho no nosso sistema educativo”, diz.

O comissário europeu da Educação, Tibor Navracsics, destacou em Bruxelas que “Portugal foi o único país da União Europeia que melhorou continuamente a sua performance no PISA desde 2000”. Em Portugal, o líder do PSD, Pedro Passos Coelho, pediu ao ministro da Educação que reflicta sobre os “resultados muitíssimo bons” revelados pelos testes PISA e que repense decisões que desfizeram ou reverteram políticas que permitiram este desempenho.

Professores destacam trabalho longo

No sentido oposto pronunciou-se a Associação de Professores de Matemática (APM). Em comunicado, a direcção da APM alerta que as medidas tomadas no consulado de Nuno Crato “podem começar a influenciar negativamente este progresso, a começar pelas que afectam as condições de trabalho dos professores com os seus alunos, até às mudanças curriculares”.

Ainda assim, os presidentes das associações de professores são unânimes em sublinhar que a melhoria de resultados evidenciada nos PISA de 2015 é mérito de um trabalho longo feito pelo país. “Não é obra de um governo específico”, sublinha o presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática, Jorge Buescu, que elenca quatro questões que no seu entender deram um contributo “essencial” para esta realidade: uma “grande melhoria” na formação dos professores e também nos currículos escolares, a certificação dos manuais escolares e a introdução dos exames nacionais no final de cada ciclo de ensino, que introduziram “um controlo de qualidade à formação dos alunos” no sistema educativo.

A Associação Portuguesa de Matemática concorda que os resultados são fruto de um “trabalho continuado e do investimento feito em Educação” ao longo dos últimos anos, “sobretudo, no que toca à Matemática, entre os anos 2000 e 2011”.

Também a Português, o desempenho nacional reflecte “sete ou oito anos de esforço dos professores”, defende a presidente Associação de Professores de Português, Edviges Ferreira. “Mesmo com as mudanças de Governo e as subsequentes medidas legislativas já não se altera o que é estrutural: os professores perceberam que o essencial é saber ler, escrever e falar e os nossos alunos são capazes de aprender”, acrescenta Rosário Andorinha, da Associação Nacional de Professores de Português.

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